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Painel: Memorial da Resistência |
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Painel: Memorial da Resistência |
Acordei às 6h novamente. Um professor em recesso escolar, cujo relógio biológico não entra em recesso (ou é só a velhice chegando mesmo), acaba se dedicando a leituras diversas. Li algumas notícias, mas optei por compartilhar minha percepção sobre duas matérias.
A primeira é um texto do Xico Sá para o Diário do Nordeste, em que o jornalista e escritor coloca lado a lado a história de duas mulheres brilhantes: Eunice Paiva e Elisabeth Teixeira. A primeira passou a ser conhecida especialmente após o prêmio a Fernanda Torres pela brilhante atuação no papel da esposa de Rubens Paiva, ex-deputado paulista, capturado, torturado e assassinado em 1971 dentro de um quartel militar. A segunda, creio eu, é absolutamente desconhecida ainda entre nós, mesmo após o sucesso do documentário produzido por Eduardo Coutinho, "Cabra Marcado para Morrer", lançado em 1984. Xico nos lembra a história de Elisabeth, trabalhadora rural da Paraíba, casada com João Pedro Teixeira, mãe de onze filhos, perseguida pela ditadura militar. Ela precisou espalhar seus filhos e desaparecer por um bom tempo, mas Elisabeth está viva, ainda está aqui.
A segunda matéria foi escrita por Joel Pinheiro Fonseca, filho do economista Eduardo Giannetti, para a Folha de São Paulo. O título me chamou a atenção: "Neste oito de janeiro, lembre-se: o PT não é a democracia". O economista liberal argumenta que a direita não pode deixar a esquerda sequestrar a pauta da democracia, como teria feito com outros temas. Para tanto, caberia à direita combater veementemente a crítica à fraude eleitoral das urnas eletrônicas. A base de seu argumento é que, dois anos após os atos de 8 de janeiro de 2023, 86% dos brasileiros desaprovam as invasões nos prédios públicos de Brasília. O que significa, segundo o economista e filósofo, que, embora a direita tenha votado em Bolsonaro, apenas um bando de radicais se aventurou na loucura da invasão, no delírio de uma intervenção militar, enquanto a maior parte é moderada.
O jornalista liberal pode até ter razão ao afirmar que o PT não é a democracia, isto é, a democracia não é produto de um só partido. Mas, por outro lado, não lhe ocorre que a direita historicamente se alinhou com os fascismos quando lhes convinha deter os avanços das classes trabalhadoras. Os liberais de Washington (democratas e republicanos), com seus poderosos conglomerados, desde a Doutrina Monroe, patrocinam e sustentam golpes de estado no mundo todo. A direita brasileira apoiou a ditadura militar, que perseguiu, sequestrou e torturou mulheres como Eunice Paiva e Elisabeth Teixeira. Quanto ao PT, o caro colunista da Folha ignora a participação fundamental do partido contra a ditadura, assim como seu papel nos avanços da classe trabalhadora deste país. Avanços estes que a direita e a extrema direita vêm destruindo desde a reforma trabalhista em 2017.
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Eunice e Elisabeth |
Joel Pinheiro é um liberal que defende uma sociedade "baseada em regras", desde que estas sejam as regras liberais, podendo ser até um "bolsonarismo moderado", que verdadeiramente jogue nas "quatro linhas" do livre-mercado (as aspas são minhas). A democracia é um valor máximo, mesmo com seus defeitos, afirma Joel, não existe alternativa melhor. Fico na dúvida se o filho do grande economista liberal realmente acredita no mundo encantado das liberdades individuais e da livre iniciativa, ou se ele apenas se vende para divulgar tais propagandas. É de bom tom deixar claro que a nossa "redemocratização", tão aclamada pelos liberais, só chegou para as classes privilegiadas. As classes desfavorecidas (pobres, pretas e periféricas) continuam lidando com um Estado de Exceção. A classe trabalhadora, como a categoria "professor(a)", segue sofrendo ataques ininterruptos (com direito a violência policial) pelos "liberais moderados" como os governadores Tarcísio de Freitas (SP) e Cláudio Castro (RJ). Os mesmos liberais moderados que se recusam a taxar os bilionários, mas não hesitam em manter uma taxa de juros abusiva, pois entre deter a inflação e aumentar o desemprego, escolhem o último.
Entre o 6 e o 8 de janeiro, nós que lutamos por justiça social, por reparação histórica e não por uma democracia liberal, ainda estamos aqui.
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Jabalia-November-10-2024.-reuters.jpg |
— E aí como foi?
— Meu Deus, foi a pior punheta da minha vida!
— Hahahaha... como assim vida?
— Amor, cheguei no laboratório, todo constrangido já, me aproximei do balcão, falei com a moça que eu tinha marcado um espermograma, a recepção tava cheia, daí falei baixo né? Assinei um papel, ela me pediu para aguardar. Sentei e fiquei lá na minha né? Daqui a pouco, chega uma mulher e grita, FULANO, que vai fazer exame de espermograma!
