terça-feira, junho 26, 2018

LIBERALISMO DESEMBESTADO À BRASILEIRA


Passei alguns dias lendo alguns autores liberais, alguns clássicos (como John Stuart Mill), alguns intelectuais (como Mario Vargas Llosa), na busca pelo pensamento liberal no Brasil me deparei com um site chamado Academia do Liberalismo Econômico (Link-https://aleconomico.org.br/quem-somos/). O site, ao que parece, recebe colaboração de voluntários, que traduzem textos de liberais nos EUA, Inglaterra dentre outros, sobretudo, trata-se de um site que reproduz o pensamento econômico da escola austríaca, como é o caso de Ludwig Heinrich Edler von Mises. A Academia do Liberalismo Econômico tem um objetivo óbvio, lutar contra a “escolarização de esquerda”, alimentando assim a ideia de que o pensamento de esquerda é predominante no ambiente escolar. (tese esta nunca comprovada, mas persistente no Escola sem Partido).
O projeto da Academia do Liberalismo não é um caso isolado, há outros, como, por exemplo, Mises Brasil (Veja aqui: https://www.mises.org.br/Default.aspx), trata-se de deliberadamente preparar a juventude brasileira na defesa do liberalismo. Não que nossos jovens não devam ter contato com o pensamento liberal, pelo contrário, creio que seja essencial, mas os sites que citei acima, defendem um liberalismo ortodoxo, a escola austríaca e, sobretudo, Mises, são exemplos de uma certa radicalidade.
As publicações do Academia do Liberalismo Econômico são voltadas para criticar políticas de caráter intervencionista, defensores vorazes do Livre Mercado, os autores apresentam trabalhos com pouco teor teórico, salvo algumas exceções. Entre os “artigos” é possível verificar todo tipo de incongruência como é o caso de “O capitalismo é bom para os pobres”, de Steven Horwitz, liberal da escola austríaca. Neste “artigo”, podemos encontrar proposições que fariam Adan Smith revirar no túmulo:

“Hoje, os pobres em países capitalistas vivem como reis, graças em maior parte à liberdade de trabalhar e à habilidade em acumular capital que torna o trabalho mais produtivo e enriquece até os mais pobres de todos.”

Outro “artigo”, que traz como título “Como o livre mercado atua sobre a pobreza”, escrito por Thiago Serpa Alves, vemos a seguinte proposição:

"Ao longo dos últimos 200 anos houve diminuição gradativa da situação de pobreza extrema presente no mundo. De 1820 a 2015 a população mundial passou de cerca de 1,1 para 7 bilhões de habitantes, porém a quantidade de pessoas em situação de pobreza extrema caiu de cerca de 1 bilhão em 1820, para aproximadamente 700 milhões em 2015."

O jovem liberal utiliza o índice GINI para produzir gráficos demonstrativos dessa afirmação.
Lendo um pouco mais, encontrei o “artigo” de Felipe Lungov, presidente da Academia do Liberalismo Econômico, cujo título é “O lucro faz mal para a sociedade?” Para o economista com formação na USP, o lucro é um fenômeno natural, benéfico a sociedade como um todo. Quanto mais lucrar uma empresa, mais justiça social haverá, recorto aqui uma proposição:

"O lucro é o atestado inviolável de que seu portador conseguiu encontrar pessoas que estavam pagando demais em produtos cujos produtores estavam ganhando de menos. E tem mais: quanto maior for o lucro obtido, (a) mais defasada estava a renda do trabalhador em relação ao preço pago pelo consumidor, e/ou (b) maior foi o número de trocas realizadas que beneficiaram essas pessoas todas. Ou, nas palavras de Robert Murphy, lamentar que um capitalista esteja tendo lucro muito alto é como reclamar de um cirurgião por salvar muitas vidas”.

A produção desses argumentos de caráter pouco crítico, que naturaliza o capitalismo e o livre mercado, estão se disseminando nas redes sociais e encontrando reverberação na juventude brasileira, sobretudo, nos filhos da classe média. O sintoma mais agudo desse tipo de liberalismo é a organização de grupos como o Movimento Brasil Livre (MBL), grupos esses de olho em investidores estrangeiros dispostos a propagar o liberalismo (como a Open Society Fundations de George Soros). Outro sintoma é a criação de partidos liberais como o Partido Novo, que terá como candidato as eleições de 2018 um de seus fundadores, João Amoedo. Defensor ferrenho de um Estado Mínimo, Amoedo prega uma privatização geral no país como solução de reduzir o tamanho do Estado.

As diferenças ideológicas entre os liberais são enormes, seria um erro grave colocá-los todos no mesmo saco, há liberais cujas pautas políticas estão conectadas com parte da esquerda no que tange as liberdades civis, como legalização do aborto, descriminalização das drogas, casamento homoafetivo e adoção de crianças por esses casais. Mas o tipo de liberalismo que está de disseminando entre nossos jovens é conservador no que diz respeito as liberdades individuais, idolatram o livre mercado, mas são patrulheiros morais. Para esses novos liberais, demanda e oferta são deuses do olimpo, não devem ser questionados, se o mercado quiser nossos recursos naturais (nossas águas, petróleo….) que seja, ainda que para isso use de estratégias que coloque o país em crise financeira para depois comprar nossas riquezas a preço de banana. Esses jovens liberais, não viram qualquer problema em romper com o sistema democrático em 2016 ao apoiar figuras como Eduardo Cunha e Michel Temer, mas acham um absurdo, uma degradação a arte contemporânea brasileira. Agora disseminam ideias como a de que o salário-mínimo é gerador de desemprego, ou que política de igualdade salarial é um equívoco, como defende Jefferson Shupe, segundo ele:

Claramente existem mulheres que ganham menos do que um homem na mesma função, mas também existem mulheres ganhando mais do que um homem na mesma função. Se estas leis igualitárias passarem, estou certo de que muitas mulheres, além de homens, teriam seus rendimentos cortados para igualar as coisas.

Termino aqui com uma citação de Adan Smith em “A riqueza das nações”: "Onde há grande propriedade, há grande desigualdade. Para um muito rico, há no mínimo quinhentos pobres, e a riqueza de poucos presume da indigência de muitos."

Jonatas Carvalho.