quinta-feira, dezembro 10, 2009

DROGAS E SOCIEDADE; O FENÔMENO DO CRACK.

Há algumas questões que precisam ser melhores esclarecidas no que tange a relação drogas e sociedade. Uma questão seria perceber o que ocorreu com o termo “droga” (palavra que hoje é atribuída a substâncias capazes de alterar o funcionamento do sistema nervoso central), que tem origem no árabe e no holandês antigo, significa “seco”, ou, “folha seca”, referência as especiarias da época do mercantilismo. O açúcar e o tabaco são exemplos, ambos eram tratados como drogas no período mercantilista, mas havia muitos outros produtos que recebiam esta nomenclatura.
Atualmente este termo, devido a larga difusão midiática e sua relação com o atual modelo de mercado ilícito o qual chamamos comumente de tráfico de drogas, vem ganhando uma vida própria. É como se a droga fosse o sujeito histórico, que tivesse vida em si, isto é, falamos dela como se nos referíssemos a alguém. As próprias campanhas de prevenção e combate “as drogas” direcionam suas ações usando este tipo de conotação; Diga não as drogas! As drogas podem matar você! Drogas, inimigas da sociedade! Etc.
Ao atribuir as drogas esta pessoalidade, cometemos um equívoco significativo, ocultamos o verdadeiro responsável pelos danos advindos do uso indevido das mais variadas substâncias; o homem. As drogas não são seres dotadas de inteligência, quando o termo droga foi cunhado inicialmente, era para designar espécies de plantas específicas, mas que, na maioria das vezes, para torná-la viável ao uso humano, necessitava da intervenção do mesmo. Como era o caso do tabaco.
Cabe esclarecer ainda que historicamente as políticas proibicionistas são relativamente novas. Com o advento da revolução industrial, a sociedade se deparou com a produção sintética de drogas, já o capitalismo se encarregou de transformar tudo em mercadoria. As drogas passaram a ser produzidas em laboratórios e inicialmente usadas para fins medicinais (como foi o caso da morfina, cocaína, LSD), a classe médica aos poucos foi percebendo os malefícios de algumas dessas substâncias e seus efeitos colaterais. Criaram-se então as restrições ao uso de determinadas substâncias e a sociedade do início do século XX viu as drogas serem divididas em lícitas e ilícitas, os critérios que definiram quais deveriam permanecer lícitas e quais deveriam ser ilícitas até hoje carece de explicações mais claras.
Dito isto, cabe ainda alguns esclarecimentos especificamente sobre o crack, droga que está em evidência. A primeira coisa a fazer é perguntar por que uma substância que vem sendo consumida a um pouco mais de uma década no Brasil, só agora ganha repercussão nacional em todos os veículos de comunicação? Seria por que o mercado do crack já atingiu a classe média? O consumo do crack iniciou-se no Brasil na década de 90, na cidade de São Paulo, aos poucos seu comércio foi proliferando para o sul do país e para o estado de Minas Gerais. Na cidade do Rio de Janeiro, o tráfico devido a alguma organização criminal na época, deteve por algum período a entrada do crack. Com o tempo, devido as prisões de grandes traficantes e a fragmentação das facções, a organização criminal do Rio de Janeiro foi se desarticulando, os novos “chefes” do tráfico compreenderam que seus “postos” eram provisórios, logo, o crack, passa a ser percebido com um produto viável.
A dependência do crack é semelhante a da heroína, embora sua ação seja mais rápida e a duração dos seus efeitos também. A compulsividade e a crise de abstinência são de um modo geral potencialmente fortes, o tratamento requer na maioria dos casos a intervenção medicamentosa (geralmente ansiolíticos, antidepressivos e anticonvulsivantes). Os efeitos colaterais são muitos; problemas respiratórios, perda de apetite; paranóia, depressão, dentre outros. O perfil de usuários de crack segundo as pesquisas, apontam para uma população masculina (embora os casos de uso por mulheres venham aumentando gradativamente), geralmente jovens, sem laços com o trabalho e com pouca perspectiva de vida. Os usuários de crack costumam abdicar do uso de outras drogas, o uso misto é percebido apenas em pequena parcela dos usuários, a população de rua, integralmente fragilizada, é a mais afetada diretamente com a epidemia do crack.
A experiência européia com a heroína pode nos servir para lidar com este fenômeno, que não se assemelha a qualquer tipo de substância em uso no Brasil. Embora as políticas públicas européias apresentem variações de um país para outro, de um modo geral, o tratamento da dependência de heroína é semelhante na maioria deles. O tratamento consiste na ação conjunta do uso de metadona e buprenorfina associado a psicoterapia e terapias de grupo.
Outra possibilidade é a prática de políticas públicas voltadas para a redução de danos, Portugal, nosso velho colonizador, pode ser um exemplo no que tange a inovação de políticas públicas sobre drogas. No ano de 2001 o país resolveu cancelar todas as sanções sobe usuários e dependentes, o foco das políticas passou a ser prevenção e tratamento, repressão apenas ao narcotráfico. Os críticos disseram que Lisboa iria se tornar um “paraíso para os usuários de drogas”, mas não foi o que aconteceu, em 2006 um relatório oficial colocou Portugal como um dos países europeus com o menor índice de consumo em vários tipos de drogas. (Veja: "Drug Decriminalization in Portugal: Lessons for Creating Fair and Successful Drug Policies," by Glenn Greenwald, White Paper, April 2, 2009. Cato Institute.)
Não defendo uma descriminalização sintomática e imediata do Brasil, mas o fato é que o modelo que adotamos há anos, com o foco na repressão tem sido até aqui, assim como nos EUA e outros países que o imitam, pífio. Os EUA representam 5% da população mundial e detêm 25% da população carcerária do mundo, estes dados por si só indicam que a cadeia é o grande remédio norte-americano. Defendo, portanto, mudanças na estrutura e nas bases, defendo uma revisão dos conceitos que leve em consideração a prevenção e o tratamento como prioridades das políticas públicas, por meio de programas de prevenção permanentes nas escolas e uma rede de atenção psicossocial a usuários e dependentes em cada município. Defendo que a questão das drogas esteja presente nos programas municipais de governo e nas ações públicas, defendo a proliferação de equipes multidisciplinares e a participação popular nas discussões sobre o tema.
Nossos usuários de Crack (ou qualquer outra droga) não podem ser tratados como lixo humano, o primeiro passo é tratar com dignidade estes indivíduos, descriminalizá-los e dar a eles a oportunidade da mudança e isto só se faz mudando a estratégia.

