Eu quero saber quem inventou a dor
Eu quero saber quem inventou o luto
Eu quero saber se o mesmo não tinha gente
Gente que abraça, afaga, compartilha e brinca
Gente que protege, ama, se doa
Gente como a gente
Gente que nos fez gente
Eu só quero saber...
Quem foi essa gente que diz que sente?
Eu só quero saber, se vai existir o reencontro da minha gente em algum momento, isto meu bem, seria tangente.
Eu quero saber quem inventou o luto
Eu quero saber se o mesmo não tinha gente
Gente que abraça, afaga, compartilha e brinca
Gente que protege, ama, se doa
Gente como a gente
Gente que nos fez gente
Eu só quero saber...
Quem foi essa gente que diz que sente?
Eu só quero saber, se vai existir o reencontro da minha gente em algum momento, isto meu bem, seria tangente.
Não
é difícil achar quem não se sensibilize quando menciono que meu pai com 76 anos
de idade está fazendo tratamento de um câncer no pescoço. Mas quando digo que
minha mãe infartou e faleceu em meio ao processo, que ela não suportou vê-lo
perder nove quilos e sofrer os efeitos da quimioterapia, em geral, as pessoas
ficam sem saber o que dizer. Ainda assim é comum ouvir comentários já
padronizados pela nossa cultura para estas situações, coisas do tipo “meus
sentimentos”, “deus sabe de todas as coisas”, “lamento sua perda”, estas frases feitas que reproduzimos mesmo sabendo que de nada servem para consolar, apenas dizemos por que
não há nada melhor para dizer.
Quando
um ente querido parte desta vida, sua ida não é imediata, sabemos que nunca
mais veremos aquela pessoa, mas sua presença continuará entre aqueles que a
amavam; nisso reside o luto. Como excluir a presença de alguém de uma casa,
cuja qual compartilhou com você por cinquenta anos? Como se desvencilhar das
lembranças? Como conter a saudade? Como não sofrer com as memórias?
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Ivan Kramskoy, Tristeza inconsolável, 1884. |
Após
o funeral (ritual que é distinto conforme a cultura), que é uma forma de despedida, diversas situações se
apresentam impedindo o esquecimento e estendendo a dor, apresentam-se em ações como cancelar um plano médico, uma
conta telefônica e outros eventos que nos obrigam a andar por ai com uma
certidão de óbito a confirmar que o titular não está mais entre nós. Se isso não
bastasse, ainda temos que lidar com situações ainda mais dolorosas, como o que fazer
com a casa cuja arrumação ficou do jeito que ela deixou? O que fazer com os
objetos que ela tinha mais apego? Que destino dar aos pertences, roupas, bijuterias?
O que fazer com os livros e discos? Cada um, ao seu tempo, encontrará uma forma
de lidar com isso.
A
palavra luto vem do latin de luctum, isto
é, chorar, lastimar (a perda de alguém), mas na prática o luto é muito mais que
isso. Estar de luto não é o mesmo que estar deprimido, embora em alguns casos
possa levar a depressão. O luto é um processo longo onde se aprende a minimizar
a dor da ausência e se descobre como lidar com a saudade sem sofrimento. Mas
até que isso ocorra, até que o tempo seja capaz de cicatrizar as feridas,
sofreremos, uns dias mais, outros menos. Passamos alguns dias convivendo com
lembranças felizes, em outros, um simples objeto de suvenir sobre algum móvel é
suficiente para desencadear um doloroso choro.
Vivenciar
o luto é aprender mais sobre si, é se deparar com suas fraquezas mais profundas
e ver emergir forças que sequer sabia existiam em você.