domingo, dezembro 08, 2019

O PROJETO DE OCUPAÇÃO DA AMAZÔNIA E O TRABALHO DE ESCRAVIDÃO POR DÍVIDA.

As poucas linhas que porei abaixo, em parte por minha limitação de conhecimento sobre o tema, em parte por se tratar de um recorte muito específico que terá como referência um capítulo do livro "Fronteira: a degradação do Outro nos confins humanos" de José de Souza Martins. Antes, penso ser importante escrever algo sobre o autor, José de Souza Martins é sociólogo, professor titular aposentado do Departamento de Sociologia e professor emérito da faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Foi vencedor de um prêmio Jabuti na categoria Ciências Humanas ao escrever "Subúrbio" em 1994. Com uma vasta obra e uma diversidade de temas de pesquisa, José de Souza Martins deixa um legado intelectual sobre a vida social no Brasil como poucos. 

No que diz respeito as condições do trabalho no Brasil, as contribuições do cientista social são enormes, autor de "O cativeiro da terra", publicado pela primeira vez em 1979 (hoje se encontra na 9º edição pela editora Contexto), Martins propõe que a chamada transição do trabalho escravo para o trabalho assalariado não ocorreu como se imaginou após o fim da escravidão em 1888, e parte da "Lei de Terras" (1850), para demonstrar como as elites agrárias planejaram tal transição. Na prática, o trabalho escravo segue existindo por lógicas que segundo o autor estão associadas a um modelo específico de acumulação de capital, sobretudo, nas áreas rurais do país. 

Voltando ao "Fronteira" (2009), também pela editora Contexto (utilizo aqui a 2ª edição de 2018), um livro que o autor aborda temas delicados da vida de quem habita os "confins do humano", isto é,  as regiões fronteiriças do Brasil. O primeiro capítulo "A captura do Outro" é dedicado a questão do rapto de humanos, especialmente de indígenas, Martins trabalha com 150 casos de raptos entre 1930 e 1996, histórias que envolvem principalmente mulheres e crianças. O capítulo seguinte, e que me fez escrever estas linhas, intitulado "A reprodução do capital na frente pioneira e o renascimento da escravidão", onde retoma em parte a discussão iniciada em "O cativeiro da terra". Seu ponto de partida é o projeto "Operação Amazônia", projeto este estratégico de ocupação da Amazônia levado a cabo ao longo dos governos ditatoriais, iniciado em 1966, portanto, na metade da gestão de Castelo Branco. 

A Operação Amazônia, que teve como lema "integrar para não entregar", propagou que o Brasil iria se empenhar em ocupar os "espaços vazios" para salvaguardar o território nacional das "supostas e gananciosas potencias estrangeiras" (p.74). Não há como deixar de relacionar estes tempos com o recente projeto de governo de Jair Bolsonaro, mesmo com certas distinções discursivas por parte dos generais do capitão (Mourão e Heleno), é impressionante as semelhanças, o inimigo é outro (as Ongs), mas a ameaça continua. Semelhante é também o projeto de ocupação, a saber: a expansão dos latifundiários voltados para o agronegócio as custas da dizimação das nações indígenas que por lá habitam há séculos. Para entender melhor essa história recente, recomendo o belíssimo texto da jornalista Fernanda Wenzel, publicado na https://www.oeco.org.br/

Voltando a 1966, a ocupação efetivou-se por uma série de projetos, dentre os quais se previa a geração de quarenta mil empregos, para isso o governo ditatorial apostara nos incentivos fiscais como meio de atrair grandes empresários das outras regiões brasileiras. Assim, restruturam o Banco da Amazônia, e transformaram a a Superintendência do Plano de Valorização da Amazônia (SPVEA), em Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). A grosso modo, a ideia era a seguinte, o governo ofereceu 50% de desconto no imposto de renda das empresas que tinham negócio no país, esse dinheiro era depositado no Banco da Amazônia para a criação de um fundo de investimentos. Aqueles que estivessem dispostos a investir na ocupação do território, teriam que apresentar  um projeto ao banco e, se aprovado, sairia dali com 75%  do capital necessário, cabendo aos empresários arcar com os outros 25%. O resultado foi desastroso para a região, até a Volkswagen resolveu criar gado em uma fazenda com 140 mil hectares no sul do Pará. O projeto "gado do futuro" da empresa não deu os resultados esperados, sobretudo, após uma série de denúncias sobre as condições dos trabalhadores (aproximadamente 400), essa história está muito bem documentada no obra "Volkswagen in the Amazon: The Tragedy of Global Development in Modern Brazil (Global and International History)" de Antoine Akcer

Neste ponto está a importância da pesquisa de José de Souza Martins, para ele o fato dos novos proprietários de terra na Amazônia terem tradição nos negócios urbanos (como a Volkswagen), não os impediu de reproduzir em suas fazendas modelos de trabalhos em condições análogas a de trabalho escravo. Em sua pesquisa, são citadas 431 fazendas em que ocorreram denúncias de trabalho escravo, entre os anos de 1970 e 1993, destas 308 eram na Amazônia, a pesquisa também indicou que neste período, somadas as denúncias, houve mais de 85 mil trabalhadores escravizados. Todavia, o número que já assusta, na verdade está longe da realidade, uma vez que muitos casos nunca foram denunciados, Martins aponta outros estudos onde o volume de peões trabalhando na estação da seca na Amazônia na década de 1970 poderia variar entre 250 e 400 mil. (p.77). 

Foto - CNBB
Em maior parte (72%), os trabalhadores eram contratados no desmatamento para abertura de áreas (fazendas) para a agropecuária, outro dado alarmante é que 53% dos peões escravizados, foram empregados nesta função. Significa dizer que a construção dos latifúndios na chamada Amazônia Legal foram em sua grande maioria estabelecidos por meio do trabalho de dívida, isto é, os trabalhadores eram recrutados em outras regiões (principalmente no nordeste) e eram submetidos a duras jornadas de trabalho sem quaisquer condições de abandonar o "emprego", uma vez que o custo de sua estadia (moradia e alimentação) superava o de seu salário. 

O negócio do trabalho escravo ainda contava (e conta) com uma significativa rede de comércio (legal e ilegal), e porque não dizer, um complexo sistema de pequenos negócios que se alimentam do trabalho escravo.  Martins (p.89), cita alguns, como os traficantes (responsáveis pelo recrutamentos dos trabalhadores), os donos de prostíbulos (cujas prostitutas vivem em condições semelhantes aos peões, isto é, trabalho por dívida), onde os peões que conseguem algum saldo o gasta com tal diversão, há ainda os vendedores de roupas e bugigangas (rádios, pilhas, relógios, outros), Martins inclui também, a polícia que prende forasteiros e aventureiros e lhes confiscam tudo, restando-lhes a "peonagem", por fim, os pistoleiros empregados por traficantes e capatazes das fazendas para o serviços de vigilâncias e disciplinas dos peões além da captura dos fujões. 

