segunda-feira, dezembro 08, 2008

Ambigüidades.

Somos dentre todas as espécies vivas da biosfera àquela com características mais estranhas. Essa história de que somos uma “espécie superior” precisa ser revisada. Antes se dizia que nossa diferença para as outras espécies era o fato de possuirmos inteligência, hoje sabemos que muitos seres são dotados de inteligência. Em seguida o argumento passou para uma concepção cartesiana – somos os únicos dotados de razão! – Talvez, embora sempre me parecesse que somos mais guiados por instinto “animal” que por alguma razão (basta sentar com algum psiquiatra e este lhe fará uma lista completa de nossa semelhança comportamental).
Há, porém, outra grande diferença, a ambição, somos seres ambiciosos isto eu não consegui perceber em qualquer espécie. A ambição é traduzida por alguns dicionários como desejo de poder, riquezas ou honras. A ambição nos torna mesquinhos, individualistas, egoístas.
Esta semana passei por uma experiência que deixou claro o quanto somos mesquinhos, aliás, a palavra mesquinho contém um significado dúbio, pois ela tanto pode significar escassez de recursos, pobreza, como também pode significar avareza. Voltando a experiência, eu estava feliz, orgulhoso por estar conduzindo meu filho até sua escolinha de futebol, para vê-lo estreando numa categoria acima da que jogou no ano anterior. Quando entrava no estacionamento do clube, uma moto em alta velocidade colidiu na parte traseira do carro. Eu saí, verifiquei se o motoqueiro estava bem, percebi que havia se ralado, nada mais. Enquanto ele levantava sua moto se desculpava dizendo que pagaria todo o prejuízo, quando eu fui olhar o que havia ocorrido com o carro ele pulou na moto e fugiu. Eu não resisti e fui atrás, tentei alcançá-lo, mas não havia como. O episódio ficou me atormentando até que decidi naquela tarde fazer um orçamento do prejuízo: Mil reais. Agora eu estava mais atormentado do que antes, imaginei que sonharia com aquele motoqueiro e no sonho eu o jogaria para o alto.
No dia seguinte menos atormentado, caminhei com minha esposa, li meu jornal e assisti o futebol. À noite recebi a notícia que a esposa de um amigo havia falecido em um acidente de carro, ele estava ao volante e voltavam de férias de Campinas para o Rio, quando o pneu dianteiro estourou.
Eventos como estes demonstram que nossa capacidade de apego as coisas materiais chegam a ser ridículas, ouvi de um amigo que o erro do socialismo foi desconsiderar o individualismo dos sujeitos, mas creio que o individualismo tal qual nos é representado não é uma característica a priori, mas uma fabricação social, uma construção histórica. Não somos nem individualistas nem comunitários, aprendemos e desenvolvemos tais aptidões histórica e socialmente. Assim aprendemos a ser generosos, solidários e gentis, mas também somos egoístas, individualistas e mesquinhos. Em muitos casos tais características tão antagônicas estão presentes em um mesmo sujeito, isso é, podemos ser especialmente generosos quanto a uma determinada situação e completamente mesquinhos no que diz respeito à outra situação.
A ambigüidade nos torna este ser terrivelmente complexo e estranho, como eu já citei nas primeiras linhas deste texto, mas não somos seres ambíguos por natureza genética, a ambigüidade também é uma construção social, o homem torna-se ambíguo, por diversas razões que não me compete dizer aqui.
Penso que o que realmente nos difere enquanto espécie, é um pouco o que Marx sugeriu com sua metáfora sobre as abelhas, diferimos das outras espécies pela nossa capacidade de refletir nossa própria ambigüidade, quando no momento em que detectamos o quanto fomos mesquinhos em relação a alguma coisa, podemos imediatamente fazer algo generoso, ou sermos totalmente solidários, é provavelmente aí que somos fundamentalmente singulares como espécie.

domingo, novembro 16, 2008

LONGO NOVEMBRO.

Depois de desfrutar dos feriados (neste novembro foram quatro, três nacionais e um local), resolvi aproveitar os raros momentos de tranqüilidade para refletir um pouco sobre este longo novembro e suas datas interessantíssimas.
Ao olhar para cada feriado comecei a notar que na maioria dos casos, não damos a devida atenção ao sentido das datas. Temos de inicio o dia de finados, todo mundo tem direito a morrer, e conseqüentemente é justo que haja um dia específico para lembrarmos dos nossos mortos. O que me encabula é o fato de sempre chover muito nesta data, por mais cético que eu seja não consigo deixar de pensar numa conspiração dos céus. De toda forma, finados com sol, não seria justo com os mortos. Todos certamente iriam preferir aproveitar o feriado para ir a praia e não ao cemitério, o sol inibiria o clima fúnebre que o dia pede. Imagina você lá mortinho da silva, e a galera no maior sol, curtindo samba, cerveja e futebol, isso é sacanagem!
Sol, praia, samba e cerveja, já combina com o dia da proclamação da república, ai sim, podemos fazer festa. Viajar, fazer piquenique vale qualquer coisa. Afinal o que há para comemorar? Temos uma republiqueta, disfarçada por componentes democráticos, que na verdade remonta o império. Caciques, coronéis, votos de cabrestos, oligarquias, corporativismo e falsa representatividade são o que compõe de fato nosso sistema de governo. Se não temos coragem de fazer revolução e se nossa burguesia está satisfeita com os conchavos, não temos outra opção senão de fingir que nada está acontecendo. Fingir que estamos felizes com nossos salários, com a forma que a distribuição de renda é feita neste país, com a bolsa família... Logo, só nos resta aproveitar dia, esquecer ao que se refere esta data, se alguém perguntar – feriado de que hoje? – diga – sabe que não me lembro! Um dia assim não precisa ser fúnebre, precisa de sol, pão e vinho. Além do mais, dois dias fúnebres no mesmo mês é sacanagem!
Não vou mencionar o feriado local, mas antes de passar para o dia vinte, quero só fazer um parêntese sobre o filme que passou no dia quinze no canal nacional de manipulação das massas. Cazuza. Este filme devia vir com aquelas recomendações que alguns programas de circo ou acrobacias fazem. – Senhoras e senhores, o que vocês vão assistir é extremamente perigoso, portanto não tente fazer isto em casa! – Cazuza é um filme que conta a história de um burguesinho, mimado, viado e viciado que se tornou um poeta de talento. Seria melhor que não conhecêssemos sua biografia, apenas suas letras. Este filme é só sacanagem!
O dia vinte, dia da consciência negra devia se chamar dia da consciência branca, não que os negros não devam se tocar e ir à busca de seus direitos, mas os brancos necessitam se conscientizar da importância desse povo em nosso país. É impressionante que todos os grupos minoritários que foram vitimas de massacres históricos, sejam recompensados de alguma forma; os judeus (que são especialistas em conseguir indenizações) vítimas do holocausto, as famílias de vítimas dos regimes ditatoriais e os índios que estão tendo suas reservas reconhecidas. Só o negro que não leva nada. Quando se fala em “políticas afirmativas”, todo mundo vira o “bicho”. Desde a abolição, nunca se fez uma política voltada para compensar o negro por seu sofrimento, aliás, nem a abolição foi uma política neste sentido. Sabemos que o que ocorreu foi uma pressão dos ingleses para o fim do escravismo. No final, tudo foi uma grande sacanagem!
Bem, só pra constar, este texto é sobre novembro do ano passado, mas achei legal colocá-lo neste também!!
histosofia@gmail.com