Jonatas C. de Carvalho

quinta-feira, novembro 19, 2009

Bem Aventuradas as Selvagens

No sermão da Montanha, texto atribuído a Jesus, encontramos declarações de consolo aos oprimidos e excluídos das relações de poder em seu tempo, entre eles, se encontrava os mansos, eles; herdariam os céus segundo Jesus.
Quando me deparo com afirmativas como estas sentenciadas pelo Jesus dos Cristãos, fico a pensar o que será dos selvagens. O que será daquelas pessoas que não conheceram a mansidão, que não tem vocação para monge e possui um temperamento nervoso. Estas pessoas bravias, que não sabem se aquietar diante das injustiças, que não se calam diante das autoridades, e, que se indispõem com quem quer que seja para defender suas idéias. Elas estão condenadas ao inferno?
Conheci muita gente assim, mas sempre os vi com bons olhos, percebi pessoas com temperamento mais agressivo, tendem a ser menos rancorosas. Elas explodem e pronto, estas pessoas também são mais transparentes, se gostam, gostam, se não gostam, deixam evidente. O problema é que tais pessoas estão mais propensas a arranjar mais inimigos que o normal.
Recentemente, tive o privilégio de conhecer uma jovem mulher que por alguma razão me fascinou, seu estilho “indomável” sempre me chamou atenção. Zootecnista, ela certamente deve ter escolhido tal profissão por achar mais fácil se relacionar com os animais, de fato, as pessoas são estranhas. Além de agregar sensualidade a selvageria, inteligência e beleza, era dinâmica e centrada. Não possuía qualquer problema em se expor, às vezes era tomada por uma timidez, outras, tomada pela impertinência, quase sempre, porém, era coerente.
Eu não sei por que, mas percebia certa carência nela, embora não fosse muito dada ao carinho e ao afago, seu jeito arisco, me parecia uma arma contra aquilo que ela mais queria, mas por alguma razão se esquivava na sua selvageria. No fundo, não era diferente de qualquer mulher, mudava o humor durante o período pré-menstrual, sua vaidade era perceptível, lembro-me de vê-la lindamente vestida com um vestido preto e sandálias, onde finalmente pude contemplar seus belos pés femininos, com as unhas devidamente feitas e pintadas.
Tabagista e desbocada, passou por muitos setores em seu trabalho devido a seu jeito peculiar de tratar as questões ligadas aos relacionamentos. Por ser direta, muitas vezes parecia arrogante, mas nunca foi, apenas, lhe faltava a sensibilidade necessária para perceber que sua fala era carregada por imperativos. Havia, no entanto, certa meiguice em seu jeito de ser, quando sorria, era espontânea. Seus cabelos, sempre bem tratados, ajudavam-na manter sua postura de selvagem de dia, mas soltos na noite, imagino que lhe transformaria numa “gata manhosa”, ao estilo Leo Jaime.
Bem aventurada sejas! Bem aventurada àquela que não mede bem as conseqüências das coisas que diz, aquela que se joga sobre o sofá do escritório com as pernas arregaçadas, bem aventurada aquela que não teme tentar, que ousa ser feliz e que não está nem ai para os outros, os outros que se fodam! Bem aventurada aquela que não se intimida, que esbraveja no primeiro sinal de contrariedade, que, como bem escreveu Ivan Lins, não tem vergonha de sentir tesão. Bem aventuradas as selvagens.