Um levantamento realizado pelo Ministério Público do Trabalho e a Pastoral da Terra, divulgados pela Comissão Nacional de Justiça (CNJ) no início deste ano, apontavam que entre 1995 e 2018, 53,609 trabalhadores foram resgatados nas mais de 2 mil operações realizadas no período. Os números, embora ainda impressionantes, apontam para uma redução deste tipo de trabalho quando comparado aos 85 mil da série anterior. Trata-se ainda de verificar que ao longo desse último período, mais precisamente entre 1995 e 2007 os índices de desmatamento na Amazônia seguiram alarmantes (média de quase 20 mil km²), o que nos faz pensar que os números do trabalho escravo no Brasil seguem não representando a realidade.  O desmonte das estruturas de fiscalização tanto do Ministério do Trabalho, da Funai, do Ibama, contribuirão ainda mais para o renascimento desta prática. Em 2019 o desmatamento atingiu sua maior série histórica dos últimos 10 anos (9.762 Km²), isso não seria possível sem a mão de obra do trabalho por endividamento ou outros modelos semelhantes e análogos ao trabalho escravo.   

                                     Jonatas Carvalho
Historiador e Doutorando em Sociologia e Direito pela UFF


  












segunda-feira, novembro 18, 2019

O ULTRALIBERALISMO BRASILEIRO E A INTERVENÇÃO NA GORJETA

Hoje cedo dei uma olhada na medida provisória 905, que "Institui o Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, altera a legislação trabalhista, e dá outras providências." Preciso dizer inicialmente algumas coisas, primeiro que sou favorável a políticas públicas que visem promover o incremento da economia, sobretudo, em um país com altos índices de desemprego, políticas que vão ao encontro dessa massa de desempregados devem ser sempre recebidas com entusiasmo. A outra coisa que devo dizer é que não sou economista, logo não quero aqui dar pitacos em área que não domino, muito menos falar como um entendido, mas como cidadão tenho o direito e dever de me manifestar. 

A MP 905 é um tanto assustadora em volume e complexidade, são 40 páginas que possivelmente ainda irão aumentar significativamente quando for discutida nas comissões e câmaras, segundo alguns analistas elas alteram mais de 33 artigos da CLT e tantos outros artigos da legislação trabalhista e previdenciária. Me indago sobre a necessidade de uma medida provisória dessa envergadura em um espaço de apenas dois anos após o país ter realizado uma reforma trabalhista, diga-se de passagem, na ocasião os defensores da proposta diziam que depois da reforma o mercado de trabalho no Brasil voltaria aos eixos, então essa reforma de fato nem de perto atingiu os objetivos previstos oficialmente. Outras previsões, no entanto, desdenhadas por certas bancadas no congresso,  diziam que a reforma trabalhista iria acarretar em aumento do trabalho precarizado e informal, o IBGE recentemente divulgou que o trabalho informal atingiu record, isto é, 41,4% do total da população ocupada no país. 

Não pretendo aqui comentar todo o projeto da equipe de Paulo Guedes, mas gostaria de comentar apenas mais alguns tópicos. 

O projeto trata da criação de novos postos de trabalho, não se destina, portanto, a todos os trabalhadores, as empresas só podem contratar nessa modalidade  até 20% do seu efetivo. Mas qual a vantagem do contratante? Ele vai reduzir os "gastos" com contribuições, sobretudo com o FGTS que irá contribuir apenas com 2% e não mais com 8%,... até aqui acho aceitável principalmente que tal modalidade tem prazo de vencimento. Minha crítica aqui é qual a contrapartida do Governo? Então é assim, vamos promover emprego, o empregador paga demais, assim se o empregado quer trabalhar deve simplesmente aceitar às condições, para estimular vamos desonerar o empregador, desde que isso não implique em onerar as contas públicas, logo, sobra pra você que está desempregado e precisa muito desse emprego. 

Aí vem  mais alguns problemas graves, o primeiro já nomeado pelo Élio Gaspari, como "uma covardia", trata-se do item (Cap. VI) que taxa o o seguro desemprego, a proposta é que o seguro desemprego seja taxado para fins de contribuição da previdência social, isso é, bizarro, como diria um certo amigo. 

Mas minha maior surpresa foi ver uma proposta ultraliberal que saiu desregulamentando geral, entrar numa de regulamentar a gorjeta, são quase duas páginas visando solucionar a situação de como se deve fazer com a gorjeta, a solução da equipe econômica? Vamos taxar a gorjeta! Segundo o texto a taxação serviria para o empregador cobrir gastos com outros encargos. Já há uma lei de 2017 prevendo isto, pelo visto, não fora implementada. 

Lembrei de Reginaldo Rossi:
"Garçom, aqui nessa mesa de bar
Você já cansou de escutar
Centenas de casos de amor" 

Mas por essa o Garçom não esperava... 

Jonatas Carvalho 


    












sábado, novembro 16, 2019

LUZ, CÂMARA, AULÃO - PLURAL NO CINEMA.

Eis uma história de sucesso! O Plural no Cinema foi um evento na cidade. Mas antes de falarmos dessa história, permita-nos uma breve retrospectiva (talvez não tão breve assim), porque nenhum evento emerge da noite pro dia, há sempre um processo, em alguns casos gradual, em outros tempestivos; o que parece ser este caso.
O projeto nasceu e foi se desenvolvendo nas mentes de alguns professores petropolitanos em 2018. A pergunta central era; como montar um curso preparatório universitário diferente do que se tem por ai?  

Sem responder plenamente a esta questão, o Plural Curso Preparatório foi aberto no distrito de Itaipava (Petrópolis) no inicio desse 2019. Éramos cinco sócios na ocasião, todos trabalhavam em rotinas pesadas de aulas em outras escolas, decidiu-se então por um sistema de revezamento onde cada um estaria no curso em um dia da semana e contávamos ainda com o suporte da nossa querida estagiaria, Maria Eduarda. No dia da inauguração do curso havia uma aluna efetivamente matriculada, mas ocultamos este pequeno detalhe dos convidados, estávamos temerosos, apreensivos, no entanto, ligeiramente felizes e confiantes. 

Nossa expectativa era de que iríamos passar o ano de 2019 com 10 ou 15 alunos e assumir o ônus, se o trabalho fosse bom (e aqui residia nosso alicerce, pois confiávamos em nossa capacidade), quem sabe em 2020, teríamos uma sala cheia de alunos. Tudo caminhava conforme a expectativa, até que algo aconteceu. Em meio a reuniões de autocrítica e discussões sobre se estávamos no caminho certo, passamos a ter surtos criativos e motivacionais. Era necessário sair da mesmice. 

Da esquerda pra direita os sócios: Eric, Jonatas, Marina, Lícia e Felipe
Dissemos acima que não havíamos respondido plenamente a questão sobre como seria um curso preparatório diferenciado, respondemos parcialmente, sabíamos o que queríamos; criar um espaço onde a pluralidade seria valorizada como resultado das individualidades. Só não sabíamos bem como fazer isso acontecer. Tínhamos um ambiente razoavelmente confortável e acolhedor, montamos um ótimo time de professores, mas isso seria suficiente?  Precisávamos fazer com que professores e alunos acreditassem que éramos capazes de prover uma relação de ensino-aprendizagem diferenciada, então surgiu o primeiro projeto, no dia 30 de março fizemos nosso primeiro aulão, cinco professores caracterizados misturaram, história, geografia, biologia, atualidades e filosofia.  Foi ótimo!  

