domingo, setembro 11, 2022

ROCK É ROCK MESMO?

 

Trinta e sete anos depois, após muita resistência, eu voltei ao Rock In Rio. Uma sensação estranhíssima, um misto de perplexidade com toda aquela estrutura e bronca daquele espaço heterotópico. Havia algumas razões para eu ter resistido todos esses anos em voltar a este evento: o primeiro é que eu preferi guardar 1985 na memória como um tipo de Woodstock da minha geração, o segundo é que, para mim, não se faz mais Rock como naquele tempo. Obviamente ambas as razões são idealistas. Eu era só um adolescente hyppie em 1985, com visão crítica muito limitada, e a paixão pelas bandas (que nunca pisaram no Brasil), em especial AC/DC, Queen, Scorpions e Whitesnake, me seduziu. Quanto ao Rock, bem, é evidente que se trata de preconceito de geração. Raul Seixas, em uma entrevista no ano de 1988, afirmou que o Rock havia morrido em 1959. Meu ídolo nacional me decepcionou com tal sentença. Na ocasião não o compreendi, só com a maturidade percebi o que ele quis dizer.

O ano de 1985 foi um marco daquilo que se concebeu chamar de redemocratização, o Rock In Rio representou esse Brasil sem órgãos de censura prévia. As bandas nacionais como Barão Vermelho, Blitz, Paralamas do Sucesso e Kid Abelha representavam a volta da liberdade de expressão. Alguns anos mais tarde eu compreendi que o fim da censura só chegou para alguns. A ditadura havia deixado o governo executivo, mas a estrutura do Estado de exceção seguia entranhada nas instituições, em especial na polícia. Os grupos poderosos que apoiaram o golpe de 1964 seguiam no poder, reprimindo as populações periféricas.

Quanto ao evento que participei neste 10/09/2022, nem de longe me empolgou. Com raros momentos de “opa tem coisa boa aqui”, foi o caso do Eletrika Trio e Cee Lo Green, o resto foi vivenciar um espaço preparado para te levar ao limite do cartão de crédito. A Rota 85, espaço dedicado ao primeiro Rock In Rio, apesar de me deixar nostálgico, frustrou minhas expectativas. Seus monumentos conflitaram com minhas próprias memórias. O All Star gigante enlamaçado, sem dúvida uma obra de arte, não corresponde historicamente à realidade do brasileiro dos idos de 1980. O tênis All Star começou a ser fabricado no país exatamente no início da década, em total descompasso com o original nos EUA. Somente os filhos da classe média para cima podiam ter um par, as classes populares usavam mesmo era o “Bamba”, o “Conga” e o velho “Kichute”, um ou outro podia comprar um “topper” ou um “Rainha”.

Outra questão crítica pra mim: o chamado “Espaço Favela”, criado a partir de uma favela cenográfica, romantizada e atraente. Assisti ali um grupo de samba liderado pelo “El Pavuna”, um jovem cantor, que nos brindou com sambas incríveis, uma banda excelente. A apresentação terminou com a abertura de uma faixa onde se lia: “Ouçam a favela”. Essa experiência me fez pensar que, se por uma lado aquele espaço estava dando oportunidades a uma nova geração do samba e permitindo trazer aquele público uma mensagem de que a favela é lugar de vida, cultura e música de muita qualidade, por outro, não havia favelados ali. Possivelmente, os poucos pobres que ali estavam endividaram-se aos tubos para poder estar naquele lugar.

Concluo dizendo que, mesmo terminando a experiência encharcado pela chuva, que não deu trégua depois das vinte horas, hoje, ainda cansado, penso que valeu. Não pelo Coldplay, que só assisti umas quatro músicas e depois fui procurar abrigo coberto, mas por estar naquele lugar com familiares e amigos, por vê-los felizes, mesmo aturando algumas rabugices que, ora ou outra, eu manifestava. Minhas últimas palavras, viva Djavan! Aos 73 anos de idade ainda consegue nos emocionar.

Jonatas Carvalho.

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