Jcarval.

domingo, outubro 18, 2009

GPS

- VOCÊ PODE PEGAR UMA CARONA COMIGO AMANHÃ!
- MAS PARA ONDE VOCÊ VAI?
- VOU PARA MURIAÉ.
- E POR ONDE VAIS PASSAR?
- VOU PEGAR A AMARAL PEIXOTO, SAIO EM MANÍLIA E SIGO PELA RIO-MAGÉ, LÁ EM MANÍLIA VOCÊ PEGA UM ÔNIBUS PARA CABO FRIO.
- Ok!
NO DIA SEGUINTE.
- LIGA O GPS PRA MIM.
- COMO É QUE LIGA ESSE NEGÓCIO?
- APERTE O BOTÃO “ON”!
- ESTE EU JÁ VI NÉ. QUERO SABER O QUE FAÇO AGORA?
- APERTA AI... GPS!
- Ok!
- AGORA ESPERA UM POUCO ....CONECTOU?
- SIM!!
- COLOCA AI, MURIAÉ !
- TÁ, COLOQUEI!
- PRONTO AGORA É SÓ ESPERAR UM POUQUINHO QUE ELE JÁ VAI NOS DAR A ROTA, BACANA ESSE GPS?
- LEGAL!
O TELEFONE
- ALÔ, VANESSA. OI VANESSA!
- O GPS JÁ FEZ A ROTA, E ESTÁ SINALIZANDO QUE AGENTE DEVE RETORNAR!
- VANESSA MINHA QUERIDA, SÓ UM INSTANTINHO!
- ELE É MEIO LOUCO MESMO, VAMOS SEGUIR EM FRENTE, DAÍ ELE REPROGRAMA A ROTA!
- VANESSA, A MÉDICA QUER SABER SOBRE A VIAGEM DELA...
- ELE REPROGRAMOU E CONTINUA DIZENDO PRA GENTE RETORNAR, ETA GPS TEIMOSO!
- POIS É MENINA, VEJA SE TEM OUTRO HORÁRIO, NÃO PODEMOS PERDER ESTA DOUTORA, ELA É NOSSA MAIOR PRESCRITORA!
- É MELHOR ESQUECER ESTE GPS, ESTA PORRA NÃO ENTENDE NADA DE ROTA!
- CLARO... VANESSA... SÓ UM MINUTINHO.
- PRECISO ABASTECER O CARRO!
- ALI NA FRENTE TEM UM POSTO.
- MAS A VIAGEM DA DOUTORA NÃO PODE TER FURO VIU VANESSA! DEUS ME LIVRE!
- DESISTO DESTE GPS. A CADA RETORNO ELE REPETE – A TREZENTOS METROS, VIRE A ESQUERDA! VIRE A ESQUERDA! QUE MERDA!
- ESQUECE ISTO, VAMOS EM FRENTE.
- NÃO VANESSA, EU ESTAVA FALANDO COM MEU IRMAO! TUDO BEM AGENTE SE FALA DEPOIS, BEIJOS!
- E O GPS?
- MESMA MERDA. ESPERA AI, PARA! PARA! CARACA!
- O QUE FOI?
- ESTAMOS NA ESTRADA ERRADA!
- COMO ASSIM?
- OLHA AI, AGENTE JÁ CHEGOU EM MARICÁ! NA PRÓXIMA CURVA COMEÇA A SERRA! VOLTA DAQUI E ME DEIXA AI NO PRÓXIMO PONTO QUE DAQUI EU ME VIRO.
- PUTA QUE PARIU!
- SINTO MUITO, MAS ACHO QUE O GPS TINHA RAZÃO!
- BEM É MELHOR VOLTAR AGORA ENTÃO!
- OK, BOA VIAGEM!
- DROGA DE GPS!!!

sábado, agosto 15, 2009

Sabores da Infância.

Sabores da Infância. 

    Penso pouco em minha infância.Creio que ela não tenha sido tão significante assim pra mim, a não ser por algumas situações e fases curtas.
Quando hoje olho para os meus filhos, tenho a preocupação que suas histórias sejam diferente da minha, desejo que tenham boas lembranças da infância. Espero que o que fazemos hoje juntos possa marcá-los positivamente pelo resto de suas vidas. Espero que suas recordações sobre suas infâncias possam ser transmitidas aos seus filhos com nostalgia prazerosa.
    Outro dia fui surpreendido por minha esposa com uma pergunta simples; - qual o sabor de sua infância? Refletir por um minuto e respondi; - inodora! Talvez eu esteja sendo radical demais, não tive uma infância tão sofrida, não fui abusado, nem realizei trabalhos forçados, ainda assim, tenho poucas lembranças de minha infância, sempre tive. 
    A pergunta de minha esposa, perdurou em mim, comecei a pensar, buscar em minha memória tais gostos, foi quando me deparei com uma brevidade, na vitrine de uma padaria. Lembrei que quando eu era garotinho, meu pai costumava trazer duas brevidades para casa, uma para mim e outra para minha irmã caçula. Não exitei, pedi duas brevidades, mal cheguei ao carro, desembrulhei o pacote e dei minha primeira mordida. Foi uma decepção, senti um gosto de química na boca, algo artificial e mais, a brevidade tinha a consistência física de uma farofa bem seca, aquilo formou uma massa na minha boca, que quase saí correndo atrás de um copo d'água. Eu esperava ter a mesma sensação de prazer, que tinha quando era apenas um garoto, mas não tive. Pensei em duas hipóteses para explicar minha frustração, ou aquele padeiro não sabia fazer brevidade, ou meu paladar passou por transformações significativas. 
    Minha conclusão pendia para a segunda hipótese, por duas razões bem óbvias,  primeiro pelo fato da padaria ser a melhor da região, segundo é que eu já havia passado por esta experiência antes. Foi com um tipo de broa, não me lembro o nome, mas ela era parecida com um disco voador e eu adorava comer aquilo, para minha surpresa, assim como no caso da brevidade, eu me decepcionei. 
    O que acabo por concluir com esta experiência em busca dos sabores da infância é que o gosto das coisas não mudaram, nós é que amadurecemos. Coisas que achávamos deliciosas em nossa infância, hoje não faz mais sentido, basta olhar para os nossos filhos e ver do que eles gostam, nós não gostamos das mesmas coisas que nossos filhos. 
    Eu e minha esposa começamos a lembrar das merendas da nossa época, começamos então a pensar numa pequena relação de produtos que eram adoráveis quando éramos crianças e agora não aprovamos o paladar. Lembram-se da "laranjinha", aquele negócio que se parecia com uma bomba, num recipiente de plástico e com sabores de uva, morango e laranja. Tentem beber aquilo hoje, se é que ainda se fabrica,  se fabricar, certamente terá um gosto horrível. Pode ser que alguns produtos ainda tenham o poder de nos reconduzir a infância por meio do seu sabor, mas creio que dificilmente poderemos sentir o mesmo tipo de prazer que tínhamos na época. Penso em produtos como o "Pirulito Zorro", o "Amendocrem", "Pingos de Leite", entre outros. 
    Como o amadurecimento pode alterar nossa relação com o paladar? Não gostávamos de hortaliças, giló, beringela nem pensar, muitos de nós não comíamos peixes e tantas outras coisas, nossas mães sempre nos obrigando; - Coma isso, ou não vai brincar! Hoje repetimos a estratégia com nossos filhos. A infância de alguns amigos meus foi bem pior, lembro de um dia, morávamos na Provisória, um amiguinho e eu fomos até uma padaria, eu estava com umas moedas e queria comprar um doce, talvez uma "maria-mole" ou um "pé-de-moleque", meu coleguinha me convenceu a comprar um "pão-doce", pois segundo ele, continuava a ser "doce", mas o "pão" enchia o estômago. 
    Penso nas crianças que amargam a infância colhendo restos em lixões, pegando em armas nas favelas ou nas guerras étnicas, penso nas crianças que adormecem nos calçadões, na candelária, penso nas crianças lumbrigudas do nordeste ou da Somália. Este texto é em homenagem a elas, crianças que provavelmente terão um vida adulta triste e sofrida (se chegarem a fase adulta), porque na infância experimenteram todo o tipo de amargura.    
 