O experimento nos encheu de ânimo, iniciamos outros planos, o próximo projeto seria com foco na primeira fase da UERJ, mas antes de falarmos disto, precisamos falar do PISM (Programa de Ingresso Seletivo Misto), uma importante porta de entrada na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), cujo processo se dá em três etapas cada uma delas correspondendo a um ano do ensino médio. Resolvemos abrir uma turma de PISM 1, para nossa felicidade as inscrições foram acontecendo, a turma foi criada com 10 alunos, não 11, 12...bem, sabemos que terminamos o ano com 17 pluradolescentes maravilhosos... já voltamos a eles. 

Decidimos também que usaríamos o Instagran como nossa principal ferramenta de comunicação com o público, atingimos ao longo do nosso primeiro ano mais de 500 seguidores,  fizemos 70 postagens até aqui e centenas de stories. Usamos essa ferramenta de maneira diversificada, uma delas é divulgar nosso timaço de professores, fazendo um perfil de cada um. Também fazemos postagens informativas, dias comemorativos, como o Dia da Terra , a Abolição da Escravidão ou os 180 anos do nascimento de Machado de Assis, só pra ficar em alguns exemplos, ah, não deixem de ver o do Dia do Vestibulando, com o nosso sócio Eric Mota sendo um fofo. 



Convidamos ao longo do ano alguns professores externos para aulas especiais e temas diferenciados como foi o caso do nosso querido parceiro e entusiasta Eduardo Galves que nos presenteou com uma belíssima aula sobre Planejamento Estratégico, assim como o queridíssimo Pedro Paulo, vulgo PP, que brilhou na sua aula sobre Desenvolvimento de Habilidades Socioemocionais. Por falar em emoção também tivemos um reforço nessa área, sabemos a importância de um emocional equilibrado para realizar essa maratona de provas, desta forma promovemos alguns encontros entre nossos alunos e a psicóloga, Fabíola Foster. Finalmente não podemos deixar de contar sobre as participações de duas feras da literatura as professoras Leda d'Aguila que veio de Teresópolis para dar duas super aulas, uma para a turma do PISM1 e outra para nossa galera do Intensivo (segura ai que ainda vamos falar dessa turma), e nossa querida Gisele Costa com participação especial no Plural no Cinema. 

Voltemos agora ao nosso projeto UERJ, porque no Plural a vida é intensa e cheia de oportunidades para desenvolver o conhecimento, além dos aulões e das aulas especiais, havia listas de exercícios diariamente e quatro simulados modelo ENEM no ano. Descobrimos que o aprendizado criativo é fruto de um conjunto de fatores sociais e biológicos, mas que acima de tudo o ambiente deve favorecer e para que isso ocorra devemos transformá-lo constantemente. Assim, realizamos o Viradão da UERJ e o Plural de pernas pro ar, o primeiro tinha por objetivo um aulão na madrugada, com direito a pijamas, pizzas e muita aula, terminando com um café da manhã reforçado. O segundo, aconteceu no sábado às vésperas da prova da UERJ, professores e alunos foram no Parque de Exposições de Itaipava, só diversão, piquenique e muitas risadas, veja aqui.  

Iniciamos o segundo semestre com a corda toda, não satisfeitos de já termos superado nossa meta inicial, resolvemos abrir uma turma de intensivo aos sábados, pensando nessa galera que não tinha tempo de frequentar as aulas em dias de semana. Mais uma vez fomos felizes e montamos uma bela turma. Tinham se passado seis meses e já estávamos com três turmas, uma de extensivo, uma de PISM e agora uma de intensivo. Nossa questão agora era, como vamos administrar isso?  Quatro professores, cada qual com suas características e personalidades (altamente distintas, às vezes contrastantes)  metidos a administradores de cursinho, é claro que tinha tudo pra dar errado, mas não deu. Sim, falhamos em várias ocasiões, o que é perfeitamente normal, mas mandamos bem demais também!  O fundamental: sabíamos que faríamos diferença na vida dos nossos alunos e eles na nossa. Não deu outra. 

Então perto da reta final ressurgiu uma ideia que já tínhamos discutido lá no inicio, mas na ocasião não levávamos isso muito a sério pelo fato de não termos ideia de como estaríamos, mas agora sabíamos que era possível, e assim tocamos em frente nosso projeto mais ousado do ano; o Plural no Cinema Agora estávamos em quatro, um de nós não gostou de viver com a adrenalina em alta constantemente, pelo menos não do modo que vivíamos, talvez nosso "modelo de gestão" fosse demais pra ele, só que ao invés dele nos abandonar de vez, ficou como nosso super professor de biologia e brilhou. Voltando, alugamos o Cine Itaipava por dois sábados das 8 h às 12 h, a primeira semana seria dedicada as questões de Humanas e Linguagens, a segunda, voltada para Naturezas e Matemática. Foi  como preparar um espetáculo, rolou gravações de vídeos e áudios, produção de jingles e paródias, organização de figurinos, negociação de parcerias e muito, mas muito mais. 
Como dissemos éramos apenas quatro agora, mesmo que fôssemos cinco não daríamos conta, foi então que descobrimos que éramos muito mais, havia um time de pluralistas externos pronto para dar todo suporte que precisávamos, companheiros (as), namorados (as), primos (as), filhos (as), mães e pais, irmãos e irmãs, em fim, sem essa galera não teríamos conseguido. Alguns que estão ao nosso lado desde o nascedouro do projeto sem os quais também não poderíamos ter alcançado nosso objetivo, companheiros e companheiras como Pedro Bastos, Douglas França e Luciene Esteves. Não podemos esquecer de um outro reforço, nossa assistente a Aline Funchal, que logo na primeira semana nos ensinou coisas sobre nosso próprio curso que desconhecíamos, como por exemplo, usar adequadamente a máquina copiadora. 

Plural no Cinema foi um evento e tanto, nunca havia ocorrido algo assim na cidade, demos entrevistas para jornais e televisão, isso foi bom! Mas nada se compara a visão de um cinema cheio de guris e gurias na expectativa do aulão do ano. Foram dois finais de semanas intensos e altamente produtivos, mais do que ensinar, conseguimos transmitir confiança a gurizada, e também provamos para nós mesmos que nós podemos mais. Agora se você pensa que o ano acabou, se enganou meu bem! Estamos em pleno processo de reta final das específicas da UERJ e do PISM. Vai rolar aula de campo em Juiz de Fora e a segunda edição do Plural de pernas pro ar. Já estamos cheios de planos para 2020 e estabelecendo metas até 2030. 

Não temos como deixar de prestar aqui nossa gratidão a todos os nossos professores, Nicolau BorsatoBárbara Soares, Felipe MauroLeandro MagraniSilvana Moraes, Jaqueline SilvaLeonardo Carvalho, Laio Zago, vocês foram vitais nesta pequena, mas significativa história de sucesso! 
Nossas sócias Marina Sá e Licia Quinan que nos mostram todos os dias o que é empoderamento feminino!  