quarta-feira, outubro 15, 2008

Conjecturas

Bem como todos podem verificar não tenho escrito ultimamente, a última postagem foi feita no final de agosto. Não porque me faltaram as idéias ou as palavras, mas porque há momento em que prefiro apenas refletir, sem que minha reflexão resulte em texto. O texto é a constituição do autor com tal, já a reflexão é livre, não se restringe ao documento, a autoria. Tenho pensado sobre muitas coisas, projetos pessoais, política, economia, história, educação e filosofia. Parece muito técnico? Eu sei, mas também gosto de me alienar pensando "bobagens", coisas do tipo como meu time sairá da zona de rebaixamento, a seleção do Dunga, o sacador de rolhas "super maneiro" que olhei numa vitrine, estas coisas...
Estou muito concentrado em projetos, mas as vezes acho isto um saco, as pessoas que conheço me dizem que preciso relaxar, e falar sobre "coisas banais", novelas, televisão, revistas de fofocas, etc. Eu não tenho a menor possibilidade de conversar sobre isto, sempre sou surpreendido com as frases de televisão que viram moda. Ou eu sou um ser insuportavelmente de outra "esfera pública" ou um iludido.
Para dizer a verdade as vezes gostaria de me sentir assim, um sujeito alienado, que não se dá conta das questões globais, dos mecanismos de poder, das instituições de controle, da política demagógica, das estruturas sociais que o capital nos impõe e das distorções ideológicas que entorpecem os sujeitos sem que estes se dêem conta de suas atribuições.
Em fim,ser ou não ser um alienado, os alienados são mais felizes? Freud dizia que não, mas será que os alienados são os outros, ou nós que nos dedicamos a árdua e sofrida tarefa de reflexão e análise da vida?

segunda-feira, agosto 25, 2008

Kabuki Máscaras.

Vivo toda semana o dilema da estar dividido, uma divisão geográfica (viver numa cidade e trabalhar em outra) que me remete a viver uma vida dupla. Sou um ser ambíguo, mas minha dualidade não me desconforta, ao contrário ela me alivia. Isto porque nunca fui apenas eu mesmo, sou mais, sou muitos. Não! Não estou possuído por entidades ou coisa parecida, trata-se apenas de alguém que nunca se conformou em viver simplesmente a vida como disseram que ela teria de ser. Este comportamento me trouxe alguns problemas, pois necessito ocultar alguns dos meus “eu” dos outros. Não é difícil ser autêntico neste planeta, difícil é ser tudo o que somos, não sou hipócrita (talvez um pouco!), mas quem pode ser totalmente honesto diante de todos, quem pode ser irremediavelmente verdadeiro em tudo? É possível que possamos e, muitos assim o fazem, seguir a vida com alguma transparência, mas todos nós ocultamos dos outros o que realmente somos. Freud nos deixou uma herança que provocou um cisma na filosofia iluminista, esta, nos seduziu com um sujeito auto-suficiente que pela via da razão iria redimir o mundo da era das trevas, até Freud nos mostrar que o homem não está no controle de si mesmo. As pulsões e as formas de subjetivação do sujeito transformaram o homem em um ser duvidoso. O homem tornara-se problemático como sugerira o filósofo alemão Max Scheler, ou aprendeu a se compreender melhor ao explorar suas contradições como escreveu o romancista inglês E. M. Foster? O fato é que com o advento da psicanálise o homem, por um lado, deixou de ser senhor de si mesmo, por outro arranjou alguém para culpar por seus erros no lugar do diabo; o inconsciente. Os velhos confessionários, espaço para o homem metafísico falar de suas concupiscências, deram lugar a atual indústria de confissão que são os milhares de consultórios psicológicos e psicanalíticos espalhados por todo o mundo moderno. O princípio délfico (gnóthi seautón) conhece-te a ti mesmo, postulado por Sócrates como conselho a Alcebíades, sofreu diversas modificações ao longo da história até ser esquecido por completo na sociedade moderna ocidental (Foucault). A mediação tornou-se necessária, afinal como posso conhecer a mim mesmo sem a referência do outro? As relações entre os indivíduos nas sociedades modernas tornaram-se mediadas por um especialista da psykhé humana, o psicoterapeuta. O kabuki, palavra oriunda da cultura artística japonesa que representa a arte de: “kA – cantar” “Bu – dançar” e “ki – representar”. A arte em forma de teatro foi irreverente e por vezes coibida pela tradição japonesa, por tratar de desmascarar o cotidiano social de uma sociedade que sempre procurou ocultar seus dramas com máscaras felizes e histórias de valentes guerreiros samurais. Somos seres complexos, ainda inacabados, nos revestimos por uma sucessão de “máscaras”, ou, se alguém ficar ofendido com o termo podemos encontrar um mais sofisticado; “papéis sociais distintos”, isto é, o indivíduo que meus companheiros de trabalho conhecem, não é o mesmo com quem meus filhos convivem, muito menos se trata da mesma pessoa que meus pais viram crescer, no entanto, nenhum destes sou eu, ao mesmo tempo sou todos. Neste sentido, os diários de prostitutas são verdadeiros compêndios de psicologia, neles podemos encontrar revelações que os sujeitos jamais fariam em outro ambiente social, tais revelações certamente seriam levadas para o túmulo sem que a pessoa mais íntima pudesse conhecer as obscuridades do outro. Por que ocultamos nossos pensamentos mais infames? Porque a sociedade criou um modelo de moral, normatizou os comportamentos socialmente aceitáveis e inaceitáveis, marginalizando todos aqueles que por alguma razão não quiserem viver segundo as normas. Assim os homossexuais, os hermafroditas, os sodomitas, as prostitutas, os loucos, os ignorantes e outros excluídos desta sociedade “perfeita” vivem a espreita, a deriva. Os “normais”, quando acometidos por um pensamento que represente algum comportamento atribuído a um destes excluídos, rapidamente tratam de se auto-repreender, como se o que sentissem fosse repugnante e inaceitável. Depois ao perceber que este pensamento ou prática não os abandonou, procuram ao menos escondê-lo dos outros, afinal nossas fontes de prazer precisam ser preservadas!

