Tenho
sido paciente com as nomeações ministeriais do novo presidente,
apesar de estarrecido com algumas indicações, me mantive calado,
primeiro porque não sou de me precipitar, segundo porque não é
privilégio do Sr. Jair escolher mal, fui crítico de muitas escolhas
em todos os governos anteriores desde FHC. Me silenciei nas escolhas
do Itamaraty e do ministro da educação, que considero retrocessos sem precedentes na história da nossa combalida república. Ao ver, porém, o organograma
do ministério da economia, a equipe de “vice-ministros” de Paulo
Guedes, comecei a notar, ainda que vultuosamente, um certo desenho da
estrutura de desmonte do Estado Brasileiro.
Ficarei aqui apenas com o homem que conduzirá a
chamada “pasta das privatizações”, a história das
privatizações no Brasil é uma das nossas muitas vergonhas, na ERA
FHC (1995-2003) as privatizações surgiram como solução para
conter a dívida pública, que era de 78 bi em 1996, para isso o
governo “vendeu” uma série de empresas públicas e faturou 78,6
bi com as privatizações, mas ao final de 2002, a dívida pública
já havia chegado a 245 bi, quase a metade do PIB da época que era
de 504 bi, para apresentar aqui apenas o resultado final dessa triste
história, pois se mergulharmos encontraremos coisas escabrosas, como
empresas públicas vendidas muito abaixo do valor de mercado, desvios
de dinheiro, vendas para amigos...
Retornemos ao agora, porque, é preciso reafirmar
que a propagação de um projeto de governo que teria por base a
honestidade, com um discurso anticorrupção e moralista que foi
capaz de ludibriar muitos brasileiros, logo mostrará sua verdadeira
face. Eis que tal rosto já começa a se revelar.
Pergunto-me sobre a razão de Salim Mattar,
pergunte-se também você. O empresário é dono de um império no
ramo de locação de veículos, cujo mito de fundação da empresa
diz que esse senhor começou a vida com locação de seis fuscas e
hoje tem a maior frota de aluguel da América Latina. Seria sua
capacidade de empreendedor que lhe concedeu um lugar na equipe de
Paulo Guedes? Salim Mattar é mais que empresário, é político, e
está na política há muitos anos. Investiu só nesse ano quase 3
milhões de reais em campanhas para as câmaras legislativas e
governos de Estado, só na campanha de Rodrigo Maia foram 200 mil
reais, ao governador eleito por Minas Gerais (Romeu Zema) ele doou
700 mil reais (o que representou 44% das doações recebidas por
Zema), ao Onyx Lorenzoni, 100 mil, a maioria dos apoiados pelo
empresário são do DEM e do NOVO. Porque razão um indivíduo doa do
próprio bolso (doação empresarial foi proibida) toda essa fortuna?
Seria porque ele teria se cansado da roubalheira? As grandes fortunas
nacionais e estrangeiras só injetam dinheiro em campanhas pensando
em si mesmos, nunca teve nada com o desenvolvimento do país. Os rios
de dinheiro que abasteceram as eleições passadas via empreiteiras,
agora emanam por cotas volumosas das contas privadas, apenas 16
empresários destinaram 45 milhões em campanhas pelos Estados
brasileiro, Salim é um deles.
Se você entrar no Portal Transparência Brasil e
colocar na busca contratos de locação de veículos, descobrirá
mais de 19 mil resultados encontrados. O negócio de aluguel de
frotas inteiras entre empresas e governos movimentam bilhões, as
estruturas dos três poderes possuem centenas de contratos com essa
finalidade. Ao fazer uma busca sobre contratos firmados entre a
“Localiza Rent a Car SA” com órgãos e empresas públicas
chega-se a soma de 906 resultados, uma soma significativa destes com
a Petrobras.
Talvez você pense, mas os governos economizam com
o aluguel de veículos, é mais barato que adquirir, elimina-se o
custo da manutenção, dentre outras. Sim, mas ainda assim, esses
contratos saem muito lucrativos para as empresas, há cálculos que o
uso do uber e até o táxi em certos casos seriam mais baratos que o
valor do aluguel. Há estudos, porém, onde se considera que os
custos de locação para substituir uma frota seria, em média, 51%
maior que os custos de manutenção e depreciação (Galvão e Melz,
2011).
As locadoras estão em ascensão no país, em
plena crise, o ano de 2017 rendeu a Localiza um lucro líquido de 130
milhões, um crescimento de 32% relacionado a 2016, a Locamerica
(antiga Unidas), registrou um lucro líquido de 61 milhões em 2017,
um aumento de 30% comparado ao ano anterior. Os Estados brasileiros,
por sua vez, elevaram drasticamente suas despesas com locações de
veículos, estruturas como as forças armadas, as polícias civil e
militar, as universidades federais e estaduais, autarquias,
hospitais, dentre outras passaram a substituir suas frotas adquiridas
por alugadas. Por outro lado, se no modelo anterior os veículos
ficavam parados porque os Estados e Municípios não quitavam os
pagamentos com as oficinas de manutenção, no modelo atual, frotas
inteiras são devolvidas por falta de pagamentos dos contratos de
aluguel. Em 2017 o Estado do Amazonas devia mais de 9 milhões em
aluguel de viaturas policiais. Em 2016 o Estado do Rio foi obrigado a
devolver 376 unidades alugadas.
O setor de terceirização de frotas movimenta em
torno de 17 bilhões anuais, o que representa 75% do negócio de
aluguel de veículos no país, os setores públicos são vitais nesse
negócio, o Estado de Roraima é o maior cliente das locadoras, que
somam 37 empresas ativas, no Brasil, segundo dados da receita
federal, existem 11 mil locadoras ativas. O governo federal gasta em
torno de 54 milhões por ano com frotas (fixas e alugadas), isto é,
trata-se de um negócio que certamente deixa as grandes empresas do
setor de olhos bem atentos, e agora um empresário do setor estará
nas entranhas do Estado brasileiro, suas doações foram investimento
certo.
Jonatas Carvalho é professor e historiador.
Referências sobre os dados apresentados:
https://g1.globo.com/economia/negocios/noticia/localiza-tem-alta-de-32-no-lucro-do-segundo-trimestre.ghtml
https://anaiscbc.emnuvens.com.br/anais/article/viewFile/490/490
http://www.portaltransparencia.gov.br/busca?termo=loca%C3%A7%C3%A3o%20de%20ve%C3%ADculos%20localiza
https://g1.globo.com/politica/noticia/2018/11/23/indicado-para-comandar-privatizacoes-salim-mattar-foi-o-quarto-maior-doador-nas-eleicoes.ghtml
https://www.valor.com.br/empresas/4495846/locacao-de-veiculos-movimenta-r-163-bi-no-pais-em-2015-afirma-abla
https://www.valor.com.br/empresas/5411299/unidas-tem-lucro-quase-70-superior-no-quarto-trimestre
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