Aos pluralunos que acreditaram no projeto, nosso muito obrigado! Toda essa confusão ai acima foi por vocês!! 

E aí, achou que vale a pena ser plural? Então #venhaserpluralvocetambem !!

                                      
                                                
                                                     Jonatas Carvalho
É sócio e professor de Filosofia e Sociologia do 













  

terça-feira, outubro 15, 2019

SOBRE O SENTIDO DA DOCÊNCIA

A espécie humana foi aos poucos se diferenciando das demais a medida que tomava conhecimento de si, que adquiria consciência da própria existência. Daí veio a necessidade de dar sentido a esta existência, então formulou-se ao longo da história humana uma sucessão de possíveis respostas a maior de todas as questões; o que fazemos aqui? As respostas para tal questão já sofreram diversas alterações e seguirão alterando-se enquanto estivermos na terra. Enquanto isso, presenciamos todo tipo justificação da nossa existência. 

Alguns encontraram o sentido da vida nas explicações religiosas, outros se doando a causas humanitárias ou à defesa dos animais, há também os que decidiram pelo poder e riqueza e, os que acreditaram que o sentido da vida está em dedicar-se ao trabalho e a família. Sociedades inteiras definiram sua moral baseando-se no sentido da vida, grupos, tribos, movimentos são criados constantemente com propostas de soluções para a grande questão. Não há um humano vivo que escape desse dilema existencial. 

Quem sabe possamos responder apenas parcialmente em termos gerais, uma vez que a resposta não exista na realidade e que cada um dará sentido a própria existência conforme sua subjetividade e tantos outros fatores. Mas em termos gerais, sabemos que estamos aqui, que há um enorme grupo de humanos ocupando a terra, que essa ocupação nunca foi pacífica, que o que a terra tem a nos oferecer, isto é, seus recursos foram apropriados por alguns de nós, que a grande maioria de nós encontram-se destituídos de acesso a tais recursos. Assim, criamos áreas nobres e periferias, condomínios de luxos e favelas, resorts e lixões. Decidimos por uma longa caminhada que algumas ações humanas são mais importantes que outras, inventamos o mérito, a honra e a dignidade, mas estes só são atribuídos a humanos bem estabelecidos, ninguém educa seus filhos para serem lixeiros, motoboys ou diaristas. 

Decidimos quais conhecimentos são válidos e quais habitarão o limbo, mais uma vez, alguns de nós apropriaram-se desses conhecimentos e resolveram restringi-los, mais uma vez, a maioria de nós ficou à margem. Franqueamos a vida um valor inestimável, a protegemos por um conjunto de regulações, estabelecemos sanções e penalidades aos que a ameaçam, mas resolvemos que a vida de uns valem mais que as de outros, que esse valor está relacionado ao quanto sua existência é justificável, que tais justificativas são mais ou menos validadas (numa espécie de silogismo às avessas), conforme a cor da pele, o habitat, o gênero, a origem familiar... 

Por outro lado, quantos de nós, compreenderam que as coisas são o que são não porque sempre foram, e que é possível alterá-las, subvertê-las, refazê-las? É assim que a arte popular e periférica emergem e confronta uma noção estilizada de arte, é assim que as lutas por direitos políticos, civis e sociais eclodem e dão voz a pluralidade dos indivíduos, é assim que as mulheres assumem dia pós dia o controle do próprio corpo. 

Esse texto era pra ser sobre o sentido da docência, pois bem, ei-lo ai. 

Jonatas Carvalho, 
Professor. 

terça-feira, setembro 03, 2019

SUICÍDIO ENTRE JOVENS, REVISITANDO DURKHEIM


A tendência mais óbvia entre nós, ao tomarmos conhecimento que um ser humano, ainda na flor da idade (vou considerar aqui flor da idade, jovens entre 10 e 19 anos), atentou com sucesso contra a própria vida e não se acha mais entre nós é de especular sobre as particularidades do ato. Estava com depressão? Sofria algum tipo de abuso? Os pais eram separados? Não faltarão opiniões e discussões sobre o que teria levado esse jovem humano a desistir de viver.

Nossa sociedade escolheu a vida como um valor imprescindível, por isso a morte, oposto mais radical da vida tornou-se uma abominação, um tabu. Decidimos enquanto sociedade, encontrar soluções que minimizam nosso sentimento de finitude, em todos os casos a vida continuará em outras condições e isso é reconfortante. Para que vivêssemos em respeito a certas normas morais no aqui e agora, combinamos que essa outra vida poderá ser de muito sofrimento; mas é justamente ao contrário, se a vida fosse infinita, o que nos motivaria? 
 No fundo, somos levados a atuar no palco da vida como se este fosse um espetáculo único e curto, não podemos errar. Por isso, repetir um ano na escola ou não entrar na faculdade após o ENEM tem tanto peso. Nossa vida é toda calculada nos mínimos detalhes, os anos da escola, da faculdade, do trabalho (e este último pelo fato de vivermos mais hoje, segue sendo recalculado), da aposentadoria. Quem se estende em uma dessas etapas é considerado um fora da ordem.

Essa vida, cada dia mais intensificada (para usar aqui um conceito de Simmel), vida calculada e forjada (Foucault), se, por um lado promove coesão, por outro, pelo nível de coerção provoca fissuras, quebras, rupturas. Nossos jovens se suicidam mais que no passado recente, por sinal, muito embora, as taxas de suicídios tenham diminuído no mundo (total de suicídios), ela aumentou entre os jovens e, no caso brasileiro, entre os anos de 2006 e 2015 esse aumento foi de 24%. Segundo o Datasus, o número de suicídios foi de 11.433 mortes em 2016, tornando-se na quarta maior causa de morte. A vida é tão calculada que a OMS tem taxas aceitáveis de homicídios e de suicídios.

Voltando a questão que apresentei no primeiro parágrafo sobre nossa tendência de particularizar as histórias, Durkheim nos deixou uma lição importante lá no final do século XIX. Devemos olhar para o suicídio como um elemento social, tendemos a justificar histórias de suicídio futilmente como covardia ou desespero. Mas ao olhar as taxas mundiais e os aumentos nas taxas locais nos últimos anos, percebemos que não estamos lidando com singularidades, e sim com uma parcela significativa de jovens que estão adotando um comportamento antivida. Isto é social.

Por ser traumático, sobretudo, para os familiares, por ser ainda mais dramático quando se trata de vidas jovens (quero lembrar aqui que a maior incidência de suicídio é entre os velhos – acima de 60 anos), o silêncio torna-se o recurso mais utilizado, seja por sensibilidade ou por incapacidade de lidarmos com esse tema. Todavia, é preciso enfrentar essa questão, como já fizemos com tantas outras, o tabu só contribui para a desinformação.

Deve-se buscar debates que ultrapassem o âmbito privado e que discutam sobre o tipo de sociedade que nos tornamos e quais os efeitos disso. Campanhas (como o setembro amarelo) clamando por mais solidariedade são importantes, mas não atacam o fundamental, devemos repensar sobre estas vidas calculadas minunciosamente sobre as exigências que estes cálculos implicam sobre a pressão que se impõe aos mais jovens. Não se trata aqui de se opor a este modelo social ou de propor outro modelo, mas de dizer que esse modelo tem problemas sérios e que ele está matando cada vez mais jovens (não sou eu que digo mas os números). Se queremos fazer algo a respeito, a primeira coisa é reconhecer o problema e depois, como sociedade, nos organizarmos e reorientar nossas prioridades sem que estas custem tantas vidas.


