O dia de hoje merece um registro, não é todo dia que você reencontra um grande mestre. Foi na pequena agência dos correios em Itaipava que reencontrei Leonardo Boff, há anos não o via. Sua recepção a minha abordagem foi a de um velho monge, humilde e serena. Revelei-lhe que apenas dois escritores brasileiros me acompanharam por quase toda vida, ele e Rubem Alves, por motivações distintas. Disse-lhe o quanto foi fundamental ler "Jesus Cristo Libertador" e "Igreja Carisma e Poder" quando estudava teologia nos anos de 1990. Comentei que recentemente eu havia indicado a alguém a leitura de "Terapeutas do Deserto" que ele publicou com o teólogo e filósofo francês Jean-Yves Leloup. Ele me ouvia pacientemente e comentava sorridente.
A conversa se encaminhou para os dias atuais, disse-me temer pelo que virá. Falamos sobre educação, e ele me revelou que ainda dava aulas na UERJ quando chegaram lá os primeiros cotistas.
- Que alunos dedicados! Que privilégio ensiná-los! Exclamou, para depois demonstrar seu temor que essa condição deixe de existir.
A conversa, rendeu ainda mais alguns poucos minutos, ele me falou de um artigo que publicou ontem, uma releitura de outro que escrevera em 2013, cujo título é "Face ao novo Governo que nos socorra São Jorge", neste texto Boff faz um interpretação psicanalítica a partir de Erik Neumann, discípulo de C. G. Jung, em que o São Jorge e o Dragão são representações da psiquê humana, "O dragão em nós é o nosso inconsciente, a nossa ancestralidade obscura, nossas sombras. nossas raivas e ódios. Deste transfundo irromperam para a luz a consciência, a independência do ego e nossa capacidade de amar e conviver humanamente, representados por São Jorge." Transportando tal concepção para a sociedade brasileira, o dragão social, outrora controlado, agora dispara sua ira às minorias; homoafetivos, indígenas, quilombolas, mulheres independentes. Por fim disse, que precisamos invocar o São Jorge para assumir a história social, mas não com a espada - e aqui, pareceu-me que ele deu a Jorge, características de Francisco de Assis (sobre o qual ele é um notável conhecedor) - "Devemos usar as armas que eles não dispõem", eu completo aqui retirando de seu artigo:
"Às discriminações respondemos com a inclusão de todos indistintamente. Ao ódio disseminado contra opositores, responderemos com amorosidade e compaixão. À criação de bodes expiatórios, responderemos com a defesa dos inocentemente marginalizados e injustamente condenados. Às mentiras e às visões fantasiosas que nos querem levar à Idade Média, responderemos com a força dos fatos e fazer valer o sentido da contemporaneidade."
Ao fim de nossa brevíssima, mas intensa conversa, eu o agradeci pela sua atenção em parar com um ex aluno e admirador, e recebi dele um singelo "valeu irmãozinho".
Link do artigo citado acima: https://leonardoboff.wordpress.com/2019/01/03/face-ao-novo-governo-que-nos-socorra-sao-jorge/
Jonatas Carvalho.
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