    
          


sexta-feira, julho 24, 2009

Guerra dos Sexos.

Guerra dos Sexos.

Estive pensando se realmente existe uma guerra dos sexos, aquela disputa de poder entre os os gêneros masculino e feminino. Minhas análises caminham no sentido de entender como andam as relações entre  homens e mulheres hoje. Já ouvi dizer que tem poder é quem ganha mais, manda na casa quem obtém melhores salários. Após os movimentos feministas que buscavam igualdade entre homens e mulheres o que vemos hoje é um certo equilíbrio sócio-econômico, sobretudo nos grandes centros. Na prática tenho a impressão que já não é tão incomum, encontrarmos mulheres ganhando bem mais que seus pares. Tal fator contribui para algumas novas perspectivas na história social das famílias.

As conclusões que me chegam é que se a mulher tem remuneração superior, logo, sua carga de trabalho é significativa não permitindo que a mesma se ocupe com os afazeres domésticos. Cabendo ao homem tais encargos, já que este encontra-se numa situação de inferioridade econômica. A palavra economia para aqueles que não sabem, é "oikos"  (casa) do grego,  já "nomos" (costume - lei), isto é "regras da casa". Assim as regras da casa são feitas por quem detém o poder e detém o poder quem ganha mais, e, se sua mulher ganha mais que você, então estamos juntos nesta. 

Após estas conclusões, gostaria de prosseguir com outras análises. Retomarei um modelo social conhecido em nossa sociedade como o modelo da mulher prendada. A "mulher prendada", dizem os historiadores da vida privada, surge como solução elaborada pela igreja (que detinha o monopólio do matrimônio) para casar aquelas mulheres que eram destituídas do chamado "dote". Isto é, as mulheres que tinham dote eram logo escolhidas para casar, contudo o dote gerou um problema:  Um exército de mulheres sem dotes a espera de pretendentes. O discurso da igreja foi o seguinte;  - diziam os padres - Minhas filhas vocês não possuem dotes, mas possuem talento doméstico, ora, se você sabe passar, lavar, cozinhar e costurar, então vocês são prendadas! - Até hoje se fala na tal mulher prendada, contudo me parece que encontram-se já em extinção. O sinal mais óbvio da extinção são as piadas populares, e sobre este tema me ocorre uma. A mulher e o marido na cama em plena lua de mel, seminus.(sem hífen?) Ela diz - Benzinho esqueci de lhe confessar algo importante.  - O que. Respondeu o cara louco para transar. -É que eu não sei fazer nada, nada, nada!  O sujeito foi logo tranquilizando - Tudo bem querida, eu te ensino fazer tudo, tudo, tudo!  Ela retruca - Não amor, você não entedeu, transar eu sei muito bem, o que eu não sei é; lavar, cozinhar, passar.....  