Jonatas Carvalho
Pesquisador no INCT - InEAC/UFF - Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos; 
Doutorando no Programa de Pós Graduação em Sociologia e Direito (PPGSD)

segunda-feira, junho 10, 2019

MAIS DO QUE NUNCA... A UERJ RESISTE.




A prova do vestibular para 2020, organizada pela UERJ foi um sucesso! Ao começar pelos mais de 60 mil escritos, uma demonstração de força de uma instituição que vem recebendo duros golpes por aqueles que desejam extinguir a Universalidade Pública, gratuita e de qualidade, atacando-a com cortes de verbas e por meio do patrulhamento moral. Que ela sirva de exemplo e motivação para as outras, que as marchas dos estudantes nas últimas semanas mantenham as universidades públicas desse país produzindo ainda mais, apesar de tudo. 

Mas a UERJ não arrasou somente na organização da prova, ela brilhou nos conteúdos das questões (e aqui me refiro as de ciências humanas e suas tecnologias, onde sou apto para falar). É necessário enfatizar que esta instituição é pioneira na produção de questões de caráter multidisciplinar e problematizadoras sobre a sociedade contemporânea. Neste ano, a UERJ mostrou o quanto sabe fazer isso bem. Além disso as questões refletiam, contrariando uma certa direita de caráter extremado e atualmente no poder, sobre temáticas referentes aos processos migratórios (refugiados, xenofobia), racial e de gênero, dentre outras. Chamo atenção aqui para quatro questões em especial (mas poderiam ser muito mais). 

O retorno de Simone de Beauvoir, é uma demonstração da luta quanto ao esclarecimento sobre o papel da cultura na produção de identidades e subjetividades consideradas mais suscetíveis ou frágeis. A questão 48, retoma essa problemática ao trazer a obra “O segundo sexo”, cujo segundo volume encontra-se o trecho proposto na edição do ENEM de 2015, “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”. 


A questão de número 50 trouxe um debate sobre Brexit, ilustrada com um painel poderoso produzido por Banksy em Dover, a questão problematizou a crise monetária da União Europeia, contextualizada pelas contradições do neoliberalismo e o nacionalismo. 

Já a questão 51, apresentava um texto emocionante do comandante do navio Lifeline, Claus Peter Reisch, cujo título foi “Mediterrâneo é o maior cemitério da Europa hoje”, numa alusão as cetenas de refugiados que, ao fugir de seus países, seja pela guerra ou pela fome, naufragam no mar na tentativa de chegar a Europa. A questão discutia os efeitos tardios da herança imperialista na África.

A discussão sobre racismo é tratada na questão 55, por meio de um debate sobre a existência da Ku Klux Klan em pleno século XXI. A questão veio ilustrada por um cartaz e uma cena do filme “O nascimento de uma nação” (1915), o primeiro longa-metragem do cinema mundial, cuja história versava sobre como a Klan salvou os EUA do problema da miscigenação da raça, evidenciando a supremacia branca. 

Muitas outras temáticas importantes foram problematizadas na prova, como a relação entre reforma agrária e concentração de fundiária (57), ou ainda, a questão do chamado deficit habitacional (58). O que posso dizer é que a cada questão eu me orgulhava mais de ter sido aluno nesta instituição e acima de tudo, de ser professor e ter a oportunidade de debater tais temas com meus alunos. 

Mais do que nunca a UERJ resiste.

Jonatas Carvalho






sábado, maio 18, 2019

A DESEDUCAÇÃO DO GOVERNO BOLSONARO

Desinformado (ou mal intencionado) é quem disse que as manifestações de professores e estudantes das redes públicas e privadas só ocorreram para prejudicar Bolsonaro, os que alegam isso, dizem que governos passados inclusive os do PT também cortaram recursos da educação, mas não houveram reações. Inclusive, que não havia necessidade de paralisação, uma vez que o Ministro da Educação alega que se trata apenas de um contingenciamento de 3,5%. 

É preciso então começar com o que há de alguma verdade ai, sim, governos anteriores trataram de impor cortes na educação, e mesmo que os investimentos em educação tenham saído de 3% do PIB ao fim da Ditadura para próximo dos 7% atuais, os cortes seguem assombrando o setor. Mas é preciso dizer também, que os educadores e educandos nunca deixaram de protestar contra eles, para ficar apenas em dois casos que ocorreram no governo do PT, em 2012 professores fizeram vigília na praça dos Três Poderes, em Brasília, em defesa da educação pública do país. Tempos depois a luta era sobre a cota dos 10% do PIB e 50% do pré-sal para a educação e plano de carreira sólido para professores eram a pauta da época. Poderíamos ainda lembrar um muito maior; 2013.  

Mas uma coisa é certa, não me lembro de ter visto nada parecido no Brasil referente a mobilização de professores e estudantes como ocorreu no último dia 15. A ausência de reconhecimento ao protesto legítimo por parte do governo é um indicativo importante aqui. 

A Dimensão do protesto não tem necessariamente relação com o tamanho do corte anunciado (até porque não se sabe até agora ao certo, pois o governo muda a informação a cada hora), mas está relacionada com o desrespeito aos docentes e discentes desse país, com a total falta de consideração com o ensino público superior, com o jogo torpe dos discursos moralista/idealista para atacar a pesquisa acadêmica, com as ofensas a esta categoria que rala de sol a sol em ambiente precarizado. 

É claro que há projetos ruins nas Universidades Públicas, é obvio que há problemas de gestão, de corrupção, de lutas internas, mas esse é o dia a dia da comunidade acadêmica (aqui e no resto do mundo), você que não frequenta uma Universidade Pública, não vai ver na TV ou mesmo nas suas redes sociais, mas alunos e professores lutam constantemente contra todos esses fatores, são centenas de reuniões, assembleias, manifestações no interior da universidade, visando corrigir seus problemas. 

Mas o Brasil só chegou até aqui como potência econômica graças a Universidade Pública, o país tem pesquisa de ponta em várias áreas de conhecimento, astrofísica, biologia molecular, neurociência, virologia, geociências, agronomia, tantos, mas tantos, só o catálogo de laboratórios de pesquisa da UFRJ são de 376 páginas (confira aqui:http://posgraduacao.ufrj.br/public/suporte/pr2/publicacoes/2018/Catalogo04Jan18.pdf?1515091294), para você ter uma ideia, apenas o Instituto de Geociências possui mais de 60 laboratórios de pesquisas, aliás, você conhece os avanços do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) na cura do mal de Alzheimer publicado na revista Journal of Neuroscience? Sabia que apenas esta Universidade oferece 177 cursos e que ela possui quase 70 mil alunos? A UFF possui mais de 50 mil e a UERJ mais de 30 mil. A USP já ultrapassou a casa dos 100 mil. São daí que saem jovens que vão ganhar o mercado nacional nos mais diversos setores da economia. 