domingo, agosto 10, 2008

Segredos

Acredito não ser segredo para ninguém que todos temos os nossos segredinhos. Alguns os chamam de “sótão” (fica acima; deve ser bons segredos!). Outros os chamam de “porão” (fica no subsolo; deve ser segredos cavernosos!). Há ainda quem os chamem de “caixa preta”, “caixa de pandora”, de qualquer forma, todas essas definições indicam a obscuridade ou a singularidade de um segredo.
No feriado de sete de setembro, participei de um congresso internacional sobre álcool e drogas no Hotel Glória, este hotel é espetacular, mas não tenho muito que dizer aqui sobre o congresso. Sobre minha estadia na casa de minha irmã e cunhado, Janete e Josué, aí sim há o que revelar.
Para início de conversa descobri que todos nós temos nossos transtornos psíquicos. Meu cunhado, por exemplo, sofre de transtorno assimétrico-obsessivo + síndrome de ansiedade-depressiva-bipolar: CID. 10 FS.41,45,46. Já a “Batatinha” (apelido de muito tempo da minha irmã, mas é segredo!), sofre de transtorno de esquecimento-generalizado, seguido de síndrome da ambição-capitalista/social; CID.12. F$ 20,30,40. Eu, bem, sofro de transtorno assimétrico-moderado e de esquecimento-detalhado, além da bibliofilia (parece grave?); CID.22 F13,15,20.
Após este relatório biopsicosocial, voltemos ao segredo. Devemos pensar que é durante o desenvolvimento da criança que essa história dos segredos começam e tudo indica que os grandes culpados são os adultos. Porque as crianças escondem seus segredinhos? Se uma criança mete o dedinho no nariz e leva um tapa na mão e uma bronca sempre que faz tal gesto, com o passar do tempo ela deixa de fazer. Que pedagogia podemos supor que foi apreendida? Ela certamente agora mete o dedo no nariz longe da presença dos adultos. É assim que aprendemos a guardar nossos segredos, eu mesmo já levei alguns tapinhas na mão, mas vamos mudar de assunto!
Existem pessoas que afirmam ser um “livro aberto”, os políticos gostam de se apropriar desse discurso, até que tomamos conhecimento de contas em paraísos fiscais, empresas fantasmas, amantes cujas despesas são pagas por terceiros, etc. O fato é que não existem pessoas do tipo “livro aberto”, por mais espontânea que alguém possa ser, todos guardam seus segredos.
A prática da “confissão” instituída pela Igreja na Idade Média teve por objetivo saber como as pessoas eram de fato, isto é, o que as pessoas escondiam do Santo Padre. A confissão estabeleceu um poder da Igreja sobre seus fiéis, ela poderia em nome de Deus, saber de tudo (ou quase tudo) que se passava. A Igreja, esta sim têm muitos segredos que ainda estão por ser revelados, embora fiquemos bestificados com uma pequena parcela daquilo que já foi “desenterrado” pela história.
Voltemos à política, alguém poderia revelar o segredo dos políticos. Creio que é a única classe social onde 90% dos que a pertencem, ficam ricos! Qual será o segredo deles? Político pobre ou é burro ou honesto!

histosofia@gmail.com

quinta-feira, julho 24, 2008

Tempo de Recomeçar

Tempo de Recomeçar

As nossas vidas são marcadas de começos e recomeços. Como escreveu certo filósofo francês, ela (a vida) é uma sucessão de continuidades, descontinuidades e rupturas.
O recomeço, no entanto não é tarefa fácil, pois no primeiro momento implica em admitir começar do zero novamente, ou seja, reconhecer que a caminhada trilhada até o momento presente deverá ser interrompida. Este ‘admitir’ não é simples como pronunciar simplesmente uma palavra. É uma cisão, um novo começo.
Em alguns casos a decisão mais acertada a fazer é exatamente recomeçar, embora alguns caminhos não são possíveis percorrer duas vezes. Isto, se considerarmos a tese de Talles de Mileto, que diz não ser possível banhar-se no mesmo rio duas vezes. O mais provável é que ao recomeçar algo, estaremos iniciando uma nova ação, não a mesma ação do passado, mas outra ação.
O passado por sua vez tem o hábito de nos empurrar a repetir os erros, a isto, chamamos princípio da insanidade, ou seja, repetir o mesmo comportamento, esperando resultados diferentes. Por isso mudar é tão difícil, daí o fato de muitas pessoas desistirem de seus objetivos, pois, alcançar certos alvos, implica mudar comportamentos, mas quem tem disciplina suficiente para efetuar uma mudança?
A mudança, porém, é um processo, significa dizer que não é um movimento repentino, brutal ou automático. Toda mudança implica uma conscientização, um ponderamento, toda mudança implica em transformar a própria realidade.
Como escreveu Rubem Alves, mudar é reformar a casa com agente dentro dela, tudo fica fora do lugar, o transtorno gerado com a poeira, o cheiro de tinta, as batidas de martelo, nos conduzem a recuar e permanecer com a comodidade do óbvio. Alves nos adverte com um porém àquele que ousar mudar; “aos poucos o que era transtorno vai ganhando contorno de lar, e o que se vê causa alívio e admiração”.

domingo, julho 06, 2008

Sonho Real

A vida toma rumos que a razão não poderia explicar, os sentimentos como diria Rubem Alves são a sensibilidade do pianista. Pode-se explicar por meios lógicos como se fabrica um bom piano, mas quando o pianista se senta sobre ele e começa a compor uma canção... como compreender... os movimentos, a harmonia, a melodia? Como explicar o canto dos pássaros, como explicar a paixão?
A ciência, pode até nos dizer como nossos neurotransmissores trabalham e se interligam nas diversas sinápses quando nos apaixonamos, mas a sensação de se apaixonar.... quem saberia dizer!
Só quem se apaixona poderia tentar descrever tais sensações.... as palavras nos faltam, são insuficientes...uma ansiedade toma conta de nós quando se aproxima o momento de encontrar a pessoa por quem nos apaixonamos.
Tudo nos parece inspirador; se chove, pensamos melancolicamente no outro, se faz sol, uma lembrança alegre irradia dentro de nós e nos deixa com um sorriso besta no canto da boca.
Só as cançôes e as poesias podem expressar tais sensações, isto porque elas são fruto desses sentimentos, são produtos elaborados a partir de um sonho real, afinal, como diz o poeta, sonho que se sonha junto; é realidade!

domingo, junho 29, 2008

Proibicionismo para quem vê?

