“Às 5 horas da tarde os ânimos já estavam exacerbados, na rua
Uruguaiana, onde cada vez mais aumentava a onda popular. A cada bonde que
vinha, os mais exaltados armavam lutas com os cocheiros e condutores, até que
resolveram arrancar os trilhos existentes nessa rua. Foi crescendo o tumulto.
No dia seguinte, o povo virava os bondes que trafegavam pela cidade, sendo já
impotente o número de soldados da Polícia para conter a ira popular.” FILHO, Melo Barreto e
LIMA, Hermeto. História da Polícia do Rio
de Janeiro- aspectos da cidade e da vida carioca (1870-1889). RJ: A Noite,
1942. p. 105
O texto acima
certamente está intimamente relacionado com os eventos que vem ocorrendo em
nosso país. A narrativa de Mello Barreto Filho e Hermeto Lima descreve o que se
convencionou chamar de “Revolta do Vintém” também conhecida como “revolta dos
bondes” entre outubro de 1879 e abril de 1880. Na ocasião, últimos anos do
império, o parlamento resolveu instituir um imposto de 25 réis o equivalente a
1 vintém sobre o trânsito de passageiros nas ferrovias do Rio de Janeiro e com
isso elevava o valor da passagem dos bondes em 20%. A revolta foi reprimida, mas não foi fácil
assim, e para aqueles que acham que a truculência policial em nosso país é um
ranço da ditadura, deveriam ler sobre as formas de combates às insurgências que
ocorreram antes deste período. No caso da revolta do vintém uma ação conjunta
entre a polícia, o exército e o batalhão naval, resultou em muita violência. A
polícia chegou a invadir a sede do jornal A Gazeta da Noite, de caráter
republicano e a favor da manifestação, ferindo e até matando jornalistas e
outros funcionários. Já a imprensa imperialista insistia em anunciar a revolta
como um ato de exploração inescrupulosa da população ignorante encabeçada por
políticos ambiciosos e atribuir a ação de rua às classes perigosas. Mas a
manifestação seguiu em frente e em abril de 1880 os empresários dos bondes
recuaram e solicitaram ao governo a revogação do imposto e em setembro a cobrança
foi suspensa, uma vitória que devemos lembrar nos dias atuais.
Passados mais
de cem anos, a página da nossa história de participação social está repleta de
elementos que ainda estão presentes por parte das forças governantes nos dias
atuais. Primeiramente a tentativa de desacreditar a causa, para quê uma
manifestação que reivindica 0,20 centavos? Depois a repressão desmedida e
truculenta não apenas aos “revoltosos”, mas também aos jornalistas e
correspondentes que cobriam o evento. A imprensa oficial (leia-se O globo e A
Folha) caracterizando o movimento, por meio de seus experts, de “ignorância
política”, (como fez certo jornalista e depois se viu obrigado a retratar-se), e
nomeando seus participantes de “vândalos”, “radicais”, “baderneiros”. Outro
elemento está nos otimistas que declaram o “despertar do gigante” fazem
análises e projeções de um país com mais equidade e controle social.
A história de
nossas lutas e conquistas sociais está muito aquém do que deveria, mas se de
fato a população quiser, se fizermos usos dos instrumentos democráticos que nos
garantem organização social, poderemos seguir a passos mais largos em busca de
nossos direitos civis e cidadania, não podemos permitir é que se aumente o
preço do vinagre.
Jonatas Carvalho
Mestre em história pela UERJ