Exaltar nossa educação e os avanços científicos promovidos por brasileiros e brasileiras, não implica em não reconhecer seus problemas, sabemos o quanto distantes ainda estamos em muitas áreas, nas dificuldades da educação básica e na formação de professores, por exemplo, mas não é desmoralizando o todo que chegaremos a mudança necessária. Generalizações são equívocos, estratégia perigosa, tratar as universidades públicas com sansões sem os processos administrativos legais é agir por convicção ideológica. A Universidade Pública não é inimiga da educação de qualidade, ao contrário, é sua maior aliada hoje. 

Enquanto eu escrevo isso (tempo que ganhei graças a uma virose maldita), pude ver as declarações do ministro da educação (o segundo ministro em cinco meses) na câmara federal, um homem dotado de uma arrogância rancorosa e de um desprezo enorme pela Universidade Pública. Também vi a terceira nomeação para a presidência do INEP, órgão responsável pelo ENEM, três em cinco meses. 

Jonatas Carvalho





















quarta-feira, janeiro 23, 2019

O USO DOS CORPOS: A VIDA COMO OBRA DE ARTE


Surpreende-me que, em nossa sociedade, a arte tenha se transformado em algo que é relacionado aos objetos, não aos indivíduos e à vida, e igualmente que seja considerada um âmbito especialístico feito de peritos que se chamam artistas. Mas a vida de cada indivíduo. não poderia ser uma obra de arte? Por que uma lâmpada ou uma casa são objetos de arte, e nossa vida não? (Michel Foucault - 1983)



Tenho o hábito de comprar livros e colocar a data da aquisição, dessa forma consigo saber há quantos anos tal livro está comigo e há quanto tempo eu o li. Essa semana fui buscar na estante um livro do Foucault, “A Hermenêutica do Sujeito”, me deparei com a data de agosto de 2008, resolvi olhar outros livros do autor na estante, o mais antigo é de 2005 (Microfísica do Poder), são mais de dez anos lendo Foucault. Eu estava a procura de uma referência que achei em outro filósofo, Giorgio Agamben, na sua obra “O uso dos corpos”, foi nesta obra que me deparei com a ideia de “a vida como obra de arte” e a citação de Foucault que eu coloquei acima. Dez anos lendo Foucault e ainda sei tão pouco, como eu nunca me deparara com tal conceito? Me lembrei de uma aula (que possivelmente também tem mais de dez anos) com a professora e filósofa Vera Portocarreiro (UERJ), autora de uma vasta obra. Eu, que na ocasião já havia lido uns cinco livros de Foucault, fiz-lhe uma pergunta, do tipo pretensiosa, para demonstrar meu conhecimento, no que ela me respondeu:
sou uma estudiosa de Foucault há vinte anos e hoje posso dizer que sei um pouco, conheço pessoas que o estudam há 30 anos e me dizem que há muito a saber. Minha arrogância pseudointelectual ficou ali no chão daquela sala.

Giorgio Agamben é um desses grandes estudiosos da obra de Foucault, mas é muito mais que isso. Autor de obras que relacionam a filosofia com a literatura e a poesia, mas, sobretudo, com a política, um dos conceitos fundamentais de Agamben é o de homo sacer, isto é, homem sagrado e posteriormente o de “Estado de Exceção”. Foi lendo “Profanações” (obra publicada em 2005, que só tomei conhecimento bem mais tarde), que passei a me interessar mais por Agamben, o modo como ele apresentou o conceito de profanar me capturou, o filósofo retira do direito romano, cuja função seria de oposição a “consagrar” (tornar sagrado), isto é, “saída das coisas do direito humano”, em contrapartida, “profanar” designa “restituir ao uso livre dos homens”. Foi ai que me descobri um profanador.

Em “O uso dos corpos”, Agamben dá continuidade ao conceito de homo sacer, uma grande questão é saber o que é vida? O que é viver? Como tal conceito emergiu na sociedade Ocidental? Como um filólogo, um genealogista, Agamben percebe que em Aristóteles há duas formas distintas de descrever vida: Zoè e Bios. No primeiro caso, vida é sinônimo de seres viventes, o que inclui todos os seres, no segundo caso, trata-se de uma particularidade que nos diferencia enquanto espécies; o animal político.

Agamben procura assim estabelecer uma ética da existência, o que significa dar sentido a vida. Ao ler Foucault, encontra o debate sobre o conceito de “sujeito”, mão não mais aquele sujeito cartesiano do cogito ergo sum, onde o sujeito é dado a priori, o sujeito em Foucault se constitui na relação com si e com o mundo, trata-se de “constituir-a-si”.

Imagine que você é um escultor, que está diante de um bloco enorme de mármore, você não tem muita noção de quanto tempo levará para esculpir, talvez até tenha uma ideia prévia do que vai fazer com seus formões na rocha, mas conforme vai entalhando, vai percebendo nuances, que levarão a outras direções, que modificarão o projeto original. Possivelmente o tempo, as intempéries, os diálogos com terceiros e tantas outras coisas poderão gerar novas percepções sobre sua obra. O ser que iniciou aquele trabalho, que tinha uma noção de como realizá-lo, agora não é mais o mesmo, é outro, talvez tenha sobrado apenas um pequeno fragmento, uma lembrança daquele indivíduo que deu o primeiro entalhe.

Seríamos todos escultores de nossa própria obra? A resposta é, geralmente não. Aqui é importante dizer que há nos grupos sociais uma série de relações de poder (Estado, Igreja, Família, organizações civis….), que funcionam como dispositivos de sujeição, cuja função é nos conduzir em cada entalhe. Esse assujeitamento, retira de nós a liberdade de contituir-a-si, estabelece parâmetros sobre o que é a vida e padrões de como nossos corpos devem ser utilizados. A vida como obra de arte é possível, para tanto, faz-se necessário compreender o funcionamento das coisas, neste caso, os gregos antigos, a filosofia, pode muito contribuir. Não, falo de coisas do tipo “10 hábitos que vão mudar sua vida”, estes tipos de autoajuda são mecanismos de sujeição. Filosofia de verdade não te dá fórmulas prontas, acabadas, porque nenhum ser humano é igual ao outro. O uso dos corpos como obra de arte é, portanto, descobrir-se-a-si, encontrar-se com sua singularidade, tornar-se livre-em-si, sem muletas metafísicas.

A vida como obra de arte é como olhar para uma tela em branco e não ter certeza alguma de como ficará ao final, mas saber que você desfrutará de cada traço, ponto ou borras ali colocados, escolherá livremente sua palheta de cores e variará entre pincéis e espátulas ao seu bel prazer. A vida como obra de arte é aquela onde se tem o máximo de consciência de escolhas e satisfação no viver, sem preocupar-se demasiadamente com o que outros pensarão. Sem se preocupar de atingir a perfeição, pois como disse Salvador Dali: você nunca irá atingi-la.