Mais uma lei "pra inglês-ver" entrou em vigor este mês (Projeto de Lei de Conversão nº 13/2008), a lei que proíbe qualquer teor de álcool no organismo é um caso tipicamente brasileiro. Me fez lembrar a lei que levou a revolta da cachaça no século XVII em Mariana nas Minas Gerais, a lei, proibiu o consumo interno e a produção em larga escala. Os donos de alambiques se revoltaram, a medida tinha por objetivo proteger os produtos portugueses; no caso a bagaceira e o vinho do porto.
O que me impressiona é que após trezentos anos nossa administração pública continua uma bagunça (claro, não em todos os setores!), o exército sobe o morro para garantir as reformas do projeto do bispo político que não é mais bispo. Depois o exército desce o morro porque alguns militares se envolveram com traficantes do morro vizinho e a globo fez o que pôde para derrubar o ex-bispo.
A lei sobre o álcool é outra confusão, primeiro proíbem a comercialização nos arredores das rodovias brasileiras, depois resolvem relaxar. Agora baixam uma medida de “tolerância zero”, bem, se antes dois chopes ou duas taças de vinho podiam ser toleráveis, ou seja, mais ou menos 6 decigramas de álcool no sangue. Hoje estamos na iminência de uma nova “lei seca”, uma lei, que demonstra a ausência de percepção política dos nossos médicos políticos. O sistema repressivo já deixou muitas evidências de sua total ineficácia, os EUA, servem como um exemplo, basta lembrarmos de Alcapone.
O caso brasileiro não só é um retrocesso, como também trata-se de um episódio hilário, já que não dispomos de equipamentos; os tais bafômetros. Para piorar dos que dispomos em sua grande maioria estes aparelhos não podem detectar pequenos teores de álcool no organismo. Temos uma boa política nacional no que tange a questão das drogas, já avançamos em vários aspectos, a atual política nacional sobre o álcool também e relativamente boa, o problema é quando se parte para medidas radicais. A radicalização não faz outra coisa senão provocar no outro resistência, é um fenômeno que Nilton já tratara em uma das suas leis, a lei da ação e reação. No Brasil, porém, aprendemos a adotar uma outra lei, ao invés da reação, damos um “jeitinho” ( o que não deixa de ser uma reação), o famoso jeitinho brasileiro, que já nos fez ficar famosos no mundo todo por tal peculiaridade, certamente nos permitirá a driblar mais uma vez a truculência legislativa que impera em nosso país.
Sabemos que os acidentes de trânsito em nossas estradas são em sua maioria provocadas por jovens bebedores de finais de semana que abastecem seus tanques nas lojas de conveniência das grandes redes de postos de gasolina. Mas a partir de agora se você quiser sair para jantar com a família ou namorar, não pode tomar nem uma taça de vinho. Esta certamente é mais uma das tantas leis que logo, bem logo, cairá no esquecimento, assim como ocorreu com o kit socorro, com a luz na bola do reboque entre outras, então todos poderemos voltar a vida normal e tomar nossas cervejinhas sem maiores problemas.

quarta-feira, junho 11, 2008

AS HISTÓRIAS DE NOSSA VIDA

Ontem eu assisti ao filme “A dona da história” dirigido por Daniel Filho, com Marieta Severo, Antônio Fagundes, Rodrigo Santoro e Debora Falabela. O enredo do filme trata da avaliação dos últimos trinta anos de casamento de uma mulher, esta, chega a conclusão que não quer mais manter seu casamento. Uma série de arrependimentos sobre coisas que gostaria de ter feito sondam sua mente, mas devido aos quatro filhos que criou não pôde fazer. A personagem volta na história e interage consigo mesma quando ainda jovem antes de casar, e avalia outras possibilidades de escolhas que poderia ter-lhe dado um outro tipo de futuro. Na primeira escolha, ela não se casou, tornou-se uma solteirona arrependida que trabalhava em uma locadora e amargava todos os dias com a lembrança do seu grande amor. Na segunda escolha, ela havia se casado com um cara cheio da grana e se tornara uma senhora da alta sociedade e uma infeliz alcoólatra. Na terceira, ela era uma atriz de teatro famosa, mas que daria tudo para ter vivido uma grande história de amor. No final do filme, ela conclui que não havia razões para se arrepender do que não fez, a sim se orgulhar, afinal ela havia vivido um grande amor.
O filme me levou a refletir sobre os níveis de insatisfação pessoal que faz com que milhares de pessoas todos os dias busquem consultórios médicos e psicológicos, pastores, padres, pais de santo, na esperança de minimizar suas frustrações. O arrependimento pelos erros cometidos, por decisões não tomadas, por escolhas equivocadas, fazem dessas pessoas, seres incapazes de vislumbrar o presente como uma realidade satisfatória, com uma possibilidade de um futuro livre de ressentimentos. Peter Drucker escreveu que a única forma de prever o futuro é construí-lo, somos donos de nossa própria história, mesmo quando somos obrigados por forças contrárias a vivenciar situações que não gostaríamos. Lamentar o que já passou é como discutir com o espelho, é res-sentir a frustração. Não há nada que se possa fazer sobre o passado, o tempo perdido foi-se e não volta mais. Kierkegaard dizia que a vida só poderia ser entendida olhando-se para trás, mas deve ser vivida para frente. Provavelmente as pessoas mais felizes não são aquelas que erram menos e sim as que aprendem mais rápido com seus erros, lamentavelmente esta virtude é incomum no espírito humano, ao invés de se procurar entender e aprender rapidamente com os erros as pessoas paralisam-se diante da vida. São muitos os sentimentos que às fazem sofrer, o medo, a vergonha, a sensação de impotência, o receio de falhar novamente geralmente fazem com que algumas pessoas desistam de seus sonhos. O sonho, aliás, torna-se um projeto inviável, possível apenas a poucos “sortudos” tal postura, serve evidente, para minimizar a frustração e propiciar a conformação (uma pseuda-conformação) da realidade.
Por outro lado, nesta sociedade globalizada as pessoas são vítimas dos veículos de comunicação de massas, da economia de consumo. Numa sociedade onde a valorização narcisista do eu, que procura eleger faraós e cleópatras modernos, é fácil se sentir culpado por não ter tido “sucesso” como o esperado. Somos separados por classes e subclasses, sempre se busca estar um andar acima. Toda existência humana está pautada na lógica de possuir, do obter, trabalha-se dia e noite em nome de uma causa que não objetiva mais o bem estar social como nas eras passadas e sim o status pessoal. Um modelo de vida diversificado que gira em torno da preparação para a vida, ou seja, estudar e trabalhar para ser alguém e constituir família. E é justamente neste ponto onde as frustrações aparecem, transformando pessoas que deveriam viver livre e plenamente a vida em verdadeiros peregrinos, cujo fardo já não é mais suportado.
Felizmente, a felicidade é um caminho que passa pela desconstrução de todos esses paradigmas pós-modernos, um amigo certa vez me disse – quer se aproximar do divino? Aproxime-se do simples – eu nunca mais esqueci. A simplicidade muitas vezes confundida com pobreza, não está fundamentada em o quanto você adquiriu, mas no que você se tornou. Sabe aquele papo – se arrependimento matasse eu já estaria morto! – Pois é, muita gente já teria morrido e muitas de fato morrem. A grande maioria não morre, porém deixa de viver, parece estranho, mas é isso mesmo. Não se trata de uma teoria do caos, e sim de uma continuidade de vida resultante de escolhas que fizemos e fazemos. O pessimismo não deve se aplicar a tudo isso, já que sempre é possível fazer novas escolhas e decidir ser diferente, fazer diferente, viver diferente. Se nos desprendermos do passado e focarmos nossas ações no acerto, ainda que voltemos a errar (e certamente erraremos), não será um ato inconseqüente e sim um acidente de percurso. Nossa história pode e merece ter um final feliz, ainda que uma parte dela tenha sido marcada por tragédias, é possível dar um outro ritmo, outra cor, outro tom a vida. Dependerá exclusivamente do que escreveremos no livro de nossas vidas daqui para frente, o que passou é página virada.