Algumas considerações importantes quanto ao que até aqui já foi dito: Primeiro seria muito bom se nós os homens continuássemos a ser os provedores do lar. Segundo para garantirmos tal status será necessário estarmos qualificados, as mulheres são maioria nas universidades, logo, em breve estarão nos postos de trabalho que deveriam ser nossos. Será que as subestimamos? Fica aqui um conselho final. Se você não conseguiu galgar profissionalmente acima da sua mulher, há duas possibilidades para você: Se você for um bem comedor, a fazê-la feliz na cama, suas chances de continuar sendo mantido por ela é muito grande, a menos que você seja tão azarado e encontre uma mulher que não goste de sexo. Agora se você não for bom de cama, meu camarada só tem uma solução; ser um "homem prendado", desenvolva as tarefas domésticas com eficiência e poderás se manter na função de marido. Atente-se apenas para um detalhe, procure comê-la (sua esposa), com alguma peridiocidade, pois se fores bom apenas nos afazeres domésticos, ela poderá concluir que você só serve para a casa e ai, você além de ter se tornado um subalterno serás também um corno. 
Agora preciso encerrar esta crônica, pois a máquina de lavar acaba de centrifugar e eu preciso estender a roupa, e depois, bem depois eu conto.     

          

segunda-feira, junho 22, 2009

As Pontes de Madison

É véspera dos dias dos namorados, estamos em casa, eu escrevo um texto sobre a transitoriedade da vida, no fundo do quarto a TV ligada sem qualquer finalidade, até que escuto o anúncio de um filme da Warner Bros, “As pontes de Madison.” Não é necessário dizer que se trata de um clássico, dirigido e estrelado por Clint Eastwood e com Meryl Streep.
Este é um filme de uma sensibilidade singular, se eu pudesse defini-lo numa máxima, utilizaria Fernando Pessoa: “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que elas acontecem, por isso há momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.”
Eu poderia arriscar que o cerne deste filme esta no quanto alguns de nós nos privamos de nossos sonhos em função de escolhas convencionais. A convencionalidade, no entanto, não significa amarrar uma pedra no pescoço e pular no rio. Muitos são felizes vivendo de forma convencional, isto é, seguindo o que nossa sociedade chama de comportamento padrão esperado; estudar, trabalhar, pagar impostos, casar, criar filhos, aposentar e morrer. Não estou certo, contudo, se há realmente algo de convencional nesta sequência (Saudades da velha ortografia!!), visto que as implicações para tal processo são extremamente complexas. O fato é que alguns realmente não sonham com uma vida assim e a acabam vivendo desse modo por força da tradição ou falta de coragem em ir ao encontro daquilo que realmente querem.
Por que escolhemos o convencional? Ai temos outra grande sacada do filme, talvez seja por sermos culturalmente lavados a buscar a eternidade em tudo, menosprezamos os momentos, os acontecimentos ou tudo mais que não nos traga certezas estáveis. Creio que seja por isso que fico imaginando que o amor platônico entre a dona de casa e um fotógrafo da Nacional Geografic, se realimentou do sonho do que poderia ter sido aquela relação, assim como em Abelardo e Heloisa. Afinal fazemos isto com as coisas de um modo em geral, isto é, imaginamos como teria sido nossas vidas se tivéssemos feita a outra escolha, se não tivéssemos desperdiçado aquela oportunidade.
Não quero fazer pouco caso do amor ou da paixão, mas em As Pontes de Madison uma coisa me chamou mais atenção que a relação entre a dona de casa e o fotógrafo viajante. A trama é ricamente desenvolvida a partir da leitura do diário da mulher, leitura esta, que é feita por seus dois filhos, na verdade um casal. O que me impressiona no filme é como cada filho irá reagir àquela história guardada em segredo pela mãe até a sua morte. Os filhos, agora adultos, vivenciando as problemáticas da relação a dois, olham para suas próprias vidas, e percebem que é necessário fazerem algo com relação a seus relacionamentos. A questão é que este algo a fazer, se estabelece de modo completamente distinto, na verdade suas ações chegam a ser paradoxais. Imbuídos em não repetirem a história da mãe, resolvem agir para mudar suas realidades, a jovem, porém, liga para seu marido e anuncia que não deseja mais continuar casada com ele, enquanto o rapaz corre para os braços de sua esposa, prometendo fazê-la feliz até o fim dos seus dias.
Arrisco-me novamente a outra máxima, desta vez de Sartre: “O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós”.

sexta-feira, junho 12, 2009

TRANSITORIEDADES

“Tem gente que vem e que voltar, tem gente que vai e quer ficar, tem gente que veio só olhar, tem gente a sorrir e a chorar. E é assim chegar e partir são só dois lados da mesma viagem” (Encontros e Despedidas. Milton Nascimento e Fernando Brant).

