terça-feira, dezembro 13, 2022

A INTENSIDADE DO ENVELHECER.

Há muitas boas análises sobre o envelhecimento, possivelmente nenhuma delas devem ser tomadas como a "mais pura verdade", pois os humanos absorvem a velhice de modo muito diferente. Esses modos diferentes dependem ainda, de como as sociedades em diferentes épocas estabelecem o valor (moral) para a "velhice". Há sociedades em que a velhice é consagrada, os mais velhos (anciãos), são absolutamente respeitados, são ouvidos e considerados, nada é decidido sem que se escute o mais sábio. Por esses motivos, os mais velhos recebem cuidados especiais e são reverenciados. Em outras sociedades a velhice é tomada como algo senil, os mais velhos são excluídos das decisões, são retratos da debilidade e do atraso, não têm o que oferecer de novo. Nessas sociedades cuidar dos mais velhos é algo que se terceiriza, porque é uma fardo, não há tempo para se dedicar a velhice, aquele que cuidou e zelou por nós, é condenado a passar o resto de seus dias em um asilo, uma instituição que é um dos maiores símbolos de uma sociedade narcísica. Esse é o nosso caso, Gustav Klimt já denunciava como nossa sociedade tem vergonha da velhice, em sua obra "As três idades da mulher" (1905), quando a mulher velha tem seu rosto encoberto pelos cabelos. 

Por que escrevo sobre a velhice? Porque hoje estou mais perto dela do que já estive antes. Ao concluir 53 anos, sabemos que uma vez tendo ultrapassado o meio século, não há mais retorno, o caminho em direção a morte é cada vez mais certo. Mas isso há razão para se angustiar, carrego comigo a máxima epicurista sobre morrer, "se a morte é o fim das sensações, ela não pode ser fisicamente dolorosa, e, se é o fim da consciência, não pode causar dor emocional. Ou seja, não há nada a temer."

Quanto à velhice, me pego sempre pensando nela, em como desfrutar desse tempus fugit. Passei minha vida inteira sendo um profanador, dessacralizando tudo que se considera sagrado, desnaturalizando tudo que foi naturalizado, sempre resistindo aos dogmatismos, nunca me rendendo às imposições sociais. Portanto, não serei um velhinho adaptado aos padrões da velhice, farei com a minha velhice o que minha mente mandar e se meu coração não aguentar então paciência... não vejo sentido nesse culto a uma longevidade, quero intensidade, quero amor fati.

Quero viver plenamente a metanóia junguiana, um diálogo aberto entre todas minhas personas e minhas sombras. Como Rubem Alves, não penso na velhice como processo biológico, penso como acontecimento estético, que diferente da beleza das manhãs, envelhecer é crepúsculo. Cito um trecho:

No crepúsculo tomamos consciência do tempo. Nas manhãs o céu é como um mar azul, imóvel. No crepúsculo as cores se põem em movimento: o azul vira verde, o verde vira amarelo, o amarelo vira abóbora, o abóbora vira vermelho, o vermelho vira roxo – tudo rapidamente. Ao sentir a passagem do tempo nos apercebemos que é preciso viver o momento intensamente.

Intensidade não significa viver aloprando, trata-se da crítica de lobão sobre a Decadence avec elegance, mas não é sobre viver "10 anos a mil do que mil anos a dez". A intensidade não é oposição a extensão ou a duração, ela é vibração do ser no presente, é a potência própria de toda sensibilidade. É sobre se permitir encantar com o vento no rosto, com o efeito da luz sobre um tronco de árvore, com a melodia da chuva ou o ritmo dos sabiás. A intensidade pode ser experimentada nos detalhes da existência, desde o sorriso de uma criança, até no abanar de rabo de um cão ou no ronronar de um gato. Há intensidade no ato de compartilhar, ao dividir o almoço ou um lençol, ao trocar com outro poemas e músicas. E como escreveu Drummond "Eterno é tudo aquilo que vive uma fração de segundo mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma força o resgata."

Carpe Diem,
Jonatas Carvalho.
 



 

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