terça-feira, junho 03, 2008

A ESTRADA

O asfalto ainda está úmido de orvalho,
o sol vagarosamente escapa a bruma fria que lhe envolve, revelando um céu azul límpido.
Contemplo a serra dos órgãos enquanto ouço Capital Inicial,
“quando a chuva cai, nestas noites solitárias, lembre-se sempre, estarei aqui...,”
meu pensamento vai ziguezagueando como as curvas da estrada,
trazendo a todo momento você em minha memória.
E embora o dia esteja singularmente irradiante, meu coração é feito a flor que ao receber os
primeiros raios solares desperta alegremente em meio a relva.
Mas o meu sol ainda não brilhou pra mim, desta forma sigo em frente, quero ir ao encontro do teu
horizonte, ofuscar-me no teu brilho, captar tua luz, sentir teu calor e me aquecer no teu colo.

Jonatas C. de Carvalho

quinta-feira, maio 29, 2008

POEMA EM LINHA RETA

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
indesculpavelmente sujo,
eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
eu que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
que tenho sofrido enxovalhos e calado,
que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
eu, que tenho vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda gente que conheço e que fala comigo,
nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
nunca foi senão príncipe – todos eles príncipes – na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana,
que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo, sem ter sido traído,
eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
vil no sentido mesquinho e infame da vileza.



Fernando Pessoa
Poesias de Álvaro de Campos

Homenagem a este fantástico Poeta!

quinta-feira, maio 22, 2008

SOLIDÃO

Não sei como, mas toda vez que me sinto solitário me ponho a escrever, não me disponho a ouvir quem quer que seja, ou a sair para "desparecer". Gosto de desfrutar deste momento, muitas vezes esta sensação torna-se nostálgica, daí ponho-me a escutar um bom e velho blues, como o que escuto neste momento (I Cant´t Keep It Up - Blue Roots), enquanto escrevo estas linhas. A solidão é curiosa, ela pode nos abater em meio as pessoas, não se trata de um fenômeno que só ocorre por conta do isolamento, mas nos isolamos em função do sentimento não importando se estamos sozinhos ou não.
A solidão é representada socialmente como uma sensação não agradável, "pra baixo", algo que ocorre com quem precisa de análise. Existe, porém, algumas contribuições que a solidão nos proporciona: um auto-encontro, por exemplo; o momento em que ninguém, absolutamente ninguém pode tirar de você o prazer de estar ali, apenas você e seus pensamentos. A solidão também propicia-nos uma revisão em nossa memória, momento em que podemos trazer de nosso inconsciente aquilo que nos marcou, que suscita as mais variáveis sensações e emoções.
A solidão neste caso, pode ser entendida como uma dádiva, um espaço singular, impenetrável por outras mentes. Lugar habitável apenas por você, onde suas lembranças, medos, fantasias e sonhos, são repassados sempre que você quer revê-los ou "re-sentí-los". Da solidão brotaram os mais belos poemas e as mais lindas canções. Sinto-me só, penso em muitas coisas, mas prefiro não escrevê-las aqui.
Hoje minha linda e adorável filha completou dez anos, passamos todo o dia juntos e nos divertimos muito. Parabéns meu amor; Te Amo.....
Niterói 22/05/2008

quarta-feira, maio 14, 2008

Reflexões Psicodélicas.

Faz dois meses que eu deixei minha atividade de coordenador de uma Comunidade Terapêutica, sinceramente achei que fosse ser mais difícil olhar para trás. Talvez eu seja alguém que não nutra apego ou afetividade pelo passado, ou talvez eu seja apenas normal. Sempre me atemorizei com a possibilidade de fazer sempre a mesma coisa por toda minha vida, acredito que quem se orgulha de um feito desse é no mínimo medíocre. Afinal a vida nos oferece tantas possibilidades, por que deveríamos nos fincar numa mesma posição até que nossos dias se acabem? Durante anos eu ouvi indivíduos falarem de suas compulsões, de seus vícios e de suas loucuras. Muitos dos que atendi, já morreram, muitos continuam na loucura e alguns poucos estão sóbrios. O que eu testemunhei durante todos estes anos daria para escrever uma tese, mas nunca me interessei em transformar estes sujeitos em “objetos de estudo”, sempre me senti diante deles como alguém impotente e incapaz de realmente ajudá-los. Costumava dizer que eu não passava de um “mero espectador da mudança alheia”. Descobri que apenas uma pessoa pode me motivar a mudar; eu. É claro que os programas terapêuticos são ótimos auxiliadores, eles são imprescindíveis àqueles que buscam mudança, mas inócuos aos que não dão a mínima se vão morrer.
Minha atual atividade é infinitamente mais “leve”, não trabalho mais com “gente”, minha função é burocrática, técnica. Ajudar o próximo faz parte do discurso de qualquer pessoa, levei milhares de “tapinhas nas costas”, ao longo destes anos em que trabalhei ajudando jovens a se livrarem das drogas, quando era solicitado para palestras e falava sobre nosso projeto as pessoas diziam que me admiravam e que adorariam fazer o que eu fazia. Era estranho ouvir aquilo, parecia que eu não era deste planeta, com o passar dos anos passei apenas a sorrir quando ouvia este tipo de comentário. Compreendi que neste mundo não temos tempo para sermos solidários com o outro, pois não damos conta nem dos nossos. Por outro lado, conheci muita gente solidária, pessoas que doaram suas vidas aos desfavorecidos e excluídos, gente que simplesmente fez da solidariedade uma atividade de prazer e lazer.
Mas eu me recolhi, não quero mais ser solidário, serei egoísta e vou pensar apenas nos meus. Não quero mais ouvir problemas de ninguém, não quero dar esperanças para ninguém e não vou trabalhar mais de graça para ninguém. Quero continuar com meus estudos, construir meu chalé na serra, tomar meu vinho sem ser interrompido por qualquer pedinte. Quero ler todos os livros que tiver vontade, quero sair para pescar com minha família, viajar, etc. Chega de ser solidário, de doar meu precioso tempo aos outros, Sartre dizia “o inferno são os outros”, será que era disso que ele falava? Provavelmente não. É claro que é gratificante contemplar um indivíduo dar a volta por cima e passar a ter uma vida com o mínimo de dignidade, mas estou cansado. Transformarei-me num estóico, ou mais ainda, serei um “filósofo cínico” ao estilo Diógenes o cão e pedirei que todos saiam da frente do meu sol.
Jonatas Carvalho.