Aqui estou eu novamente. Eu não sou muito adepto da matemática, mas realmente preciso arriscar-me em um cálculo. Julgando que viajo semanalmente entre Itaipava e Cabo Frio, transitando por conta disto duas vezes por semana pela rodoviária novo rio. Julgando ainda que um mês tem quatro semanas, logo, transito pela rodoviária oito vezes no mês, caso o ano tivesse dez meses eu teria passado pela rodoviária oitenta vezes no ano. Se acham que contabilizei dez meses só pra facilitar a conta, estão enganados, eu levei em consideração as férias e algumas vezes que vou de carro.
Oitenta vezes no ano! Por que a exclamação? Porque nos últimos sete anos eu faço esta rotina, ora multiplicando oitenta por sete, segundo minha calculadora dá 560, isto mesmo, deixarei em algarismos numéricos para destacar, 560 vezes eu já passei por esta rodoviária! Será que devo requisitar um recorde? Quantas pessoas já transitaram por uma rodoviária tantas vezes? Acredito realmente que tirando o pessoal que trabalha por aqui, ninguém passou mais vezes neste lugar que eu.
A rodoviária me ensinou muitas coisas, no entanto, entre elas, eu entendi que a vida é transitória. A transitoriedade não necessariamente está vinculada a instabilidade, não. Por transitório, compreendo a dinâmica da vida, as mudanças, os acontecimentos e as descontinuidades. A vida é transitória, isto quer dizer que estamos em trânsito o tempo todo, nada é estático, estamos sempre em movimento, a cada dia, a cada hora, a cada minuto, a vida transita. Para onde? Esta já é outra discussão.
Apesar desta constatação, observo que muitas pessoas preferem viver fixamente, isto é, alguns necessitam de agarrar-se a algo, nossa cultura insiste nisto, precisamos criar raízes, estabelecer vínculos sólidos, é fundamental a nossa espécie a sensação de pertencimento. Creio que tudo isso se inicia no momento que nossa espécie transita de sociedades nômades para sedentárias. No momento em que percebeu-se que era possível estabelecer-se sem mais aquela obrigação de correr atrás da caça.
De qualquer forma, me parece que com o advento do capitalismo passamos a consumir e acumular como loucos, para que? Qual o objetivo deste tipo de sujeito que só faz pensar em acumular e ter? Podemos alegar que estamos pensando nos nossos descendentes, mas na verdade fazemos isto porque de uma forma ou de outra não queremos andar em desconformidade com as regras sociais e as verdades universais.
Ao olharmos ao nosso redor, com alguma lucidez é possível ver que a vida é infinitamente mais que acumular, devíamos apenas viver... seguir a vida com propósitos que sejam mais significativos, como fazer amigos legais e leais, amar, gozar e divertir-se muito. Não consigo imaginar algo mais sensato diante da transitoriedade da vida que isto. O transitório não significa ser vazio ou vulgar, não há problemas em dar sentido as coisas, em buscar uma felicidade duradoura, não é só porque a vida é transitória que vamos nos comportar como se o mundo fosse acabar amanhã.
O que proponho é uma relação de equilíbrio entre o viva e deixe viver e o acumule o máximo que puder. Poderíamos estabelecer um outro conceito, logo, proponho viva o máximo que puder e acumule o suficiente. Se a vida é uma grande rodoviária, assim com na canção as pessoas vivem a vida e a percebem de forma diferente, para alguns trata-se de uma dádiva, outros a vê como um carma, eu a sinto como um bem inestimável, embora tenha consciência de sua transitoriedade.
Jonatas C. de Carvalho.

segunda-feira, maio 18, 2009

DEBUTANTES

Não me lembro de ter ido muitas vezes a uma festa de quinze anos. A última vez que estive em uma, foi na cidade de Três Rios, cidade esta que morei por um ou dois anos na minha infância. De Três Rios trago recordações ótimas da infância que lá vivi, acho que foi lá onde eu fiz minha transição para a adolescência.
A festa até onde me lembro foi normal, muito comes e bebes, muita música, meus filhos dançaram bastante após a valsa e eu e minha adorável esposa, nos empanturramos. Sou antitradição, não costumo ser radicalmente contra as coisas, mas tradições me deixam irado. Quando me licenciei em História, os alunos da minha turma não entenderam porque eu não quis participar da formatura. Fiz minha colação de grau dentro da sala do coordenador do curso, só eu e ele. Não suporto essa coisa da transmissão de poder, recheado de adereços que representam autoridade, como aquela torga, soa como se alguém que revestido deste suposto poder, outorgasse a você a licença para usá-lo.
Ontem fui a uma festa de debutantes, uma jovem belíssima, uma mãe felicíssima e um pai embasbacado. Como a última, a festa corria normalmente, tudo ia muito bem, a comida ficava melhor a cada momento, boa cerveja, a música... os jovens estavam curtindo. Minha adorável esposa estava ansiosa pela chegada de sua amiga, esta viria com o marido, que eu não conhecia, mas seria uma companhia masculina, para que eu pudesse falar com alguém, já que até o presente eu só ouvia minha mulher conversar com outra colega.
Minha esposa já havia sentenciado que pela hora a amiga e seu esposo não viria, logo eu estava condenado ao silêncio, pois não havia qualquer possibilidade de eu entrar no diálogo da minha esposa com sua outra colega. Para nossa surpresa a amiga chegou, eu me animei pela possibilidade de falar com alguém, sobre negócios, futebol, política, estas coisas.
O casal uma vez devidamente apresentado, sentou-se em nossa mesa, o marido da amiga de minha esposa, não parecia muito falante, fazia um tipo que é tranqüilo. Minha percepção falhou drasticamente, o indivíduo era um empresário muito ativo. Era inteligente, pragmático e direto, tocava seu negócio como judeu, isto é, tudo é negócio. Como comigo, nada é negócio, meu novo companheiro de copo, agora já com algumas taças de vinho na cabeça, ficou mais falante, mas mudo ude assunto.
Deixamos de falar dele, para falar de mim, ele me perguntou sobre minha atividade na ONG que coordenei, o assunto drogas passou então a ser predominante. Mas o papo não ficou concentrado em mim, pelo contrário, não podia eu imaginar o que estava por vir. O assunto drogas, porém, rendeu mais que eu podia esperar, meu novo amigo, passou a revelar-me toda sua experiência com as drogas. Fico sempre muito intrigado, com a capacidade com que algumas pessoas se abrem comigo, sei que tenho um jeito tipo, psicoterapeuta, mas há momentos que me surpreendo.
O sujeito colou sua boca a dez centímetros da minha orelha direita e passou a me falar sobre sua antiga relação com a canabis sativa, o sujeito já com os seus cinqüenta, não abria mão da diambra. Eu conseguia em alguns momentos argumentar, mas ele monopolizou o diálogo, deixando-me numa situação real de ouvinte.
– Fumo três finos por dia, caso contrário não trabalho direito! Defendia-se. A madrugada batia a porta, eram um e meia da manhã, minha esposa e sua amiga já haviam nos deixado a tempo, depois fiquei sabendo que ambas nos observavam e riam da minha situação. Meu ouvido direito ficou um tanto quanto adormecido. Ao nos chamarem para irmos, meu amigo confessou-me que só havia me contando aquela história toda, por saber que eu era uma pessoa ética, afinal, sua esposa não sabia de nada.
Por fim, quando entrei no carro com minha família, mesmo um pouco surpreso com o que havia escutado naquele lugar, pensei sobre os preconceitos que temos acerca das pessoas. O quanto somos conduzidos por todo um aparato discursivo que só faz dizer mal das drogas, só faz recriminar quem usa. Meu amigo é um bom sujeito, tem caráter, é bom marido, bom pai, tem responsabilidades, conduz seus negócios com sobriedade. Concluímos que ele faz uso terapêutico da canabis, embora ele reconheça que por vezes comete abusos ao usar, mas quem não abusa em alguma coisa nesta vida?
Minha esposa querida, muito solícita, já agendou um encontro com mais um casal além deste último, só que o outro casal, o esposo faz uso de coca, acho que o encontro irá virar, uma terapia de grupo, por mim tudo bem, desde que tenha um whiskyzinho.
Jcarval.