Jonatas Carvalho 

sexta-feira, janeiro 18, 2019

UM ESTRANHO NO NINHO: DUAS VERSÕES SOBRE A LOUCURA NA LITERATURA E CINEMA

Preferi sempre a loucura das paixões à sabedoria da indiferença.
(Anatole France - 1844 - 1924)

Passei os últimos meses (não sei quantos, quatro, cinco talvez) dedicado a questão da loucura. Após dezenas de leituras, filmes, documentários (e ainda há mais para ler e ver), é possível já vislumbrar alguns frutos, em breve (este mês ainda imagino), um artigo será publicado na Revista Ingesta da USP, escrito com minha querida amiga (e parceira de mais quatro artigos) Beatriz Brandão, além disso, um projeto que está prestes a sair envolvendo Arte e Loucura, voltado para a Educação na área de história da arte e que contará com a parceria do professor de artes e história da arte, Rodrigo Retka. 

Muito já se escreveu sobre esse tema, desde de Erasmo de Roterdã (em O elogio da loucura, de 1511) até Foucault (em História da loucura na Idade Clássica em 1961), mas ainda há tanto que se refletir. Neste texto especificamente, quero tratar sobre uma obra, que embora de ficção, tem fundamento em experiências reais do autor, trata-se de One Flew Over the Cuckoo's Nest, (Voando sobre um Ninho de Cucos), de Ken Kesey, escrito em 1962 e traduzido no Brasil com o título de Um Estranho no ninho. A obra virou um filme vencedor de algumas estatuetas em 1975, dirigido por Milos Forman, cineasta tcheco que quando menino perdeu seus pais em campos de concentração nazistas. Meu objetivo aqui será traduzir resumidamente como a loucura é apresentada na obra de Kesey, mas também a partir da releitura de Forman, uma vez que este último, tenha alterado bastante a versão para o cinema. 

Comecemos pelo livro, por motivos óbvios. Ken Kesey, estudou jornalismo na Universidade de Oregan, em 1957, por meio de uma bolsa de estudos foi para Stanford, onde fez estágio em um hospital para veteranos de guerra em  Menio Park, para ser mais específico, trabalhava a noite na ala de "doentes mentais". E é ai que nasce a história, parte das personagens de Kesey são baseados em pacientes com quem ele se relacionou, exceto McMurphy, protagonista com características irreverentes que ele construiu inspirado em um de seus amigos de seu grupo Merry Pranksters. A obra tornara-se um sucesso por uma série de razões, em primeiro lugar por ter uma narrativa na primeira pessoa, o narrador é um nativo americano, chefe Bromden, que embora integrado na sociedade, viu seu pai ser humilhado pelo governo, o índio recebe um diagnóstico de esquizofrenia. Chefe Bromden narra a chegada de McMurphy ao hospital psiquiátrico, este se passara por louco para evitar a penitenciária, após ter matado um homem numa briga de bar. Mc, muda a rotina do hospital com sua irreverência e coloca em cheque a tirânica enfermeira Ratched. A discussão sobre sanidade e insanidade são tratadas na obra, o que faz dela uma referência do movimento da antipsiquiatria. 

Cartaz da Acid Test em 1966 - Califórnia
No mesmo ano que Kesey lança seu livro, o psiquiatra escocês RD Laing também estava tendo dúvidas sobre as atividades das instituições mentais. A loucura pode realmente ser útil para a sociedade? Pode ser útil para os loucos? Três anos depois, Laing fundou o Kingsley Hall, um centro de experimentos anti-psiquiátricos no leste de Londres, ainda em Londres, Maxwell Jones, psiquiatra sul-africano, consolidava o modelo de Comunidades Terapêuticas, cuja proposta era basicamente substituir os eletrochoques e as lobotomias por terapias de grupo e psicodramas. Alguns anos depois (em 1968), era a vez do italiano Franco Basaglia escrever " A instituição Negada", uma dura crítica ao sistema psiquiátrico, era o tempo da psiquiatria social. A importância da experiência em The Politics of Experience (1967), de Laing, contribuiu na dinamização dos movimentos de contracultura, dos quais, inclusive Kesey fez parte. As experiências de Kesey deram início no próprio hospital, uma vez que ganhava pouco, resolveu se inscrever como voluntário no programa de controle mental da CIA, mais conhecido como Projeto MKUltra. O programa visava desenvolver substâncias capazes de serem aliadas dos interrogadores, uma espécie de soro da verdade, dentre as substâncias utilizadas nos experimentos estavam o LSD, psilocibina, mescalina, cocaína, aMT e DMT. Kesey, pelo que parece, gostou tanto dos experimentos que após formado, passou a dar festas na sua fazenda La Honda, na Califórnia, as festas receberam o título de Acid Test, transformando-se em um verdadeiro point da geração Beat e Hippie. Os Acid Test ficaram tão famosos que fizeram parte de composições musicais como a A Song for All Seasons, de Jefferson Airplane, dos Volunteers (1969).  


Bem, eu ouvi que vai ser recuperado
Bem, eu pensei que você tinha feito isso
Mas você nem sequer é pago
Para as coisas que você comprou
Como o teste ácido
Eu ouvi que seu gerente saiu da cidade com todo o seu salário
E a liderança do seu vocalista transforma os censores em cinza
Parede que é realmente uma vergonha
Mas quem está lá para culpar
E tudo que você queria mesmo era só para jogar
Dizem que seu baterista ele é louco como um mergulhão
Ontem à noite, o acharam latindo para a lua

Um estranho no ninho, ao modo como Kesey concebeu, revela uma América voltada para o consumo e a guerra. Chefe Bromden descreve as contradições de uma sociedade que eliminou seus antepassados, por, dentre outras coisas, considerar seus rituais de alterações de consciência como satânicos, para dar lugar a uma juventude que "viaja" em LSD e outras substâncias. Essa juventude não queria saber de guerras, tão pouco de money, estavam, ao contrário, ávidos pelas liberdades, liam Aldous Huxley (As portas das percepções - 1954) e Carlos Castaneda (A erva do diabo - 1968). As editoras trataram de traduzir e publicar clássicos do século XIX, como Confissões de um comedor de ópio (1822) de Thomas de Quincey e Paraísos Artificiais (1860) de Charles Baudelaire. 


Kirk Douglas e Joan Tetzil em 1963
Como disse em algum parágrafo acima, a obra de kesey, extrapolou a literatura, primeiro foi para o teatro, adquirida por Kirk Douglas que interpretou McMurphy, contracenando com Joan Tetzel de enfermeira Ratched, a peça estreou na Broadway em 1963 e na telona em 1975. Os bastidores da produção do filme renderam muitas capas de revista de fofoca, mas também chegou aos tribunais. Kesey nunca viu o filme, se irritou ao saber do roteiro de Bo Goldman e Lawrence Hauben, não gostou da ideia de seu protagonista ser interpretado por Jack Nicholson, preferia Gene Hackman para o papel. Suas objeções, no entanto, não foram absolutas, afinal, o filme recebeu quatro estatuetas na 48º cerimônia do Oscar, o que demonstra que  não entendia mesmo de cinema, Nicholson levou a de melhor ator, Louise Fletcher (a enfermeira Ratched), de melhor atriz e Forman de melhor diretor, o filme também levou o prêmio de melhor roteiro adaptado, o filme teve um orçamento de 4,5 milhões e rendeu 109 milhões nas bilheterias, um sucesso. O elenco é absolutamente excepcional, além de Nicholson e Fletcher, o time ainda contou com Will Sampson (de Chefe Bromden), Brad Dourif (no papel de Billy Bibbit), Danny DeVito (interpretando Martini), Christopher Loyd (como Max Taber), e muitos outros.