quinta-feira, maio 08, 2008

Filosofia e Futebol

"Nunca confie na probabilidade do inimigo não estar vindo, mas dependa de sua própria prontidão para o reconhecer. Não espere que o inimigo não ataque, mas dependa de estar em uma posição que não possa ser atacada." (Sun Tzu. A arte da Guerra)

Criei, este espaço para falar das questões da vida, para filosofar, não para escrever sobre bobagens, mas depois de ter assistido a desclassificação do flamengo da Libertadores, realmente me pus a refletir. Após chegar em casa cansado e louco para dormir liguei despretensiosamente a TV, para um tricolor como eu não fazia sentido assistir uma partida ganha do flamengo. O primeiro gol saiu, me despertando aos poucos, e assim que os outros gols surgiram entrei em estado de êxtase, perdi o sono!
Quem disse que não é possível filosofar sobre uma partida como esta! A primeira grande lição é que não podemos sob qualquer hipótese, ignorar, negligenciar ou menosprezar o adversário, há 2.500 anos, Sun Tzu já alertava sobre isto. O grande general falou que sempre após a vitória de uma batalha, não se deve “bebemorar” até o sol raiar, pois o inimigo está concentrado nos nossos pontos fracos. Tzu, já conhecia o bastante sobre a vaidade e auto-suficiência humana sem precisar conhecer a falta de profissionalismo dos clubes cariocas, já o flamengo bem que poderia ter lido a "Arte da Guerra".

sábado, maio 03, 2008

A Arte da Escrita II

Alguns filmes me comovem devido sua história dramática como a “Cor Púrpura”, outros pela sua genialidade como “Forrest Gump”. Há os que mexem com meu espírito militante e os que me comovem pela beleza e originalidade do roteiro. Não estou escrevendo, porém, para falar de cinema, pois não sirvo para crítico e nem ligo para as críticas. Adorei ter visto filmes que foram escorraçados pela critica e odiei alguns que receberam os louros dos críticos. Isto deve significar que eu não entenda nada de filmes? Talvez apenas mostre que gosto não se discute. Foi a terceira vez que assisti “Encontrando Forrester” e este é um desses filmes que me comovem pela beleza e originalidade do roteiro. Uma história que envolve personagens de gerações e cultura muito diferentes, ambos descobrem lado a lado como vencer seus medos. Forrester, personagem vivido por Sean Connery, é um escritor vencedor do Pulitzer, mas que vive isolado por anos num apartamento do Bronx. Jamal Wallace (Rob Brown), um menino negro de dezesseis anos que tem duas paixões: o Basquete e a Literatura. O que mais me chamou atenção no filme é uma fala de Forrester sobre o ensino do ofício de escritor, “eu só o ajudei a colocar para fora o que estava dentro dele”. Em um momento do filme o escritor pega uma máquina de escrever (alguém ainda lembra o que é!), dando inicio a uma seqüência de palavras, ele pede que o jovem Jamal faça o mesmo, e diz: “primeiro, escrevemos com o coração, depois com a cabeça”. Como deve ser fantástico se sentar diante de uma página em branco e preenchê-la sem dificuldade alguma. Ir escrevendo o que vem a cabeça sem precisar fazer pausas para organizar o pensamento. Li algumas entrevistas de escritores consagrados que diziam que o maior medo de suas vidas é não ter o que escrever. Sempre que chego ao meio de uma página fico me perguntando como chegar ao seu fim. Descobrir se o que mora dentro de nós, é de fato um escritor ou apenas um imbecil que aprecia as palavras, mas na verdade não sabe organizá-las, não é uma tarefa fácil. Será que é normal ficar olhando para a tela de um computador sem saber como concluir uma frase que se começou? Para que o escritor more dentro de nós penso que sejam necessárias duas coisas: gostar de ler muito e de pensar. Tanto uma coisa como outra é malvisto pela sociedade de um modo geral. Se o escritor é famoso, todos acham legítima a reclusão para o ofício. No caso de um anônimo qualquer este ganhará a fama de lunático, vagabundo, alguém que quer se esconder da vida e por ai vai. Estar lendo ou escrevendo é como não estar fazendo nada de importante, as pessoas te interrompem e te importunam por achar não ser nada demais. Acho que escrever é como qualquer outro talento, mas talvez pela dificuldade que se tem em organizar os pensamentos, concluir um trabalho para o escritor seja mais edificante (não mais importante), do que pintar uma casa. Quando o pintor termina seu trabalho sente a sensação de dever cumprido. Os proprietários apreciam o novo ambiente e desfrutarão deste prazer por algum tempo até que haja necessidade de pintar novamente. Já a escrita, é uma pintura que não se desgasta, as palavras permanecem. A obra de um escritor fica registrada ainda que se esgote uma edição, sempre será possível ler e reler os versos construídos por determinado autor. Assim, pode-se ainda manter vivas as palavras de Herótodo, Platão, Nietsche e Dostoiévski. O cinema por sua vez é a representação (ou interpretação) do imaginário provocado pela leitura de um livro. É o mergulho do sujeito no objeto produzido por outro sujeito, que se fundirá num outro objeto. Toda essa empreitada envolve pesquisa e tempo, determinação e imaginação, prazer e dor. Fascina-me filmes com narrativas, mas o que é mais fascinante ainda é elaborar imagens concretas do que se leu, transformando-as em cenas, capítulos, episódios. A arte da escrita possibilita outra arte, a da leitura. Uma vez que o sujeito que lê, re-elabora o objeto de leitura a partir de sua subjetividade, logo o objeto lido não é mais o mesmo. O texto uma vez difundido perde sua originalidade, não pertence mais ao autor, é um novo texto a cada leitura. Cada Romeu e Julieta que é apresentado em todas as partes deste mundo, é uma nova construção, não mais pertence a Shakespeare, mas é fruto da cultura cotidiana de cada indivíduo que o lê. Esta possibilidade é uma arte, pois quando leio uma obra ela passa a me pertencer, seja ela qual for. Esta arte que é produzida dentro de cada leitor não pode virar ciência não pode ser quantificada, mas pode ser vivida e sentida no intimo de cada leitor no seu encontro com a obra de cada escritor. Jonatas Carvalho histosofia@gmail.com