sexta-feira, março 20, 2009

Comemoração à Vida

Neste último dia 12 de março, meu velho e bom Pai competou seus 70 anos, resolvi ecrever dois textos sobre esse momento.


1939 – O nascimento de um Mahatma.

Eventos Importantes que ocorreram em 1939:

O marco inicial ocorreu no ano de 1939, quando o exército alemão invadiu a Polônia. De imediato, a França e a Inglaterra declararam guerra à Alemanha. De acordo com a política de alianças militares existentes na época, formaram-se dois grupos: Aliados (liderados por Inglaterra, URSS, França e Estados Unidos) e Eixo ( Alemanha, Itália e Japão ).
. Início do Pontificado de Pio XII.
10. O presidente da Checo-Eslováquia, Emil Hacha, demite Tiso e dois ministros por «actividades separatistas prejudiciais à unidade do Estado».
14. A Eslováquia proclama a independência, separando-se da federação Checo-Eslovaca.
15. As tropas alemãs entram em Praga, e ocupam a Boémia e a Morávia, enquanto a Hungria ocupa a Ruténia.
16. Hitler proclama que a "Checo-Eslováquia deixou de existir".
17. A Grã-Bretanha e a França protestam contra a violação do Acordo de Munique, de 1938, "não reconhecendo a validade da nova situação criada na Checo-Eslováquia pela acção da [Alemanha]."
Os eventos que o mundo presenciava neste ano, resultaram numa guerra cujas proporções trouxeram traumas avassaladores nos países de vários continentes. A bomba atômica foi o referencial mais significativo dessa guerra que termina em 1945.
O que o mundo não contava é que neste ano nasceria um segundo “Mahatma” (Grande Alma) Gandhi. Ao contrário do outro, (que nasceu em Nova Déli – 1869), este nasceu no Brasil, especificamente em Teresópolis. Ainda ao contrário do outro, este não lutou pela libertação de sua nação, não fez greves de fome, não denunciou a exploração e o poder imperialista. Este Mahatma brasileiro, não era formado em direito pela Universidade de Londres, tampouco viajou pelo mundo na tentativa de entender os poderes dominantes.
O Mahatma que nasceu neste período tão conturbado da história ocidental, não se envolveu com movimento militante político, não se tornou celebridade, muito menos conheceu a erudição das academias.
Se o mundo soubesse... Neste período de tantas turbulências, nasceu um pacificador. Isto mesmo, um bem aventurado! Esta Grande Alma não mudou o mundo, mas foi exemplo de vida a todos que com ele conviveram. Seu despojamento de tudo que é matérial nos remete a um cristianismo puro (“não junteis tesouro na terra onde a traça tudo corrói”). Sua simplicidade e humildade me faz lembrar Francisco de Assis, a quem a todos chamou; Irmão.
Este Mahatma dedicou sua vida a Família e a Fé, dois legítimos alvos. Foi e é exemplo de valores como honestidade, ética, solidariedade e amizade. Abdicou-se de seus próprios sonhos e hoje se realiza na felicidade dos filhos e da esposa. Este Mahatma se chama Manoel, e como diz a canção vai pro céu! Mas não temos pressa é claro, já que sua alma se assemelha a de uma criança, meiga e ingênua. Esperamos ainda comemorar muito esta data.

Feliz aniversário !!!!!!!!!!!!!
Seu manueluuuuu!!!!!!
12/03/1939 – 12/03/2009 - 70 ANOS..............


O Tempo.