— kkkkkk....não acredito! E aí?
— Tu não viu nada ainda. Tá, levantei, já corado né? Ela me deu um potinho, eu segurei, olhei pra ela. Eu tava esperando ela falar algo: — Oh, vai pra uma salinha ali, tem cine privé, revistas… faz o que tem que fazer e traz o pote aqui de volta.
— Ué, mas não é assim?
— Não. Ela virou pra mim e disse: — O senhor vai levar esse potinho pra casa e amanhã retorna com o conteúdo, ou se quiser pode voltar mais tarde, ficamos abertos até às 17h.
— Eu saí já puto, porra ter que voltar em casa, uma hora pra ir, mais uma pra voltar, ah não! Que que eu pensei?
— O quê? Não faço ideia! Fala logo vida!
— Vou bater uma punheta no banheiro do shopping e volto! Já resolvo essa porra!
— Literalmente né?
— É, mas aí é que deu merda. Literalmente!
— Cara, tá me matando de curiosidade, fala!
— Tá, entrei no banheiro né? Tava vazio, pensei, opa! Fui lá pra última cabine do corredor, tá ligada? Peguei o celular, coloquei no XVideos, sem som e comecei a escabelar o palhaço, tava indo bem...
— Ahh...o que aconteceu?
— Eu ouvi a porta do banheiro abrir, uns passos apressados na minha direção, um cara abriu a porra da cabine ao meu lado, arriou as calças e começou a cagar...
— Hahahaha....que merda!!
— Eu tava perto vida! Quase lá! Pensei, porra, não vou parar, larguei o celular, puxei a camisa para cima, pra cobrir o nariz e mandei ver. Foi a pior punheta da minha vida! Voltei ao laboratório, a mulher olhou pra minha cara como quem pensou: — Onde será que ele fez isso? Se ela tivesse coragem de perguntar, sabe o que eu responderia?
— Não minha vida… não aguento mais de rir…hahahaha.
— Faço qualquer sacrifício para provar a minha virilidade.
— Mas se o resultado do exame der que teu esperma é fraco?
— Confia vida! Confia!
O dia começou com cabeleireiro às 7h, maquiagem e tranças… tudo muito simples, nossos pequenos hábitos vivendo no centrão de Sampa, agora se contrastava com a paisagem de progresso em um bairro de privilegiados na zona sul. O que era para ser uma troca de alianças frente a um juiz de paz e depois uma churrascaria, virou um pequeno evento, nas palavras da minha marida: rústico e sofisticado. Aos poucos chegaram os familiares, os dela, uma parte vieram de Cruz Alta e Porto Alegre, os meus, do Rio de Janeiro. Tirando os filhos/filhas/filhes, irmãos/irmãs, cunhados e a mãe dela, apenas mais dois casais de amigos estavam presentes, um meu e outro dela.
E a vida, assim, vem à tona
quando se forma a família
é qual o amor do Jonatas
pelo amor de Maria Ercília!
Em meus votos, citei a noção de “integração”, que encontrei em Pablo Neruda,
Depois de tudo te amarei
como se fosse sempre antes
como se de tanto esperar
sem que te visse nem chegasses
estivesses eternamente
respirando perto de mim.
Perto de mim com teus hábitos,
teu colorido e tua risada
como estão juntos os países
nas lições escolares
e duas comarcas se confundem
e há um rio perto de um rio
e crescem juntos dois vulcões.
O que eu não esperava era ver com os meus olhos, naquela mesma tarde o poema se concretizando nas interações entre nossos familiares. Pessoas tão diferentes e distintas, a maioria nunca havia se visto antes, foi o primeiro contato. Observei nossos filhos(es), noras e genros interagindo, rindo, compartilhando. Felipe e Gi, absolutamente extasiades com meu neto, João Vicente, vi meus cunhados interagindo sobre música, minhas irmãs e sobrinha trocando conversas com minha Marida, minha sogra, “coisa mais querida”, praticamente era uma atração à parte, porém completamente inserida à festa. Nossos amigos e amigas, circulavam entre nossos familiares, eu vi uma nova família se formando, um elo, criando por mim e minha marida, gente estranha, de lugares geograficamente opostos, integrando-se. Essa maravilhosa imagem me nutriu ainda mais de esperança, em tempos de cancelamentos, ódio, preconceito, integrar pessoas é por si uma ato de resistência. Espero que este tenha sido o início de uma relação de grandes amizades, camaradagens e parcerias.