segunda-feira, abril 28, 2008

A Arte da Escrita

Hoje eu assisti um daqueles bons romances que quando acabam, estamos a lacrimejar. O filme foi gravado em toscano na Itália, com belíssima fotografia onde as margaridas dos campos e as águas límpidas do mediterrâneo proporcionavam um ambiente de paraíso. Sempre que assisto a um filme com narrativa fico estarrecido, é como se alguém estivesse lendo um livro pra mim.
Fico imaginando se um dia terei a habilidade dos grandes escritores em descrever tudo ao seu redor, e mais, tudo que o toca a alma. Perceber, sentir o que se passa nas mentes das pessoas, descrever seus comportamentos, seus sonhos, suas ilusões. “Nunca perca sua inocência” disse certo escritor, talvez esteja ai o segredo de transcrever a vida.
O olhar do escritor precisa ser como o olhar de uma criança, capaz de avaliar, julgar, de perceber e interpretar sem meias palavras, com inocência crítica. Tudo é descrito com a sutileza de um perfume cuja fragrância passa pelas narinas tal como se fosse a brisa mais leve que já soprou.
Sensibilidade! Quem me dera ter, não sei se seria mais feliz se me fosse possível tal dom, mas eu o desejo. Como o pintor que derrama sobre a tela branca e na brancura sintetiza anseios e desejos, sensações coloridas, escorridas, contando-nos, revelando seus mais profundos pensamentos. Assim eu imagino o escritor. Alguém que coloca palavra após palavra sobre as linhas do seu caderno, destilando da tinta de sua esferográfica o que há de mais intenso na vida. Deliciando o leitor como se por receitas, palavras que tocam a alma, o âmago, hora dinamizando, hora mutilando nosso ser, extraindo aplausos mentais, misturado a colapsos nervosos.
Escrever é poder, é se armar da mais poderosa arma, é sacramentar o pensamento, dar sentido ao abstrato. Quem viaja sobre as linhas escritas de um livro percorre as mais belas estradas, descobre os mais incríveis lugares, pessoas interessantes, vidas impressionantes.
Meus olhos ardem, agora neste momento tudo que ouço é a respiração do meu filho que dorme como se o amanhã não fosse chegar. Os ponteiros do relógio se juntam ao número um, me alertando que minha hora chegou. Por um momento pude brincar de escrever, amanhã quando acordar saberei que sonhei, mas ainda que por pouco tempo este sonho valeu e por tê-lo registrado poderei sonhá-lo novamente. O que sentirei ao ler estas linhas amanhã? Nostalgia, decepção, não sei. Saberei, porém, de uma forma ou de outra que foi só um sonho, sonho de quem quer ser escritor.

Jonatas C. de Carvalho

sexta-feira, abril 25, 2008

Resposta ao Tempo

“Respondo que ele aprisiona e eu liberto.
Que ele adormece as paixões e eu desperto.
E o tempo se rói com inveja de mim,
me vigia querendo aprender,
como eu morro de amor, pra tentar reviver.
No fundo é uma eterna criança,
que não soube amadurecer.
Eu posso, ele não vai poder, me esquecer.”
(Nana Caíme)


O que é o tempo, senão um meio de contabilizar a finitude humana. É interessante ver como as pessoas se relacionam com o tempo. Elas “correm contra o tempo”, tentando fazer algo o mais rápido possível como se o tempo pudesse se extinguir. Elas “correm atrás do tempo”, na tentativa de não perdê-lo de vista, imaginando que ele possa ser alcançado. Elas “lutam contra o tempo”, como se este fosse o inimigo feroz a ser abatido. Elas buscam “superar o tempo”, numa competição desigual, onde certamente seriam pegas no caso de um exame de doping. Elas procuram “recuperar o tempo perdido”, como se este fosse uma moeda que caiu no banco de trás do carro. As pessoas vivem se queixando da “falta de tempo”, como se este fosse insuficiente, assim como uma ficha de fliperama.

O tempo é então tratado como um “fetiche” (fazendo uso da linguagem marxista), transformado em mercadoria, um produto a serviço do grande capital, um trunfo do capital humano. As grandes empresas nos ensinam como “lidar com o tempo” de modo a não “desperdiçá-lo”, ao contrário, devemos saber fazer o “uso correto do tempo”, “ganhar tempo.” Foi Benjamim Franklin quem cunhou pela primeira vez a frase “time is money”, o que Franklin não imaginava é que  seu país se tornaria a nação mais capitalista do mundo, que nas terras onde ele plantou cânhamo, nunca mais se teve tempo para nada e que há décadas os estadunidenses se alimentam em “fast-food”. 

Quanto tempo ainda temos? O que fizemos com o tempo de nossas vidas? Outro dia ouvi uma entrevista do Niemayer dizendo que faria muitas coisas diferentes se pudesse “voltar no tempo”, ele criticava aos que arrogantemente dizem que fariam tudo igual se fosse o caso de uma segunda chance. Essa coisa de “voltar no tempo”, já rendeu muita grana aos produtores de Hollywood, dezenas de filmes trataram deste tema, a “máquina do tempo”, “perdidos no espaço”, “efeito borboleta”, etc., mas o tempo continua a ser uma incógnita para nós mortais. 

Os arrependimentos dos atos passados ou da ausência deles, a ideia inerme de que não podemos “corrigir”, o que fizemos há anos ou há dias atrás, nos causa angústia. O tempo está ou não a nosso favor? Ele nos impõe a cada amanhecer um dia a mais nas costas, o peso do envelhecimento aumenta e não possuímos o “elixir da juventude”. Alguns de nós se orgulham de como usufruíram o tempo, outros lamentam e sofrem por não terem sido tão hábeis. 

Mas há os que respondem ao tempo à altura, que usaram sabiamente cada momento, que não se deixaram levar pela lógica do mercado tornando-se “prisioneiros do tempo”, ao contrário tornaram-se livres, amigos do tempo. Para esses o tempo não é uma “faca no pescoço”, o relógio (objeto bastante interessante de medir o tempo), nos sinaliza quando estamos atrasados ou adiantados, não é uma algema. Não importa o que perdemos, ou deixamos de ganhar e de fazer, importa que o simples fatos de estarmos vivos, nos possibilita dar uma resposta ao tempo, o tempo é o presente, o agora, se há alguma coisa por fazer este é o momento. Não significa dizer que se não realizarmos alguns sonhos seremos infelizes, quantos sonhos nossos são apenas vaidade. Responder ao tempo é viver, viver um dia de cada vez, viver usufruindo da vida, da família, dos amores. Responder ao tempo é sair pra pescar, é jantar com os amigos, é fazer aquele curso que você sempre quis, é matar uma tarde de trabalho pra vagabundar (eu ia dizer um dia inteiro, mas acho que vou ser linchado por uma afirmação assim.), é casar de novo, amar de novo, ou amar intensamente a mesma pessoa por anos e anos.

O importante é não deixar o “tempo passar” diante dos nossos olhos sem que reajamos a ele.


Jonatas Carvalho



segunda-feira, abril 21, 2008

Sobre aquários e gaiolas.