O que deixou Kesey tão desgostoso no filme? É difícil dizer, quem já assistiu filmes produzidos a partir de obras literárias e as leu antes de ver o filme sabe bem o quanto isso pode ser decepcionante. Me lembro bem da minha primeira frustração, eu era um adolescente e tinha lido "Eu, Christiane F, 13 anos, drogada, prostituída..." (1976), não que eu tenha achado ruim o filme (1981), adorei a atuação de Natja Brunckhorst, no papel de Christiane F e claro, a participação de David Bowie, mas ao fim, eu me perguntei o  por quê do diretor ( Ulrich Edel), ter escolhido ocultar certos acontecimentos do livro que pra mim eram essenciais. Foi só mais tarde que me dei conta que cada leitor apreende de uma obra aquilo que é sensível a sua subjetividade, e que um filme é a leitura do seu diretor. Isso fica muito evidente em casos de biografias, se escolhermos qualquer figura histórica e dermos sua biografia para cinco cineastas teremos cinco visões sobre aquela figura. Não foi diferente com  "Um estranho no ninho", Milos Forman, é um leitor que resolveu elucidar aquilo que considerou fundamental a partir de sua leitura da obra. 

Milos Forman, que faleceu em abril de 2018 aos 86 anos, tem uma biografia tão interessante quanto a de Kesey, como já citei acima, o cineasta tcheco perdeu os pais quando tinha entre 11 e 12 anos, o pai, professor foi preso por distribuição de literatura proibida, morreu no campo de concentração de Buchenwald, a mãe, morreu em Auschiwitz, em 1943. Passou parte da vida em um país de regime socialista (a antiga Checoslováquia), só veio para os EUA em 1968. Seu primeiro filme de sucesso foi "Amores de uma Loira (1967), destacando-se internacionalmente ao receber o prêmio do Festival de Veneza e ter sido indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Seu primeiro filme produzido nos EUA foi Taking Off (1971 - título no Brasil "Procura Insaciável), ganhador do Prêmio Especial do Júri do Festival de Cannes, anos depois consagra-se com  "Um estranho no ninho". Forman ainda dirigiu outras grandes produções, dentre as quais destaco aqui: "Amadeus" (1984), outra adaptação, vencedor de oito estatuetas incluindo de melhor diretor; "O povo contra Larry Flynt" ( 1996), com duas indicações ao Oscar e o prêmio "Urso de Ouro" no Festival de Berlin; "Goya's Ghosts" (2006 - título no Brasil " As sombras de Goya", com Stellan Skarsgård no papel do pintor espanhol Francisco Goya e Javier Bardem de Irmão Lorenzo, um padre membro da inquisição e Natalie Portman, no papel de Inês. 

Jack Nicholson e Louise Fletcher - 1975
O filme pode incomodar aos leitores da obra em alguns aspectos, o principal deles é que o Chefe Bromden não é o narrador, apenas um nativo americano que usa da dissimulação (se passando por surdo e mudo) para não ser incomodado pela equipe médica do hospital psiquiátrico. Já a enfermeira Ratched (a quem no livro Bromden chama de "chefona") não possui o mesmo requinte de crueldade que no livro. Todavia, o filme atinge ao objetivo do livro, tratar da desumanização dos "loucos", a personagem de Nicholson (McMurphy), que de início caçoa dos seus colegas, aos poucos vai desconfiando do que ocorre ali, por fim percebe que havia encontrado amigos sinceros, e sai em defesa de seus companheiros.
  


Jonatas Carvalho.









  

sexta-feira, janeiro 04, 2019

REENCONTRANDO UM MESTRE: EU E LEONARDO BOFF NA PORTA DOS CORREIOS.

O dia de hoje merece um registro, não é todo dia que você reencontra um grande mestre. Foi na pequena agência dos correios em Itaipava que reencontrei Leonardo Boff, há anos não o via. Sua recepção a minha abordagem foi a de um velho monge, humilde e serena. Revelei-lhe que apenas dois escritores brasileiros me acompanharam por quase toda vida, ele e Rubem Alves, por motivações distintas. Disse-lhe o quanto foi fundamental ler "Jesus Cristo Libertador" e "Igreja Carisma e Poder" quando estudava teologia nos anos de 1990. Comentei que recentemente eu havia indicado a alguém a leitura de "Terapeutas do Deserto" que ele publicou com o teólogo e filósofo francês Jean-Yves Leloup. Ele me  ouvia pacientemente e comentava sorridente.

A conversa se encaminhou para os dias atuais, disse-me temer pelo que virá. Falamos sobre educação, e ele me revelou que ainda dava aulas na UERJ quando chegaram lá os primeiros cotistas.
 - Que alunos dedicados! Que privilégio ensiná-los! Exclamou, para depois demonstrar seu temor que essa condição deixe de existir. 

A conversa, rendeu ainda mais alguns poucos minutos, ele me falou de um artigo que publicou ontem, uma releitura de outro que escrevera em 2013, cujo título é "Face ao novo Governo que nos socorra São Jorge", neste texto Boff faz um interpretação psicanalítica a partir de Erik Neumann, discípulo de C. G. Jung, em que o São Jorge e o Dragão são representações da psiquê humana, "O dragão em nós é o nosso inconsciente, a nossa ancestralidade obscura, nossas sombras. nossas raivas e ódios. Deste transfundo irromperam para a luz a consciência, a independência do ego e nossa capacidade de amar e conviver humanamente, representados por São Jorge." Transportando tal concepção para a sociedade brasileira, o dragão social, outrora controlado, agora dispara sua ira às minorias; homoafetivos, indígenas, quilombolas, mulheres independentes. Por fim disse, que precisamos invocar o São Jorge para assumir a história social, mas não com a espada -  e aqui, pareceu-me que ele deu a Jorge, características de Francisco de Assis (sobre o qual ele é um notável conhecedor) - "Devemos usar as armas que eles não dispõem", eu completo aqui retirando de seu artigo: 

"Às discriminações respondemos com a inclusão de todos indistintamente. Ao ódio disseminado contra opositores, responderemos com amorosidade e compaixão. À criação de bodes expiatórios, responderemos com a defesa dos inocentemente marginalizados e injustamente condenados. Às mentiras e às visões fantasiosas que nos querem levar à Idade Média, responderemos com a força dos fatos e fazer valer o sentido da contemporaneidade."

Ao fim de nossa brevíssima, mas intensa conversa, eu o agradeci pela sua atenção em parar com um ex aluno e admirador, e recebi dele um singelo "valeu irmãozinho". 


Link do artigo citado acima: https://leonardoboff.wordpress.com/2019/01/03/face-ao-novo-governo-que-nos-socorra-sao-jorge/

Jonatas Carvalho.