A Veja dessa semana trouxe em sua capa a foto do casal Lázaro Ramos e Taís Araújo, o conteúdo da matéria procurou colocar os dois atores "Globais" como exemplos de como o talento pode superar as adversidades raciais. Em pouco tempo uma chuva de crítica de seus leitores que acusavam a revista de fazer uso de uma "agenda esquerdista", protestaram contra a "dívida histórica", "apropriação cultural", tudo não passa de mimimi, a onda do politicamente correto, longamente denunciada pelo filósofo de direita Luiz Felipe Pondé.
O que os leitores da Veja não entenderam é que a sua última capa visava evitar outro mimimi, aquele que coloca Temer e Padilha no meio negócio da corrupção, do caixa dois do PMDB. Afinal, as inúmeras denúncias contra o presidente e seus ministros já está virando mais um mimimi, ficar protestando sobre o silêncio da grande imprensa e dos paladinos procuradores da lava jato é mais um chororô dessa esquerda descarada que não faz outra coisa nos últimos 13 anos se não aparelhar o Estado brasileiro.
Quando vi a capa da Veja, notei uma faixa em sua parte superior onde se lê "Fui mula do Padilha", uma referência a fala de José Yunes, amigo íntimo de Temer, confirmando a delação de Melo Filho sobre o repasse de quatro milhões a Eliseu Padilha. Fiquei pensando como seria essa edição se o caso fosse referente a mais um escândalo do PT, se Dilma ainda estivesse no Alvorada, se fosse ela que tivesse pedido ao Marcelo Odebrecht dez milhões. Se fosse esse o caso, haveria uma inversão de prioridade da notícia, o Lázaro e a Taís virariam a faixa e a capa estamparia o escândalo. Assim a capa da Veja foi providencial, gerou um tititi entre os críticos do politicamente correto, temas como cotas raciais e meritocracia repercutiram nos demais órgãos midiáticos, desta forma, a Veja cumpriu seu papel; minimizar os efeitos dos escândalos contra a presidência de Temer.
Quantos aos leitores da Veja, esses acéfalos que recusam entender os efeitos da escravidão negra, não creio que valha muito a pena comentar essa gente. Uma gente que acha que a escravidão acabou há mais de um século e seus efeitos não estão mais entre nós. Uma gente que se nega a enxergar as disparidades entre negros e brancos nos ambientes de classe média e das elites. O Joaquim Barbosa foi usado da mesma forma que o casal global por essa gente. Eu me pergunto quando haverá outro negro no supremo? Um negro no supremo resolve tudo ou acentua ainda mais nossas desigualdades? O ministério de Temer indica que não há negros qualificados para grandes cargos públicos ou que tais espaços estão sob o controle das elites políticas que são brancas?
Enquanto escrevo essas linhas escuto Lisa Simone, cantora de voz exuberante e filha da espetacular Nina Simone. Nina compôs em 1964 a canção Mississippi Goddam (algo como puta que o pariu Mississipi), a canção foi um protesto contra o massacre de 1963, um dos mais marcantes na história da luta pelos direitos civis nos EUA, quando quatro crianças negras foram assassinadas em um atentado racista em uma igreja batista na cidade de Birmingham, no Alabama, logo após, o ativista Medgar Ever também fora assassinado. Mississippi Goddam tornou-se um hino do ativismo negro estadunidense. Nina cantou no sepultamento de Martin Luther King em 1968.
Abaixo a letra, música e tradução de Mississippi Goddam: