sábado, abril 23, 2016

CONVERSAS COM PAI JONÃO.

Pai Jonão! Pai Jonão!! Gritava eu desesperado batendo à porta. Ouvi alguém tossindo. Pai Jonão! Ele apareceu com a mesma serenidade de sempre.
- Olá meu fio. Ocê tá nervoso com que?
- Oi meu pai! Me perdoe. Mas eu acho que a situação no nosso país fica cada dia mais feia.
- hehehe. Feia meu fio era quando a inflação chegava a mais de 900% ao ano na década de 90.
- Mas meu pai eu acho que a Dilma vai ser impedida no senado também. Mesmo com toda imprensa internacional dizendo que não está certo isso. Até o Joaquim Barbosa, o bastião da moral da direita antes do Moro, disse que as bases jurídicas do impeachment são fracas.
- hehehe....muita gente vai mudar de casa agora né meu fio?
- Ahn? Como assim?
- Uai, A Dilma vai desocupar a casa dela, o Temer vai desocupar a dele...hehehe. A pergunta é: quem vai morar no Jaburu?
- Ai meu pai.

quinta-feira, abril 21, 2016

CONVERSAS COM PAI JONÃO

Após alguns dias tentando digerir a votação do impeachment, confesso que ainda não consegui fazer isso muito bem. Resolvi dar uma passadinha no Pai Jonão para falar dessa sensação de constipação, de algo preso na garganta.
- Bom dia Pai Jonão! Como tem passado?
- Bom dia meu fio, eu vou bem, tirando o fato que não acho mais fumo bom pro meu cachimbo hehehe. Mas ocê tá com cara de quem comeu demais hehehe.
- Eu ando muito incomodado com os rumos do nossa Brasil meu Pai. O que vai ser de nós agora? A imprensa no mundo todo falou do nosso congresso as manchetes diziam que um grupo de corruptos votaram pelo afastamento de uma presidente honesta, isto está no New York Times, na CNN e muitos outros.
-  hehehe, aqueles deputados que estão lá no congresso são alienígenas meu fio?
- Ahn? Como assim meu pai? Não entendi. Eles são os nossos deputados.
- hehehe, então porque tanto espanto, se eles estão lá é porque o povo os colocou lá uai. Eles são um espelho da nossa gente. O deputado que ocê votou ganhou as eleições? Estava lá? Ocê sabe como ele votou?
- Ai meu pai que vergonha! Olha eu juro pro senhor que eu não vendi meu voto tá....mas também não lembro em quem votei. Me perdoe meu pai!
- hehehe, não é pra mim que ocê deve pedir perdão meu fio. Mas guarde isso...se o povo não leva a política a sério, por causa de que ocê acha que os políticos vão levar?

quarta-feira, abril 20, 2016

SOBRE A NEGAÇÃO E DESQUALIFICAÇÃO DAS TORTURAS NO BRASIL

Se teve algo que me deixou altamente irritado no dia de ontem foi ver tanta gente falando de Jair Bolsonaro. Ele deve está rindo demais, disso tudo, afinal conseguiu o que queria os holofotes. Mas uma coisa me indignou ainda mais que ver gente defendendo esse senhor, foi ter visto gente saindo em defesa das suas teses sobre a ditadura no Brasil, gente que acha que pessoas que foram torturadas mereceram porque eram "terroristas" e até gente que acha que Brilhante Ustra foi um general honrado. 
Eu me pergunto de onde essas pessoa tiram isso? Como historiador e professor de história, embora esse período não seja minha especialidade, eu me interesso muito e já li o suficiente pra me convencer de que o que tivemos no Brasil foi um golpe civil militar que em seguida se configurou numa ditadura militar. Nós não tivemos presidentes militares, tivemos ditadores, de Castelo Branco a Figueredo. 
Não são poucos os historiadores que dedicaram suas vidas acadêmicas a esse evento lamentável na história da nossa nação. Só para citar alguns aqui:

1964: A CONQUISTA DO ESTADO;René Armand Dreifuss

BRASIL: DE GETÚLIO A CASTELO;Thomas Skidmore

A DITADURA ENVERGONHADA;

A DITADURA ESCANCARADA;

A DITADURA DERROTADA;

A DITADURA ENCURRALADA;Elio Gaspari

1964: O GOLPE QUE DERRUBOU UM PRESIDENTE, PÔS FIM AO REGIME DEMOCRÁTICO E INSTITUIU A DITADURA NO BRASIL; Jorge Ferreira e Angela de Castro Gome.

ALÉM DO GOLPE: versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar; Carlos Fico.

Estes são apenas uns poucos livros (embora de relevância extrema por ser tratar de obras reconhecidamente apuradas), no universo da pesquisa sobre o regime militar é muito maior. O problema que é os nossos amiguinhos simpáticos ao nobre deputado militar, só citam Olavo de Carvalho. O Brilhante Ustra lançou um livro, antes de falecer, prometendo revelar a " verdadeira face dessa história" e ele começa dizendo que algumas "facções terroristas" estavam prestes a implantar uma ditadura bolivariana no país. Por incrível que pareça, eu ouvi essa tese entre os que defendiam o Brasil contra a corrupção e o fim do PT. Se tal tese ela não era verdadeira em 1960, quanto mais agora. 

Para terminar é preciso dizer aos nossos amiguinhos, que só leem Olavo de Carvalho, que os terroristas em questão, eram pessoas lutando por algo que eles hoje tem, mas não dão valor e são incapazes de serem gratos por isso; Liberdade, direito de expressão, direito de ir e vir, direito de reunião, dentre outras. O AI5, por exemplo, conferia os seguintes poderes ao Sr. ditador-presidente:

- Concedia poder ao Presidente da República para suspender os direitos políticos, pelo período de 10 anos, de qualquer cidadão brasileiro;

- Concedia poder ao Presidente da República para cassar mandatos de deputados federais, estaduais e vereadores;

- Proibia manifestações populares de caráter político;

- Suspendia o direito de habeas corpus (em casos de crime político, crimes contra ordem econômica, segurança nacional e economia popular).

- Impunha a censura prévia para jornais, revistas, livros, peças de teatro e músicas.

O texto ficou um pouco longo para as redes sociais, não tenho certeza se os discípulos de Bolsonaro e Olavo de Carvalho o lerão, mas escrevo aqui consciente de minha cidadania e por guardar um profundo respeito aos que lutaram, e foram torturados, aos que morreram para que tivéssemos de volta a democracia nesse país.

domingo, abril 17, 2016

CONVERSAS COM PAI JONÃO

Hoje acordei tenso, preocupado com o futuro do nosso país. Fui até o pai Jonão pra trocar umas ideias.
- Bom dia Pai Jonão! Hoje é dia de impeachment! Os grandes jornais do país já dão como certo a saída da presidente. Eu estou apreensivo pra ser honesto. Mas ela errou né meu pai?
- Bom dia meu fio! Hehehe...errou nem mais, nem menos que os outros, aliás muito menos que alguns, muito menos que o sociólogo e o caçador de marajás...hehehe.
- Mas o Sr. acha que ela cai?
- Ela já caiu meu fio, mesmo se não for impedida hoje, já caiu. Os homi do congresso estão tramando sua queda faz tempo, desde que ela venceu as eleições. Se o povo fosse mais esperto, não pediria a saída dela, se nosso país tá assim é por causa do congresso.
- Como assim meu Pai? Ela é a presidente.
- Num sistema assim meu fio, só se governa negociando com o congresso, e esse que tá ai, liderado por tar de Eduardo, fez de tudo pra parar o governo, até as tais das "pautas bombas" eles fizeram, não dá pra governar assim. O congresso é o responsável meu fio.
- Ela fica de mãos atadas então? Não há nada que se possa fazer?
- Hehehe....há sim....negociar. Se ela fosse da mesma laia que eles meu fio, nada disso estaria acontecendo.
- Mas meu pai, dizem que as manifestações vão continuar até o Temer, o Cunha e o Calheiros sair também.
- Hehehe, deixe de ser ingênuo meu rapaz. O Eduardo já se safou no Conselho de Ética, claro que com a ajuda dos meios de comunicação, o processo de impedimento do Temer não vai andar no congresso, e o Calheiros está totalmente esquecido no senado. Se as imprensa não noticiar todo o dia a corrupção meu fio, o cidadão não se revolta e não vai pra rua. Eles vão contar que o Brasil melhorou, o povo acredita e pronto.
- Ai que merda.

CONVERSAS COM PAI JONÃO

Continuando a conversa com Pai Jonão sobre política, indaguei-o sobre o processo de impeachment. 
- Pai Jonão, eu não sei não. Se o processo de impeachment fosse ilegal não teria tanto deputado votando a favor da saída da presidenta. O que o Sr. acha? 
- hehehe meiu fio infelizmente não é bem assim. Ocê acha mermo que se assim fosse o presidente da câmara teria conseguido maioria no Conselho de Ética? Enquanto ele toca o impedimento da presidenta com a ajuda de seus amigos, ele conseguiu mudar as regras no Conselho de Ética pra conseguir maioria e escapar da cassação. Hehehe e esse povo acha que eles estão preocupados com a corrupção.

CONVERSAS COM PAI JONÃO

- Meu pai estou na dúvida! Não sei muito bem em que acreditar. A imprensa mostrou que o governo está comprando votos para barrar o impeachment, mas os partidos da base aliada estão abandonando o governo? 
- Hehehe...alguém está pagando mais meu fio! 
- Mas como assim meu pai?
- Ocê acha mermo que essa debandada é por ética meu fio?
- Não sei em que acreditar pai Jonão. Eles dizem que as manifestações pró-governo são patrocinadas pelas instituições que recebem dinheiro do governo, como a CUT, o MST....
- Hehehe...e quem é que banca as manifestações contra o governo meu fio?
- Não são os próprios manifestantes?
- Deixe de ser bobo...hehehe. Vosmicê não viu aquele pato gigante na paulista? O pato da Fiesp?
- Eu vi sim a Fiesp é a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
- Isso mermo. O presidente da Fiesp é do PSDB meu fio...hehehe. O Paulinho da Força, aquele deputado que já foi de esquerda lembra? Disse que tem muita gente querendo financiar o impedimento da presidenta.
- Mas a troco de quê meu pai?
- Dim dim meu fio...hehehe...do que mais seria. Quando se permite que tantos corruptos condenem alguém que não pode ser acusada de corrupção só pode haver interesse nisso né?
- Acho que é meu pai.

sexta-feira, abril 01, 2016

A POLÍTICA NA SALA DE AULA EM TEMPOS DE INTOLERÂNCIA

Hoje foi a segunda vez esse ano que fui abordado sobre o tema política na sala de aula. Na primeira foi um pai, não de aluno meu, mas um amigo que tem filhos em idade escolar e me perguntou, demonstrando alguma preocupação, como nós professores de humanas estávamos lidando com isso. Eu lhe disse que não havia unanimidade em posições políticas, cada professor é de um jeito e que portanto não há um comportamento padrão. 

Já hoje, foi a diretora de uma escola onde leciono, e que por sinal trouxe sua preocupação de maneira muito respeitosa, cuja precaução era pertinente, uma vez que tratava-se de alunos do ensino fundamental, isto é, crianças. Ela trazia a preocupação de que algum pai ou mãe pudesse achar que nós professores de ciências humanas, estejamos "doutrinando" seus filhos partidariamente. Não vi qualquer problema em ambos os casos, o amigo e pai, assim como a diretora manifestaram-se sobre o relevante papel que nós professores exercemos em uma sala de aula como formadores de opinião. Os pais tem todo o direito de conduzir o ideário de seus filhos, pelos menos, até o momento em que estes tenham idade e autonomia de pensar livremente. Até aqui tudo certo. 

Há apenas um porém nisso tudo, como eu disse, foi a segunda vez que me abordaram este ano, este é o porém, Há anos que leciono, e nunca antes eu fora abordado com essa preocupação. Não me lembro de um dia sequer que um pai ou mãe, que um diretor ou diretora, tenha me parado na saída da escola para me perguntar sobre meu posicionamento político. Por que agora? Acho que fica evidente que é circunstancial. Vivemos um momento tenso no país, onde a polarização tem nomeado coxinhas de uma lado e mortadela de outro. 

Quando imaginaríamos que um professor ao se candidatar para lecionar em uma escola, seus contratadores verificariam se ele é de esquerda ou de direita. Quando poderíamos pensar, que os pais de nossos alunos iriam olhar nossos perfis no facebook para saber que tipo de orientação política seu filho estaria sujeito. Esse é um fenômeno novo para todos nós que lecionamos após a redemocratização no Brasil. Quem lecionou antes, no início dos anos de 1960, por exemplo, certamente viveu experiências assim, mas isso já tempo. Nós professores de história, sociologia, filosofia, geografia, nos iludimos por acreditar que jamais esse tempo voltaria.  

Não vejo como um mal em si, a preocupação dos pais ou das escolas, pelo contrário, penso que é legítimo e correta tal prudência. Penso que é de suma importância que as gerações futuras não seja de jovens apolíticos, pois isso só prejudicaria ainda mais os rumos de nossa democracia e cidadania. Nas escolas em que leciono a compreensão de que a subjetividade dos professores devem ser respeitadas é clara. Nossos diretores e coordenadores pedagógicos sabem muito bem que não se pode dissociar o sujeito do professor. Não somos máquinas, somos gente, pessoas com paixões, ideias, defeitos e virtudes. Indivíduos com percepções de mundo distintas, com com interpretações éticas e morais variadas. Por outro lado, não estamos mais em um tempo em que os "alunos" eram tratados como alguém que só tem a receber e nada a contribuir. Vivemos uma época onde temos plena consciência da relevância de colaborarmos para o desenvolvimento da autonomia de pensamento dos nossos alunos. É CLARO, temos ainda o "poder" de influenciar, mas subestimamos nossos alunos se achamos que somos capazes de fazê-los acreditar em tudo que dissemos; não somos. Eles nunca foram tão questionadores como hoje e isso é bom. Sou encantado pelos meus alunos de ensino médio, que questionam não apenas minhas posições ideológicas, mas sobretudo, questionam a própria história. Mas ouvir um aluno do ensino fundamental questionar o direito divino dos reis é sensacional. 

Acredito que é nesses momentos de polarização, que nossa fala deve ser antes de qualquer coisa, uma fala que defende a sensatez, que alimenta a tolerância. O que não nos impede de ser militantes, de ser políticos no sentido pleno da palavra. Como professores temos o dever de ENSINAR a nossos alunos que só por meio do diálogo, da aceitação das diferenças, do respeito pleno de pensar e deixar pensar, será possível construir um país melhor no futuro. Se ensinarmos isso, quem sabe os filhos de nossos alunos, não precisarão testemunhar tempos de intolerância como os que eles estão vendo hoje acontecer em nosso tão querido país. 

Jonatas Carvalho é professor e pesquisador de história.