Obs.:
Quanto aos votos dela para mim, bem, eles foram escritos em letra vermelha sobre uma folha de caderno que já tinha sido dobrada e desdobrada várias vezes (sem que ela tenha arrancado aquela parte que fica presa ao espiral), mas nem isto foi suficiente para deter a emoção e as lágrimas enquanto ela pronunciava as palavras mais doces e engraçadas que já me disseram. Ela mencionou uma vida a dois, baseada em cumplicidade, honestidade, responsabilidade e claro, amor. Embora o amor tenha sido mencionado por último no seu texto, é ele que me atravessa antes de todo o resto, quando olho nos olhos dela, quando ela abre aquele sorriso. AMO VOCÊ MARIDA!!
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Foto do autor. |
Sou um fluminense que vive em São Paulo com uma gaúcha. Nossos primeiros diálogos foram preenchidos de muitas risadas, geralmente, de minha parte, surpreendido por termos que só tem no Sul.
Bahhh, eu não devia me surpreender tanto néé, já que morei no Sul e transitei por váaarias cidaaades gaúchas, mas isso faz muito tempo gurizada. Monumento à Cuia - Cruz Alta
Ao chegarmos em Porto Alegre fui direto na locadora de automóveis, enquanto concluía o contrato, o homem do outro lado do balcão me perguntou: — E a gerentee não vai pilotar também? Eu só entendi quando ele olhou para o lado, então percebi que a gerente deveria ser a minha marida.
A noite, o cunhado e sua companheira nos receberam com muito carinho em um apartamento aconchegante no centro de POA, depois de uma churrascada e muita cerveja, foi o momento da música, meu cunhado é especializado nos ritmos regionais, como o vanerão, a milonga, a chacarera e a rancheira. Foi tudo tri, mar eu, já à meia guampa achei que era hora de abrir a barba.
Na manhã seguinte enrolamos o poncho e com o pé no estribo, ganhamos na estrada para Cruz Alta, quase cinco horas de viagem, não fomos de vereda, fizemos algumas paradas para bolear a perna. A estrada cinzenta cortava cidades e mais cidades verdes de soja.
Ao chegar em Cruz Alta, finalmente conheci minha sogra pessoalmente, Dona Beti. Eu precisava ter esse encontro, temia que ela achasse que eu estava a escanteando, mas a verdade é que Dona Beti é mulher de agalhas, de fazer o costado, não é mulher de lagartear, com ela é tiro dado e bugio deitado, ainda assim, ela não perdeu tempo e tratou logo de lamber a cria.
Assistir minha marida e minha sogra conversando foi de cair os butiás do bolso, uma quantidade incrível de palavras e expressões que só um gaudério compreenderia, mas eu, fiquei mesmo é faceiro que nem guri de calça nova.
As duas não são lá muito dadas a lamber as esporas, gostavam mesmo é de meter a catana sem dar changui, mãe e filha, tão diferentes, tão semelhantes…às vezes uma acusava a outra de estar louqueando. Minha marida não nega as semelhanças, embora fique abichornada com algumas, mas sabem como dizem né? Filha de tigre sai pintada.
A casa de Dona Beti é uma espécie de centro de memórias que remontam o Brasil colonial, império e as primeiras décadas da república. A farroupilha, a guerra civil de 1923 e a “revolução de 1930” ainda estão bem presentes na memória local. Fora isso, Cruz Alta é a cidade de Érico Veríssimo, cheia de casarios do início do século XX, aqui, o Tempo e o Vento, passam lentamente.
Mas se vocês pensam que essa viagem foi pura erva-caúna, capaz! Aqui não tem essa de embarrar o pastel, tratamos de campear toda a região. Nosso primeiro destino, São Miguel das Missões, eu e minha marida conhecemos as ruínas de São Miguel Arcanjo, terra Guarani (no próximo texto eu comentarei minhas impressões). Trata-se de uma cidade com um pouco mais de sete mil habitantes, ainda assim me perdi, abordei três guris que caminhavam pela rua, com latas de cervejas nas mãos, perguntei:
— Vocês sabem como faço para ir pro centro da cidade?
— Segue em frente até a rotatória, daí! Eu retruquei:
— Até a rotatória e depois? A resposta veio com risos por parte dos guris:
— A rotatória é o centro, daí!
No dia seguinte estivemos em Boa Vista do Cadeado e Ijuí. A primeira pequininha, menos de três mil habitantes, com meia hora de carro a gente percorreu o lugar, um cenário de interior. A segunda, maior até que Cruz Alta, mas com poucos pontos turísticos, visitamos um parque natural e comemos em uma churrascaria gaúcha. De volta a Cruz Alta, comi uma Marta Rocha que é marca de estância velha por essas bandas.
No mais, em quatro paletadas eu já estava dobrando o cotovelo, porque carioca é assim mesmo, como dizem os gaúchos, nós aguentamos o tirão e não somos muito de juntar o torresmo. Agora tá na hora de encerrar essa conversa, pois os mosquitos estão me charqueando e os cupinchas então me esperando para aquela mateada.
Bahhhh!!