domingo, setembro 27, 2015

Crônicas Cancerígenas IV: o final.

Era de se esperar que um dia essas crônicas terminassem. Eu poderia ter escrito outras, pois muitas coisas ocorreram nos últimos meses, mas não tenho tido muito tempo de registrar minhas experiências. No momento em que comecei a escrever essa crônica, meu pai estava internado em uma UPA, após doze dias ele partiu definitivamente. Eu imaginava que esse dia chegaria e por mais que saibamos, nunca estamos preparados quando ele chega. Não tem um jeito fácil de passar por isso.  O câncer deteriora não apenas quem é acometido por ele, mas todos os que estão envolvidos com o doente.

Mas não quero fazer desta última crônica um discurso fúnebre, creio que seja o momento adequando para trazer aqui memórias felizes. Estas não faltarão para aqueles que conviveram com o Sr. Manoel, sujeito espirituoso, de uma simplicidade franciscana. Nunca vi aquele homem desejar mal a alguém, destilar veneno, promover discórdia, ou qualquer outra ação decadente que a raça humana utiliza. O Sr. Manoel era desprovido de maldade, às vezes chegava a ser ingênuo de tanta pureza e docilidade.
Foram muitas as lições que ele nos deixou, homem de caráter irrevogável, que nem a pobreza e a dificuldade de alimentar cinco bocas, o fez questionar seus valores. Sua grande marca era a gratidão, nunca questionava as adversidades, sólido em suas crenças acreditava que em tudo havia um propósito. Viveu uma vida de resignação ao lado de uma mulher que sofria de transtorno compulsivo obsessivo, sua paciência para com ela transcendia nossa capacidade de compreensão.

Naturalmente como qualquer pai ele cometeu erros. Fora distante e omisso, não era do tipo carinhoso com os filhos, mas demonstrava afeto. Mas não falhou mais do que eu com meus filhos, principalmente se se levar em consideração a infância que teve. Eis uma coisa que nós filhos não somos capazes de fazer enquanto somos jovens, somente a maturidade nos possibilita essa empatia com os pais. E o Sr. Manoel teve motivos de sobra para ser um homem amargurado pelo passado, mas ele escolheu viver o presente como se fosse uma dádiva. Essa arte de viver é o seu legado para todos nós. 

Jonatas carvalho é filho de Manoel Carlos de Carvalho e Helena Francisco de Carvalho com muito orgulho.