Já escrevi algumas coisas sobre o tempo, já o chamei de “senhor absoluto das verdades”, já disse que o “tempo não volta atrás”, e, que, portanto, seria “perda de tempo” correr atrás do “tempo perdido”, pois “tempo perdido não se recupera”. Disse em outra crônica que o tempo seria um “contabilizador da finitude humana”, assim o homem vive em função do tempo, porém, o tempo não está nem ai para o homem. O tempo na verdade, não existe, nós o inventamos e até agora não aprendemos a lidar com ele.

Lembro-me de que Chaplin o “Carlitos”, dizia que a vida deveria iniciar ao contrário, nasceríamos em um asilo, e rumaríamos a juventude já cheios da experiência, e por fim a vida terminaria num grande orgasmo. Ao assistir o filme “O curioso caso de Benjamim Button”, pude refletir um pouco mais sobre nosso relacionamento com o tempo. O filme contrasta com a posição de Chaplin. Benjamim vive inversamente a todos nós, enquanto vê seus amigos do asilo morrerem um a um, ele vai ficando a cada dia mais forte, aos poucos vai se rejuvenescendo, se apaixona quando sua amada tinha apenas vinte anos e ele parecia ter sessenta. Quando sua amada chega aos quarenta, Benjamim já é um jovem rapaz, porfim, ela o nina em seus braços no mesmo asilo onde ela nasceu.

O tempo passa para todos nós, mas há aqueles que se permitem continuar jovens, espirituosos e otimistas quanto suas vidas. Outro dia li que uma velhinha que acabara de fazer cem anos, dizia gostar muito de uma suculenta carne de porco e de uma seresta. Ontem liguei para o meu pai, pois ele fez setenta anos, perguntei:
- Como esta se sentindo? E ele respondeu com a firmeza e serenidade de sempre.
- Melhor do que quando tinha vinte anos!

Meu pai, na verdade não pode mais realizar as coisas que fazia aos vinte anos, mas não se trata do corpo físico, trata-se do vigor interior, a jovialidade se encontra em nossas mentes, não nesta carcaça que com o tempo vai ficando pelancuda e quebradiça.
Felizmente meu pai nos mostrou como se lida com esse tal de tempo, nunca reclamou, murmurou ou lamentou o tempo que passava diante dele, apenas o observava serenamente, como se dissesse ao tempo – você não me assusta!
Hoje aos setenta anos, vimos que se quisermos ser felizes em nossas vidas, há lições importantes a aprender com meu pai. Ele descobriu que vale a pena viver por aquilo que morreríamos.

quinta-feira, fevereiro 19, 2009

Águas Límpidas

Entre trancos e barrancos procuro seguir o ethos moderno de conservar o corpo, embora eu critique a “ditadura da saúde” que busca fabricar indivíduos com padrões exatos, que nos impõe uma intensa rotina de exercícios físicos e nos ilude com uma ideologia de cultuar o corpo. Na prática, não resisto muito, assim, alterno entre caminhadas e cervejadas, entre uma “nadada na praia” e uma feijoada no bar da esquina as sextas.
Hoje ao fazer minha caminhada na areia da praia do forte, percebi que o mar estava singularmente belo, suas águas estavam límpidas e calmas, não havia vento e eu fiquei paralisado diante de tanta beleza. O som do mar certamente é terapêutico, sempre que me encontro em conflito com algum problema é dele que vem o som capaz de trazer-me a paz de volta. Tenho alguns amigos, muitos certamente se colocariam a disposição para ouvir minhas neuras, poucos talvez fossem capazes de me ajudar a resolvê-las, não porque lhes falte capacidade, mas algumas questões dependem exclusivamente de mim para serem alteradas ou resolvidas.
As águas límpidas do mar fazem com que eu perceba os benefícios da transparência, com tal limpidez é possível ver o fundo do mar, saber onde estamos pisando e contemplar a beleza que há em baixo d’água. Quando a água está turva, não é possível obter os mesmos benefícios, o tom escuro das águas nos deixa inseguros, não saber onde pisamos é uma sensação desagradável.
Dificilmente é possível ser cem por cento transparente, as vezes somos conduzidos ou preferimos a obscuridade, o que não significa um levianismo deliberado, ao contrário, trata-se antes de auto-preservação. Esta talvez seja uma das características humanas mais primitivas ao mesmo tempo mais interessante, o modo como se age instintivamente para se auto preservar é sem dúvida herança dos nossos ancestrais.
Mas do que nos protegemos? Ou o que protegemos? Se levarmos em conta a noção de “homem do desejo” de Freud, podemos dizer que protegemos nossos desejos e pensamentos que são condenados em nossa sociedade. Todo e qualquer ato que é considerado infame, toda e qualquer vontade que fora considerada abominável, degradante, imoral, etc.
A mesma sociedade que condena, explora na obscuridade a ação condenada. Citemos um exemplo contemporâneo, o mesmo congresso nacional que mantém cafetinas circulando por seus corredores com seus “books” de notável exuberância e variedade, não aprova a existência de uma lei que reconheça a profissão de prostituta como legítima, garantindo a estas mulheres (tão fundamentais para a economia libidinal masculina), direitos básicos como uma aposentadoria legítima.
A transparência é fruto da sobriedade, o que me lembra Antonin Artaud, quando este dizia: “quero estar acordado nos meus sonhos e sonhar como um homem desperto”.