Nunca mais olhei da mesma forma para um aquário, desde que assisti “Procurando Nemo” da Disney. Minha esposa e eu levamos nossos filhos João Mateus e Júlia ao cinema na intenção de diverti-los, mas quem saiu de lá maravilhados fomos nós. Descobri como uma relação entre pai e filho pode ir além do convencional. Um peixe medroso que vivia em um coral vence todas as suas “neuras” e atravessa o oceano em busca de seu filho.
Há duas lições de alto valor nesta história para crianças. Primeiro é que somos capazes de vencer nossos medos pelo amor. O amor é este sentimento que nos faz superar, surpreender. Faz-nos ir além de nós mesmos e chegar onde nunca se imaginou. O perigo que antes era tremendo, intransponível, torna-se um obstáculo certamente vencido. Os problemas até então indissolúveis, vão sendo resolvidos um a um como num jogo de palavras cruzadas até que não sobre mais nada a ser resolvido.
Se fossemos capazes de lutar por nossos sonhos como se estes fossem nossos filhos, talvez tivéssemos conquistado mais coisas. Provavelmente não desistiríamos tão facilmente mediante os desafios e contratempos. Mas há um aspecto maravilhoso nisso tudo. Não se pode avaliar o valor de um filho, e muito menos compará-lo a qualquer sonho. Talvez seja essa a razão de sermos tomados por uma coragem sobrenatural quando nossos filhos estão em apuros.

Sempre odiei ver pássaros engaiolados. Quando garoto meu pai tentou criar alguns, mas, as espertas aves sempre arranjavam um jeito de fugir. Meu pai não entendia como elas saiam, eu porém, me senti no direito de colaborar com as pobres aves, por isso eu abria as portinhas das gaiolas e pensava; se elas gostam de ficar aqui, então não fugirão, mas se voarem é por que não gostam de ficar presas. Eu respeitava a liberdade delas.

Fico pensando como somos privados pelos modelos sociais e morais, esses modelos nos encaminham para dentro de gaiolas e aquários. Como no mito da caverna de Platão, tudo é uma grande ilusão, mas todos querem que acreditemos ser real. E esta é a segunda grande lição do filme. Percebi que em um aquário não há liberdade mas conformação. Tenta-se viver feliz já que não se pode mudar a vida. Somos feridos marcados em nosso interior, traumas que nos aprisionarão pelo resto de nossas vidas, farão de nós eternos “engaiolados”, cercados por uma redoma de vidro.
Já observou estes aquários grandes? Lá dentro é um mine mar, com algas, pedras, conchas, embarcações afundadas, um colorido maravilhoso, tudo muito belo, uma réplica do oceano, mas é só um aquário.
Se acredito no amor como força para superar quaisquer obstáculos, acredito na educação e no conhecimento como instrumentos libertadores contra as “prisões” que nos são impostas neste mundo. Somente pela educação é possível ter discernimento, só tendo condição de fazer juízo de algo, pode-se ser livre de verdade. Sem conhecimento, o ser humano acomoda-se mediocremente em seu aquário colorido, ignorando a existência de um oceano.

Jonatas C. Carvalho.

sábado, abril 19, 2008

A fragilidade da humanidade.

A vida é mesmo um vapor? Num momento estamos no ônibus, carro, elevador, rua escritório, casa ou qualquer outro lugar. No momento seguinte, podemos estar em um hospital, cemitério ou necrotério. A questão aqui é quem determina o instante seguinte, o próximo minuto? Quem decide que tragédia ocorrerá, com quem e que tipo de acidente se dará? Se um Boeing explodirá no ar, um trem se descarrilará, se um transatlântico colidirá com um iceberg ou se um automóvel derrapará na pista. Quem decide sobre fenômenos naturais devastadores; furacões, vulcões, maremotos, terremotos? Se alguém cai de uma árvore, tropeça numa casca de banana, sofre um infarto é por que chegou a hora? Quem decide quando e como? Um parto complicado, uma pipa com cerol que toca o fio de alta tensão, uma bala perdida!
Existe esta coisa de estar no lugar errado na hora errada? Seria ironia do destino? Causalidade ou pré-destinação? Teoria do caos, lei do equilíbrio, forças da natureza.
Um fator que perturba a raça humana ao longo dos anos é sem dúvida sua própria vulnerabilidade. Como seres tão especiais capazes de desenvolver projetos dos mais sofisticados possíveis pode ser paradoxalmente tão frágil? Como se pode ser excessivamente auto-suficiente e particularmente impotente?
Não se pode abordar um tema desses sem passar pela especulação, sem dúvida antes da ciência se apropriar desse tipo de debate, culturas de todos os tipos estabeleceram explicações metafísicas na tentativa de explicar quem determina o tempo de nossa existência. Vontade ou vingança dos deuses, a luta entre o mal e o bem, a introdução do pecado na sociedade, maldições e muitas outras respostas pairam no ar. Foi justamente este o ponto de partida para o desenvolvimento das teologias e filosofias que por ai estão difundidas no imaginário coletivo em formas de folclore e rituais religiosos. Foi o fato de sermos tão vulneráveis, tão descartáveis que provocou na raça humana uma necessidade de afirmar que de alguma maneira este não seria verdadeiramente o seu fim. Tem de haver outra possibilidade, outra vida, uma continuidade, não é possível que existamos para voltar ao pó! Estas indagações levaram nossa espécie a encontrar respostas que pudessem dar algum tipo de conforto ao espírito humano quando chegar o fim. Os vermes tomarão conta de tudo! Putrefação, decomposição, termos encontrados ou criados para dar significado ao que somos enquanto matéria; podres.
Mas não é somente a existência que intriga a espécie humana, o que mais incomoda é a consciência da existência, a individualidade o surgimento do ego, da singularidade. Podemos afirmar que a individualidade procede da cultura, mas como uma cultura desenvolve estes valores individuais?
Quantos já partiram sem sequer ter tido a oportunidade de usufruir a vida, quantos se foram sem ter tido tempo sequer de indagar; por quê? Vontade divina? Como disse Nietzsche, Deus é uma criança a brincar com seus bonequinhos ou um velho caquético esclerosado que não tem noção do que esta fazendo, matando milhares por dia aleatoriamente.
Dificilmente se chegará a uma resposta convincente, até mesmo porque ela provavelmente não exista. O que há, são respostas convincentes para os mais variados tipos de pessoas. Isto porque não pode haver uma só verdade, nua e crua, intolerantemente verdadeira. Certamente há indagações que não haverá resposta que seja suficiente, mas é certo também que construímos nossas respostas baseadas em nossas crenças e valores. O que demonstra que a compreensão das idéias está intimamente relacionada com nossa cultura. Não imaginaríamos a vida pós morte, sem o evento da própria morte, construímos, porém um pós morte imaginário a partir do que possuímos enquanto conceito de uma vida melhor (céu, nirvana) ou pior (inferno, purgatório). De qualquer modo, o que fica de tudo isso é o quanto somos frágeis e limitados. Frágeis por que podemos desvanecer de uma hora para outra, limitados porque somos incapazes de lidar com tal fragilidade.

Homeostase

Nas mais profundas fendas.
Nos interstícios temporais.
As certezas e incertezas se fundem
provocando espasmos que transcendem o interior humano.
Gerando uma revolução sináptica.
Revelando uma nova concepção,
um novo ser, homeostase.



Jonatas C. de Carvalho.